segunda-feira, 23 de outubro de 2017

O Amor é Cego PRÓLOGO


— O amor e febre que arde... em meu sangue.
Demetria Lovato não conteve uma expressão de desagrado quando estas palavras ecoaram no ar. Sinceramente, esse era o pior poema declamado por lorde Prudhomme desde que chegara à residência urbana de seu pai uma hora antes.
Nossa, fazia somente uma hora? Parecia que aquele cidadão idoso estava ali havia dias. Ele entrara sacudindo um livro e avisara triunfante que em vez de seu passeio habitual, leria para ela.
Demetria, de fato, gostaria muito desde que a leitura fosse algo interessante e não aquela baboseira. E gostaria ainda mais se ele não agisse como se estivesse lhe fazendo um favor.
Ela sabia muito bem a razão para essa súbita mudança de planos. Obrigando-a a permanecer comportadamente sentada enquanto lia alto, ele só tinha um objetivo evitar desastres. Parecia que até o velho e solidário Prudhomme estava ficando cansado de seus contínuos acidentes.
Não podia culpá-lo, ele havia sido extremamente tolerante até então, quase um santo.
Certamente, demonstrara mais compreensão e bravura do que seus outros pretendentes. Parecia aceitar e perdoar todas as vezes que ela confundia suas grossas coxas com a mesa de chá e apoiava as coisas sobre elas; esboçava um sorriso dolorido ao levar pisões nos pés quando dançavam; e suportava com galhardia seus constantes tropeços e quedas quando saíam para uma caminhada no parque.
Pelo menos, era o que parecia, mas aparentemente hoje descobrira um jeito de se safar de tudo isso. Pena que sua opção de leitura deixasse muito a desejar. Demetria teria preferido fazer o papel de boba no parque ou cair de cara em um bolo do que ficar ouvindo aquelas bobagens sem sentido.
— Minha imaginação ganha asas de um pássaro.
A voz de Prudhomme tremulava de paixão, ou talvez apenas de velhice, Demetria  não saberia dizer. A verdade é que aquele homem tinha idade para ser seu avô.
Infelizmente, isso pouco importava para Taylor. Sua madrasta havia prometido a John Lovato que procuraria um bom casamento para a filha antes que ambos morressem.
Até o momento, eles não pareciam correr qualquer risco. Ela, porém, estava em perigo iminente de se encontrar casada com o cavalheiro idoso ajoelhado a seus pés que, de braços erguidos, clamava amor eterno.
Prudhomme era um dos poucos pretendentes que ainda a cortejavam.
— Juro minha... minha... lady Demetria — Prudhomme interrompeu o que ia dizer. — Por favor, aproxime mais a vela. Está difícil decifrar essa palavra.
Demetria  suspirou de tédio e olhou de soslaio para o pretendente. Em sua visão embaçada, o rosto de Prudhomme era um borrão redondo e rosado, coroado por uma nuvem de cabelo prateado.
— A vela, menina — disse ele com impaciência, a irritação substituindo por um momento todo o charme do pretendente.
Demetria estendeu o braço sobre a mesa a seu lado, pegou o castiçal e o segurou mais próximo a ele.
— Bem melhor agora — disse Prudhomme satisfeito. — Onde estava mesmo? Ah, sim. Juro minha perene...
Ele fez uma nova pausa e fungou.
— Você sente o cheiro de queimado?
Demetria  aspirou o ar delicadamente. Começou a abrir a boca para dizer que sim, mas antes que pronunciasse qualquer palavra, Prudhomme soltou um grito.
Pulando para trás de surpresa, ela observou com espanto o homem levantar-se de um sobressalto e começar a pular pela sala, levantando os braços enlouquecido e batendo com as mãos na própria cabeça.
De início, Demetria  não conseguiu entender o que estava acontecendo até que o viu tirar da cabeça o que lhe parecia uma mancha branca, que outra coisa não era senão uma peruca que ele passou a bater com força contra a própria perna. Ela deu-se conta então de que talvez tivesse segurado o castiçal perto demais da cabeça dele e posto fogo em sua peruca.
— Ah, meu caro. — Demetria  abaixou o castiçal, sem soltá-lo até certificar-se de que estava bem apoiado sobre a mesa. Com a visão distorcida e seu senso de distância comprometido, ela quase derrubou o homenzinho ao pular da cadeira para ajudá-lo.
— Afaste-se de mim! — ele gritou, empurrando-a.
Demetria caiu sentada na cadeira novamente e olhou-o estarrecida; depois voltou a cabeça por ter ouvido um zunzum à porta.
Todos os empregados da casa tinham ouvido os gritos e corrido para a sala. É claro que sua madrasta estava lá também.
Sem os óculos, Demetria  guia enxergar direito se a olhavam com pena ou repreensão, mas não era necessário olhar para Prudhomme para adivinhar o que estava pensando. Sua raiva ganhara corpo e quase podia tocá-la através dos poucos metros que os separavam.
Prudhomme estava tão zangado que suas palavras emendavam-se umas nas outras, tornando-se quase incompreensíveis. Demetria  conseguiu compreender algumas, como “idiota desajeitada”, “desastrada” e “um perigo para a sociedade”; de repente, ele levantou o braço e avançou em sua direção. Ela congelou, temendo que ele fosse agredi-la.
Felizmente, os presentes desconfiaram que ele estava perdendo o controle e se aproximaram. No momento em que Prudhomme ia lhe dar um bofetão, foi impedido por várias pessoas.
Enquanto lutavam diante dela, Demetria  só percebia uma difusa confusão de pessoas e cores. Ela ouviu, porém, Prudhomme praguejar e um gemido que lhe pareceu ser de Foulkes, o mordomo. O praguejar continuou à medida que um borrão de vultos coloridos começou a sair pela porta.
— Que vergonha, Prudhomme! — choramingou Taylor, com a voz bastante alterada ao seguir os demais até a porta, acrescentando depois em tom ansioso: -
Espero que tão logo tenha se acalmado, possa perdoar Demetria completamente. Tenho certeza de que ela não teve a menor intenção de queimar sua peruca.
Demetria afundou na cadeira com um suspiro de desgosto. Não podia acreditar que a madrasta ainda esperava uni-la àquele homem. Mas devia saber muito bem que Taylor não desistiria de seu intuito.
— Demetria !
Endireitando rapidamente o corpo na cadeira, Demetria  se voltou em direção à porta e viu o vulto lilás de Taylor entrar e bater a porta.
— Como você foi fazer uma coisa dessas?
— Não fiz de propósito, Taylor — esclareceu Demetria . — E isso jamais teria acontecido se você me deixasse usar os óculos.
— Nunca! — retrucou Taylor. — Quantas vezes preciso lhe dizer que jovens que usam óculos simplesmente não arrumam maridos. Sei do que estou falando. Melhor alguém meio desastrada do que com óculos.
— Eu pus fogo na peruca dele! — Demetria exclamou, descrente. — Isso é bem mais do que ser um pouco desajeitada; na realidade, ultrapassa o ridículo. Está se tornando perigoso. Ele poderia ter se queimado muito.
— Poderia! Graças ao bom deus não se queimou — admitiu Taylor, soando repentinamente calma.
Demetria quase gemeu alto. Aprendera muito depressa que quando a madrasta ficava calma, não era um bom sinal.




E É ISSO, APENAS PARA AVISAR, NAO É MINHA FIC, ADAPTAÇÃO! bjemi

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