terça-feira, 25 de dezembro de 2018

ESPLENDOR DA HONRA Capitulo 5



Os ímpios fogem sem que haja ninguém a persegui-los;
mas os justos são ousados como um leão
Provérbios, 28, 1.
Santo Deus, seriam atacados. Paralisada pelo estupor, Demétria começou a tremer de medo. O fato de ter perdido o controle de si mesma com tanta rapidez a enfureceu imensamente. Demétria jogou os ombros para trás, resolvida a pensar com lógica. Inspirou uma profunda e tranquilizadora respiração. Assim, disse a si mesma, agora posso decidir o que tenho a fazer.
OH, como desejou ser valente! Suas mãos estavam começando a ter cãibras, e só então percebeu que estava espremendo as pregas de sua capa com tal força que seus dedos doíam por causa da pressão.
Demétria sacudiu a cabeça, rezando para que a ajuda divina a ajudasse a se decidir.
Com certeza, como prisioneira de Joseph, não tinha o dever de alertá-lo a respeito da ameaça que se estava aproximando. Podia ficar em silêncio e fugir logo que começasse a batalha.
Aquela possibilidade não demorou a ser descartada, porque Demétria compreendeu que caso fizesse tal coisa, então haveria ainda mais mortes. Se avisasse a Joseph, possivelmente poderiam se apressar em sair daquele lugar. Sim, se saíssem imediatamente dali poderiam chegar a se afastar o suficiente para que não pudessem atacá-los, e dessa maneira a batalha não iria acontecer. Por acaso salvar vidas não era mais importante que seu próprio plano de fuga?
Demétria decidiu que ia interceder. Recolheu as saias de seu vestido, correu em busca de seu captor, pensando que era muito irônico que fosse ela que o advertisse do iminente ataque.
Joseph estava de pé no centro de um círculo de soldados, com Nicholas junto dele. Demétria foi avançando ao redor dos homens e se deteve quando esteve atrás de Joseph.
- Quereria ter uma conversa com você, barão - interrompeu Demétria.
Sua voz quebrou por causa da tensão, e suas palavras apenas chegaram a ter um pouco de volume. Sem dúvida essa foi a razão pela qual Joseph não deu importância ao seu pedido, já que simplesmente não a escutou.
- Tenho que falar com você - disse Demétria, repetindo seu pedido em um tom bem mais alto. Depois se atreveu a tocar seu ombro.
Joseph continuou sem lhe dar confiança.
Demétria voltou a tocá-lo, agora fazendo-o com mais força que antes.
Joseph aumentou o tom de sua voz, enquanto continuava falando com seus homens a respeito de algum assunto que Demétria sabia que tinha que ser totalmente insignificante, em comparação com o que ela estava tentando lhe dizer.
Deus, mas que teimoso era aquele homem! Demétria retorceu suas mãos, ficando ainda mais alarmada, a cada segundo que passava, e consumindo-se de preocupação ao pensar que todos aqueles soldados, que agora mesmo estavam subindo pelas colinas, podiam cair sobre eles a qualquer momento.
De repente a frustração de ter que esperar sem poder fazer nada até que Joseph se dignasse reconhecer sua presença se voltou insuportável. A ira tomou o controle. Utilizando até o último grama de força que possuía, Demétria chutou Joseph completamente. O alvo que escolheu para semelhante ação foi a parte de trás do joelho direito do barão, e sua pontaria não pôde ser mais certeira.
Demétria compreendeu imediatamente a insensatez de sua temerária ação, quando uma terrível pontada de dor subiu por sua perna. Os dedos de seu pé certamente estariam quebrados devido ao tremendo impacto, e o único consolo que encontrou para a dor que acabava de infligir-se foi o fato de que, por fim, tinha conseguido atrair a atenção de Joseph. E de uma maneira bastante rápida, além disso. Joseph se voltou para ela, movendo-se com a celeridade de um lobo, quando se dispõe a saltar sobre sua presa.
Parecia achar-se mais assustado que furioso. Demétria não pôde evitar fixar-se em suas mãos, apertadas em punhos, mas que permaneciam imóveis sobre seus quadris. Enquanto torcia o rosto por causa da dor que sentia nos dedos de seus pés, Demétria descobriu que agora era igualmente doloroso olhar diretamente no rosto de Joseph. O que fez em vez disso foi virar-se para olhar para Nicholas e ao fazê-lo aliviou seu desconforto, porque agora o rosto do irmão refletia a expressão mais ridícula que se pudesse imaginar.
- Eu gostaria de ter uma palavra com você a sós - declarou Demétria, quando por fim se sentiu capaz de voltar a olhar para Joseph
A preocupação que tinha ouvido na voz de Demétria despertou a curiosidade de Joseph. Assentiu e, agarrando-a pelo braço, levou-a para o outro lado do acampamento.
Demétria tropeçou duas vezes.
Em um dado momento Joseph suspirou, um suspiro bem prolongado e cheio de cansaço; Demétria soube que isso iria beneficiá-la.
Demétria pouco se incomodava se Joseph a fizesse se sentir sem importância como se fosse um espinho em sua pele. Assim que ela se explicasse, Joseph não iria mais considerar sua interrupção como um incômodo. De fato, inclusive podia chegar a lhe agradecer, embora Demétria duvidasse que aquele homem fosse capaz de semelhante reação.
E o que era ainda mais importante, as mortes poderiam ser evitadas. Esse pensamento lhe deu a coragem necessária para olhar para Joseph, diretamente nos olhos.
- Uns homens estão vindo pelo vale - disse.
Demétria tinha esperado que houvesse uma reação imediata diante de sua informação, mas Joseph se limitou a olhá-la em silêncio. Não mostrou absolutamente nenhuma reação.
Aquilo fez com que Demétria se visse obrigada a repetir suas palavras.
- Alguns soldados vêm para cá subindo pelas colinas - disse -. Pude ver o sol refletindo-se em seus escudos. Não acha que deveria fazer algo a respeito?
Acaso ia transcorrer toda uma eternidade antes que, por fim, chegasse a empreender algum tipo de ação? Demétria considerou aquela possibilidade enquanto esperava que Joseph dissesse algo.
Ele estava olhando para ela da maneira mais inquietante possível, com seu duro e anguloso rosto mostrando claramente a perplexidade que sentia. Demétria também acreditou ver cinismo ali, naqueles olhos cinza que a gelavam com o olhar. Finalmente, chegou à conclusão de que Joseph estava tentando decidir se ela estava dizendo a verdade.
- Eu nunca disse uma mentira em toda minha vida, barão - assegurou-lhe -. Se me seguir, vou mostrar que digo a verdade.
Joseph contemplou àquela bonita jovem que se mantinha tão orgulhosamente erguida na frente dele. Grandes olhos azuis elevavam o olhar para ele para observá-lo em uma imensa confiança. Mechas de cabelos castanho avermelhado flutuavam através de suas bochechas. A bolinha de terra que havia em um lado de seu nariz atraía a atenção de Joseph.
- Por que me faz esta advertência? - perguntou-lhe.
- Por quê? Para que possamos nos afastar deste lugar o mais depressa possível - respondeu Demétria, franzindo o cenho ante a estranha pergunta que Joseph acabava de lhe fazer -. Não quero que haja mais mortes.
Joseph assentiu, satisfeito com sua resposta, e chamou Nicholas com um gesto. Seu irmão ficou imóvel a seu lado, tratando de ouvir o que ele estava dizendo.
- Lady Demétria acaba de perceber que estão nos seguindo - observou Joseph.
Nicholas se mostrou surpreso. Ele não tinha chegado a perceber, em nenhum momento, que estivessem sendo seguidos, e se virou para olhar para Demétria.
- Estão-nos seguindo? - perguntou -. Sabe disso há quanto tempo, Joseph?
- Desde o meio-dia - respondeu Joseph, encolhendo os ombros.
- São saqueadores? - inquiriu Nicholas.
Sua voz se suavizou em uma tentativa de imitar a atitude de despreocupação que tinha visto seu irmão adotar. Por dentro, enfurecia-se com o fato de Joseph ter ficado em silêncio ao longo de toda a tarde. Mas também se sentia bastante perplexo, e se perguntava por que razão Demétria ter-lhes-ia advertido.
- Não são saqueadores, Nicholas.
Um momento de silêncio, que pareceu não ia terminar nunca, prolongou-se entre os dois irmãos antes que uma sombra de compreensão passasse velozmente pelo rosto de Nicholas.
- O rato persegue o lobo? - perguntou.
- Se Deus quiser, desta vez ele está à frente de seus homens - respondeu Joseph.
Nicholas sorriu. Joseph assentiu e, então, continuou falando.
- Eu pensei enfrentá-los um pouco mais perto de casa, em Creek Crossing, mas as colinas abaixo de nós, pode nos proporcionar a mesma vantagem. Diga aos homens que se preparem.
Nicholas deu meia volta e correu através da clareira, gritando a ordem de montar.
Demétria tinha ficado muito atônita para que conseguisse falar. Seu plano de dar o aviso, a fim de que pudesse evitar que houvesse uma batalha, se evaporou assim que a risada de Nicholas chegou até ela. Mas não tinha entendido qual podia ser o significado da breve conversa mantida pelos irmãos. Tinham falado em adivinhações, dizendo bobagens sobre ratos e lobos.
- Então eu estava certa - balbuciou finalmente -. Na realidade, você é igual a Sebastian, não é?
Joseph ignorou seu ataque de fúria.
- Monte em meu cavalo, Demétria - disse-lhe -. Iremos ao encontro de seu irmão juntos.
Demétria estava muito furiosa para que passasse por sua cabeça protestar. Disse a si mesma que Joseph jamais viraria as costas a um combate. Acaso não tinha aprendido aquela lição quando tentou convencê-lo de sair das terras de Sebastian?
Antes que pudesse perceber o que acabava de fazer, Demétria se viu instalada em cima da garupa de Silenus. Sua ira tinha feito com que se esquecesse a respeito de seu medo, e agora nem sequer podia se lembrar por qual dos lados tinha montado no cavalo.
Joseph foi até ela, agarrou as rédeas e começou a conduzir ao animal através da clareira.
Demétria se agarrou à sela de montar para continuar com vida, inclinando os ombros para frente para aquele duro trabalho. Os estribos eram muito baixos para que seus pés pudessem alcançá-los, e seu traseiro batia a cada passo que dava o animal. Lamentavelmente, Demétria sabia que era inexperiente em montar, e agradeceu que Joseph não estivesse olhando para ela.
- Com que nome você chama seu cavalo? - perguntou.
- Cavalo - respondeu Joseph, falando por cima do ombro -. Meu animal é um cavalo e é assim que eu o chamo.
- Tal como eu suspeitava. É tão frio e desumano que nem sequer foi capaz de encontrar um tempo para nomear seu leal cavalo. Eu lhe dei um nome. Silenus. O que lhe parece? - perguntou Demétria.
Joseph se negou a responder àquela pergunta. O fato de Demétria ter o descaramento de colocar um nome em seu cavalo deveria irritá-lo, mas seus pensamentos já estavam concentrados na batalha que os aguardava. Joseph não iria se distrair por uma conversa tão insignificante.
Demétria sorriu para si mesma, sentindo-se muito satisfeita com a maneira com que soube provocá-lo. Então, Ansel apareceu junto dela, trazendo consigo outro cavalo, uma montaria salpicada de cinza que parecia ser muito mais dócil que Silenus. Joseph se virou para Demétria, jogou-lhe as rédeas sem dizer uma palavra e montou no cinzento.
O sorriso congelou bruscamente no rosto de Demétria. Agarrou as rédeas que acabavam de lhe jogar, sentindo-se terrivelmente aflita quando percebeu que Joseph esperava que fosse ela que guiasse o animal. O cavalo deve ter percebido a preocupação que a embargava, porque em seguida começou a afastar-se para o lado. Seus pesados cascos atingiam o chão com uma força suficiente para desmontar Demétria, que lamentou ter feito um bom trabalho na hora de fingir que sabia montar.
Nicholas apareceu do outro lado de Demétria, cavalgando sobre um cavalo castanho. Em seguida obrigou sua montaria a aproximar-se do cavalo de Joseph, efetivamente bloqueando a passagem do arisco animal.
- Ainda estão a certa distância daqui - observou, depois, dirigiu-se a seu irmão mais velho por cima da cabeça de Demétria -. Vamos esperá-los, irmão?
- Não - respondeu Joseph -. Iremos encontrá-los no meio do caminho.
Os soldados já estavam em formação atrás do trio, armando um terrível barulho enquanto o faziam. Demétria pareceu que Joseph esperava até que o ruído teve diminuído um pouco antes de dar o sinal.
- Ficarei aqui até que retorne - disse então a Joseph.
Sua voz tinha-se mostrado cheia de desespero. Joseph se virou para olhá-la, sacudiu a cabeça e virou novamente para o vale.
- Eu ficarei aqui - anunciou Demétria.
- Não o fará - replicou Joseph, sem sequer se incomodar em lhe dirigir o olhar por um instante, enquanto lançava aquela áspera negativa.
- Você pode me amarrar em uma árvore - sugeriu Demétria.
- Ah, lady Demétria, mas acredito que não vai querer negar a Sebastian a visão de seu lindo rosto, não é? - Nicholas fez aquela pergunta com um sorriso no seu -. Prometo-lhe que será a última coisa que ele verá antes de morrer - acrescentou o irmão mais novo de Joseph.
- Você dois vão se deliciar com esta batalha, não é verdade? - perguntou Demétria. Estava tão atônita que sua voz tremia.
- Não resta dúvida de que eu desfrutarei com ela - respondeu Nicholas, encolhendo os ombros.
- Parece-me que está tão louco como seu irmão, Nicholas - disse Demétria.
- Você sabe que temos uma boa razão para querer ver seu irmão morto - anunciou Nicholas, e o sorriso foi abandonando lentamente seu rosto -. Da mesma maneira em que você deve querer nos ver mortos - acrescentou, zombando dela com um desdém deliberado em sua voz.
Demétria se apressou a olhar para Joseph para ver de que maneira ele reagia à observação que seu irmão acabava de fazer, mas o barão não parecia estar prestando nenhuma atenção na conversa deles. Voltou-se novamente para o Nicholas.
- Entendo por que querem matar Sebastian. E o que não quero é que você ou seu irmão morram neste confronto, Nicholas - acrescentou -. Por que pensa que desejo tal coisa?
Nicholas franziu o cenho, visivelmente confuso.
- Por que tipo de idiota você me toma, lady Demétria? - perguntou então -. Agora tenta me dizer que não vai tomar partido de Sebastian, não é? Sebastian é seu irmão.
- Não tomarei partido de ninguém - arguiu Demétria -. Não quero que ninguém morra.
- Oh, agora vejo qual é seu plano - replicou Nicholas, que estava quase gritando -. Vai esperar para ver quem será o ganhador e então vai escolher o bando ao qual vai se unir. Muito ardiloso de sua parte, realmente.
- Acredite no que quiser - respondeu Demétria -. Você se parece muito com seu irmão - acrescentou, sacudindo a cabeça.
Quando Nicholas sorriu, Demétria percebeu que se havia ele estava bem satisfeito com seu comentário.
- Não estou fazendo nenhum elogio, Nicholas - esclareceu -. É justamente o contrário. Está demonstrando que é tão teimoso e implacável como Joseph. Parece que desfruta matar tanto quanto ele - concluiu.
Por dentro Demétria não podia evitar se sentir horrorizada ante a maneira com que tinha tentado manipular Nicholas, até conseguir que ele perdesse o controle, mas, e que Deus a ajudasse, não parecia ser capaz de se conter.
- Pode me olhar nos olhos e honestamente dizer que não me odeia? - perguntou Nicholas. Estava tão furioso que marcava claramente sua veia no pescoço. Demétria pensou que queria atingi-la.
- Não odeio você, Nicholas. Admito que eu gostaria de odiá-lo, mas não odeio.
- E por que não me odeia? - perguntou Nicholas.
- Porque você ama sua irmã.
Nicholas se dispôs a dizer a Demétria que acreditava que ela fosse a mulher mais tola que ele já havia encontrado, quando Joseph atraiu sua atenção. O irmão mais novo se esqueceu imediatamente de Demétria e deu meia volta para levantar sua espada.
Joseph finalmente deu o sinal. De repente Demétria se sentiu tão aterrada que nem sequer pôde se lembrar de uma de suas preces.
Ia ser um combate de morte? Demétria já sabia o suficiente sobre a teimosia de Joseph para ter a certeza de que não se importava com quem estivesse contra ele.
Ela tentou, mas não conseguiu contar o número de soldados que estavam subindo pelas colinas. Cobriam o chão como gafanhotos.
Voltavam a superar o número de homens de Joseph?
Demétria pensou que aquilo seria uma autêntica carnificina, e todo porque Joseph ia lançar o desafio de honra e Sebastian não. Era algo muito fácil de entender, mas que sempre estaria além da compreensão de alguém como o barão de Wexton. Era evidente que Joseph tinha esquecido como tinha sido enganado por Sebastian para que acreditasse que este faria honra à trégua temporária que tinham acordado entre os dois. Foi assim que Sebastian havia capturado Joseph, mediante um simples engano.
Demétria conhecia Sebastian muito melhor que Joseph. Se ele sentisse que o aroma da vitória estava de seu lado, então seu irmão lutaria como um animal.
Demétria disse a si mesma que não lhe importava quem terminasse reivindicando a vitória. Se eles desejavam se matar uns aos outros, então que fosse assim. Seriam suas vontades que iriam prevalecer, não a dela.
- Eu não vou me importar - sussurrou uma e outra vez, até que suas palavras se converteram em um cântico desesperado.
Mas, por mais que ela pronunciasse aquelas palavras, Demétria não podia fazer com que elas fossem verdadeiras.





FELIZ NATAAALLLLLL

sábado, 15 de dezembro de 2018

Esplendor da Honra Capitulo 4


Malvado é o homem que conheceu a honra
e a desprezou.
O barão Sebastian estava só a meio-dia de dura galopada do lugar em que Joseph e seus soldados tinham acampado. A sorte estava ao seu lado, porque pôde cavalgar durante as horas noturnas sob a luz de uma resplandecente lua cheia. Seus soldados igualavam aos homens de Joseph, tanto em lealdade como em número, e nenhum deles se queixou daquela súbita alteração em seus planos.
Um servente que estava meio louco tinha ido atrás deles para lhes comunicar a vil ação de Joseph. Então todos se apressaram em retornar à fortaleza de Sebastian. Todos tinham presenciado a mensagem nela deixada pelo barão de Wexton. Sim, todos tinham visto os corpos mutilados daqueles soldados que ele deixou na fortaleza, encarregados de custodiar os domínios de Sebastian. Os homens se uniram em um clamor de indignação e vingança, e cada um deles jurou ser aquele mataria Joseph.
O fato de todos eles terem se unido a Sebastian e de terem agido traiçoeiramente a respeito do barão de Wexton era passado, por isso ignorado, porque agora todos estavam completamente concentrados em vingar o homem que os liderava.
Sebastian não tinha demorado muito em decidir que iria atrás Joseph. A razão que o impulsionou a tomar tal decisão tinha sido duplicada. Acima de tudo, estava o fato de saber que seu próprio plano para destruir o barão de Wexton, mediante o uso de meios que não tinham nada de honrados seria revelado, o que faria de Sebastian um covarde, podendo ser ridicularizado dentro da corte. Joseph alertaria William II e embora favorecesse Sebastian, apesar disso, o rei ver-se-ia obrigado a determinar que os dois adversários liderassem um combate de morte, para que assim pudesse colocar fim, de uma vez por todas, no que provavelmente considerasse como uma insignificante diferença de opinião. O rei - a quem chamavam Rufus, The Red, em razão de seu rosto corado e ao apaixonado temperamento - sem dúvida ficaria muito irritado com essa questão. Sebastian também sabia que se tivesse que se enfrentar a sós com Joseph em um campo de batalha, sairia perdedor. O barão de Wexton era um guerreiro invencível, que tinha demonstrado sua capacidade incontáveis vezes. Sim, Joseph mataria Sebastian logo que tivesse a oportunidade de fazê-lo.
Sebastian era um homem dotado de muitas habilidades, mas estas ficavam limitadas a certas áreas que não eram de muita ajuda contra alguém como Joseph. Sebastian tinha chegado a se converter em um poder com o qual poder-se-ia contar dentro da corte. Interpretava o papel de uma espécie de secretário, e isso apesar do fato de não saber ler ou escrever, confiando todos os assuntos mundanos aos dois sacerdotes que residiam na corte. Quando o rei recebia, a principal obrigação de Sebastian consistia em determinar quem eram aqueles que tinham assuntos verdadeiramente merecedores a serem tratados com o rei, e quem não os tinha. Aquilo tinha terminado por conferir-lhe uma posição muito poderosa. Sebastian era um mestre na arte da manipulação. Infundia o medo naqueles homens de títulos inferiores ao dele, que estavam dispostos a pagar de boa vontade, apenas em troca de ter a oportunidade de falar com seu rei. Sebastian aplainava o caminho para aqueles homens que só pensavam em uma coisa, e ia enchendo seus bolsos de ouro ao fazê-lo.
Agora, se sua tentativa de matar Joseph chegasse a ficar conhecida, ele poderia perder tudo.
O irmão de Demétria era considerado por todos como um homem muito atraente. Tinha os cabelos loiros, com apenas uma sombra de ondulação para empanar suavemente o brilho de seus olhos de cor avelã com raios de dourado. Também era alto, embora fosse magro como um junco, com uns lábios perfeitamente esculpidos. E quando sorria, faltava muito pouco às damas da corte para desmaiarem diante dele. As duas irmãs de Sebastian, Camille e Sara, compartilhavam a mesma cor morena dos cabelos e o mesmo tom avelã dos olhos. Camille e Sara eram quase tão bonitas como Sebastian era atraente, e eram igualmente tão solicitadas quanto ele.
Sebastian era conhecido como um dos solteiros mais disponíveis e poderia escolher qualquer mulher na Inglaterra. Mas ele não queria ter qualquer mulher. Queria Demétria. Sua meio-irmã era a segunda razão pela qual Sebastian andava atrás de Joseph. Demétria tinha voltado para casa dele fazia apenas dois meses, e depois de haver-se esquecido dela durante a maior parte dos anos em que Demétria esteve crescendo, Sebastian tinha ficado muito impressionado quando viu as notáveis mudanças que tinham ocorrido em sua aparência. Demétria sempre tinha sido uma criança muito feia. Seus grandes olhos azuis engoliam a maior parte de sua face. Seu lábio inferior tinha sido muito carnudo e sua expressão passava a maior parte do tempo imobilizada em uma careta, além do que também era fraca o bastante para que chegasse a parecer doente. Sim, Demétria tinha sido uma criança feia e desajeitada, com aquelas pernas tão longas e ossudas que sempre a faziam fraquejar cada vez que tentava executar uma reverência.
Mas não restava dúvida de que Sebastian havia se equivocado ao julgar seu potencial. Durante a infância nunca tinha havido nada no aspecto de Demétria que fosse capaz de sugerir o fato de que algum dia pudesse chegar a se parecer tanto com sua mãe. Demétria tinha deixado de ser uma criança da qual alguém se envergonhasse para se converter em uma completa beleza, e de fato agora era tão bonita que eclipsava suas meio-irmãs.
Quem teria pensado que semelhante milagre pudesse chegar a ocorrer? A tímida larva havia se convertido em uma magnífica borboleta. Os amigos de Sebastian também ficaram sem fala quando viram Demétria pela primeira vez. Morcar, que era o grande confidente de Sebastian, inclusive tinha chegado ao extremo de suplicar a este que lhe concedesse a mão de Demétria em casamento, depositando umas quantas libras de ouro diante de seu pedido.
Sebastian não estava muito certo de poder permitir que Demétria terminasse nas mãos de outro homem. Demétria se parecia tanto com sua mãe, que quando Sebastian a viu pela primeira vez, a reação que teve diante dela foi de uma natureza totalmente física. Aquela foi a primeira vez em muitos anos que Sebastian sentia agitar dentro dele semelhante sentimento por uma mulher, e essa novidade surtiu um efeito tremendo sobre ele. Só a mãe de Demétria tinha sido capaz de afetá-lo de tal maneira. Ah, Dianna, o grande amor de seu coração! Ela tinha estragado Sebastian para as demais mulheres. Agora que não podia ter Dianna, era como se tivessem lhe roubado todo seu caráter. Sebastian tinha acreditado que sua obsessão terminaria chegando ao fim com a morte de Dianna, e agora tinha que admitir que tudo tinha sido uma vã esperança. Não, a obsessão continuava vivendo. Demétria, sua meio-irmã, bem que poderia ser sua segunda oportunidade de demonstrar que era um homem.
Sebastian levava uma existência atormentada. Não conseguia chegar a se decidir entre sua cobiça e sua luxúria. Queria ter Demétria para seu uso próprio, mas também queria o ouro que ela traria consigo. Se fosse ardiloso o bastante, pensou, possivelmente pudesse ter ambas as coisas.
Demétria acordou na posição mais embaraçosa possível. Estava em cima de Joseph. Uma bochecha descansava sobre seu duro e plano estômago, suas pernas estavam entrelaçadas com as do barão, e suas mãos estavam colocadas entre as coxas dele.
O estado sonolento em que sua mente esta mergulhada fez com que Demétria não percebesse onde exatamente estavam descansando suas mãos. Joseph parecia tão quente, entretanto... tão duro. OH, Deus, suas mãos tinham se aconchegado junto à parte mais íntima de Joseph!
Os olhos de Demétria se abriram de repente. Retesou-se junto a seu captor, sem sequer se atrever a respirar. Que esteja dormindo, rezou freneticamente enquanto ia separando pouco a pouco suas mãos do calor de Joseph.
- Por fim está acordada.
Joseph soube que tinha lhe dado um susto, quando a sentiu ficar subitamente rígida junto a ele. Então as mãos de Demétria se incrustaram violentamente na união de suas pernas, e Joseph reagiu com um gemido. Demônios, Demétria ainda conseguiria fazer dele um eunuco se ele lhe desse meia oportunidade!
Demétria se virou de lado, atrevendo-se a levantar a vista para lançar um rápido olhar a Joseph. Pensou que provavelmente tivesse que se desculpar por tê-lo golpeado acidentalmente justo naquele lugar, mas então saberia que ela era plenamente consciente de onde tinham estado suas mãos, não é?
Oh, céus, podia sentir como começava a se ruborizar. E aquela manhã Joseph voltava a franzir o cenho. De qualquer maneira, não parecia estar disposto a escutar nenhuma desculpa que ela pudesse lhe oferecer, por isso Demétria decidiu esquecer suas preocupações.
O barão de Wexton tinha um aspecto realmente feroz. Sim, a barba castanho escuro que tinha começado a crescer realmente fazia com que ele parecesse mais um lobo que um homem, e além disso ele a observava com uma curiosidade que Demétria achou muito inquietante. Suas mãos continuavam abrangendo suas costas. Então, Demétria se lembrou de como ele tinha lhe dado calor durante a noite, quando poderia ter-lhe feito mal com a mesma facilidade. Demétria era consciente de que sua mente estava tentando avivar o medo que Joseph lhe inspirava, mas era honesta o bastante para admitir que a verdade, na realidade, era justamente o contrário. Oh, Joseph a assustava, certamente, mas não da mesma maneira com que Sebastian fazia.
Esse dia era a primeira vez em semanas, de fato desde que tinha voltado para a casa de seu irmão, em que Demétria não havia acordado sentindo em seu estômago um desagradável nó produzido pelo medo. Também conhecia a razão de não ser assim: Sebastian não estava ali.
Joseph não se parecia em nada com Sebastian. Não, um homem que desejava infligir crueldade, sem dúvida, não teria compartilhado seu calor com ela enquanto dormiam. E além disso, Joseph honrava sua palavra. Não tinha se aproveitado de... Santo Deus, ela o beijou! Demétria se lembrou de cada fragmento do ocorrido com uma súbita clareza que acelerou seu pulso.
Demétria tinha certeza de que sua expressão não revelava os espantosos pensamentos que passavam por sua cabeça, e deu graças a Deus pelo fato de ter aprendido a ocultar seus sentimentos. Aquilo era um pequeno consolo, não? Sim, pensou com um leve suspiro, Joseph não podia saber o que ela estava pensando.
Joseph observava Demétria, secretamente divertido pela maneira com que ela ia mostrando uma emoção atrás da outra. Seus olhos a delatavam. Durante os últimos minutos, Joseph tinha visto neles medo, vergonha e, pareceu-lhe ser também alívio.
O barão de Wexton era um homem que tinha aprendido a encontrar todos os defeitos que houvesse nos outros. Como guerreiro, saber o que estava passando pela mente de seu oponente fazia com que suas próprias reações fossem mais rápidas. Joseph também tinha aprendido a descobrir o que seu inimigo mais dava valor. E uma vez que descobria, então o arrebatava. Era a maneira de agir própria daqueles que combatiam, mas essas lições também tinham chegado a se misturar em suas relações pessoais. Uma coisa não podia ficar separada da outra. E embora Demétria não tivesse consciência disso, já tinha proporcionado várias pistas muito importantes a respeito de seu caráter. Demétria era uma mulher que valorizava muito o controle. Manter ocultas suas emoções parecia ser uma tarefa muito importante para ela. Demétria já tinha lhe revelado que nem todas as mulheres eram governadas por suas emoções. Só em uma ocasião tinha mostrado algum tipo de reação externa, durante a destruição de seu lar. Então, tinha gritado com voz cheia de angustia, quando viu o corpo mutilado de um vassalo de Sebastian. Entretanto, Joseph duvidava que Demétria soubesse que tinha chegado a perder o controle de si mesma.
Sim, Joseph estava descobrindo todos os segredos de Demétria, e o que tinha averiguado até o momento o deixava perplexo. Para falar a verdade, também muito lhe agradava.
Separou-se dela, porque do contrário o impulso de voltar a tomá-la em seus braços e beijá-la novamente teria chegado ser muito intenso para que pudesse continuar sendo ignorado. De repente tinha muita vontade de chegar à fortaleza. Não iria se sentir tranquilo até que tivesse Demétria bem protegida atrás dos muros de sua fortaleza.
Joseph ficou em pé, espreguiçando-se até que todos seus músculos ficaram despertos e, então, se afastou de Demétria, que para todos os efeitos práticos deveria apagar de seus pensamentos. O sol ia subindo para as nuvens leitosas que flutuavam no céu, umas nuvens que certamente impediriam a passagem de qualquer calor que pudesse chegar a derreter a geada noturna que cobria o chão. Havia muito a fazer antes que houvesse luz suficiente para sua viagem. Embora o novo dia já tivesse a mordida do frio, o vento era tênue o bastante para que Joseph se sentisse satisfeito.
Demétria sabia que não demorariam a cavalgar. Calçou seus sapatos, sacudiu a terra de seu vestido e envolveu seus ombros com a capa. Sabia que parecia um autêntico horror, e decidiu que teria que fazer algo.
Foi em busca de Ansel. O escudeiro estava preparando o cavalo de Joseph. Demétria lhe perguntou onde estava sua bolsa, embora se mantivesse a uma prudente distância da grande besta e teve que gritar sua pergunta. Depois, expressou profusamente sua gratidão ao moço assim que ele jogou sua bolsa.
A princípio, ela apenas ia espantar o sono dos olhos, mas aquelas águas cristalinas pareciam muito tentadoras. Demétria utilizou o sabão aromático que tinha metido dentro de sua bolsa para tomar um rápido banho e depois trocou de sua vestimenta.
Deus, que frio fazia! Quando terminou de se vestir, Demétria já estava tremendo. Usava um vestido amarelo pálido que chegava até os tornozelos por cima de uma suntuosa meia túnica de cor dourada até os joelhos. Uma banda bordada em azul real circundava as longas mangas do segundo objeto.
Demétria voltou a guardar tudo em sua bolsa, e depois se ajoelhou junto ao riacho e começou a desembaraçar seu cabelo. Agora que tinha descansado, e que sua mente não estava consumida pelo medo, dispunha de muito tempo para pensar em sua situação. A primeira pergunta que teria que responder era por que Joseph a levou com ele. Havia-lhe dito que lhe pertencia. Demétria não entendeu o que ele quis dizer com semelhante observação, mas era muito tímida para pedir que ele se explicasse.
Nicholas veio procurá-la. Demétria ouviu quando ele se aproximou e se virou justamente em tempo de vê-lo chegar.
- É hora de cavalgar! - gritou Nicholas. A força de sua voz quase a jogou na água. Nicholas se apressou a estender a mão para colocá-la de pé com um brusco puxão, que sem perceber a salvou daquela humilhação.
- Ainda tenho que recolher meu cabelo, Nicholas. Então, estarei pronta. E realmente não tem necessidade de gritar comigo - acrescentou, mantendo um tom deliberadamente suave -. Com certeza tenho um ouvido muito bom.
- Seu cabelo? Ainda tem que...? - Nicholas tinha ficado muito perplexo para que pudesse continuar falando, e lançou um olhar que sugeria que Demétria tinha perdido o juízo -. É nossa prisioneira, pelo amor de Deus - conseguiu balbuciar finalmente.
- Sim, já sabia disso - respondeu Demétria, falando em um tom tão sereno como a brisa da manhã -. Mas isso significa que posso terminar de me arrumar o cabelo antes de partirmos, ou que não posso fazê-lo?
- Tenta zombar de mim ou o que pretende? - gritou Nicholas -. Lady Demétria, sua situação já pode ser considerada muito delicada na melhor das hipóteses. É muito tola para perceber isso?
Demétria sacudiu a cabeça.
- Por que está tão zangado comigo? - perguntou-lhe -. Grita cada palavra. É um hábito normal, ou é por que sou a irmã de Sebastian?
Nicholas não respondeu imediatamente, mas sua face se tornou de um vermelho intenso. Demétria sabia que o estava deixando ainda mais furioso. Lamentava por isso, mas decidiu seguir adiante de qualquer maneira. Era evidente que Nicholas não sabia controlar seu caráter, e se conseguisse provocá-lo o suficiente, possivelmente ele lhe diria o que ia acontecer com ela. Nicholas era muito mais fácil de entender que seu irmão. E muitíssimo mais fácil de manipular, se Demétria soubesse ser ardilosa o bastante.
- Por que me capturaram? - perguntou a Nicholas sem poder se conter.
A pergunta direta que acabava de formular fez com que Demétria torcesse o rosto em uma careta de desgosto. Não tinha sido muito ardilosa afinal de contas, e por causa disso ficou bastante surpresa quando Nicholas chegou a responder.
- Foi seu irmão quem fixou os termos desta guerra, Demétria. Isso é algo que você sabe muito bem.
- Não há nada que eu saiba bem o suficiente - protestou Demétria -. Explique-me isso se tiver a bondade. Eu gostaria de chegar a entendê-lo.
- Por que se faz de inocente comigo? - quis saber Nicholas -. Todo mundo na Inglaterra sabe o que esteve acontecendo durante o último ano.
- Nem todo mundo, Nicholas - replicou Demétria -. Faz apenas dois meses que retornei à casa de meu irmão. E passei muitos anos vivendo em uma área muita isolada.
- Sim, isso é certo - zombou Nicholas -. Viveu com seu sacerdote excomungado, conforme entendi.
Demétria pôde sentir como sua compostura começava a se rachar. Agora queria gritar com aquele vassalo arrogante. Por acaso toda a Inglaterra acreditava naquele horrível rumor?
- Muito bem - anunciou Nicholas, parecendo não perceber a nova onda de fúria que se apropriou de Demétria -. Vou contar toda a verdade, e quando tiver terminado de fazê-lo, então já não será capaz de continuar fingindo. Os soldados de Sebastian atacaram duas propriedades que pertenciam a vassalos leais de Joseph. Em cada um dos ataques teve lugar uma matança totalmente desnecessária de mulheres e crianças. Os vassalos tampouco receberam nenhuma advertência prévia, porque seu irmão fingiu que vinha em missão de amizade até que seus homens já estavam dentro das fortalezas.
- Por quê? - perguntou Demétria -. Por que Sebastian faria algo semelhante? O que esperava lucrar com isso?
Tentou fazer com que ele não notasse quão atônita suas palavras a deixaram. Demétria sabia que seu irmão era capaz de tais traições, mas mesmo assim não podia entender o motivo.
- Sem dúvida Sebastian tinha que saber que sendo o senhor dessas terras, Joseph responderia de algum jeito - continuou dizendo -. Sim, Demétria, e essa era precisamente sua esperança. Sebastian estava tentando matar Joseph - acrescentou com uma obscena gargalhada -. Seu irmão está faminto de poder. Só há um homem a quem deve temer em toda a Inglaterra, e esse homem é Joseph. Eles são iguais em poder. Todos sabem que Sebastian pode fazer com que o rei o escute, é certo, mas os soldados de Joseph são os melhores guerreiros do mundo. O rei dá valor à lealdade de meu irmão tanto como dá valor à amizade de Sebastian.
- O rei permitiu essa traição? - perguntou Demétria.
- William se nega a agir sem provas - respondeu Nicholas, e sua voz refletiu o desgosto que sentia -. Não defende nem Sebastian nem Joseph. Uma coisa sim posso lhe prometer, lady Demétria: quando nosso rei retornar da Normandia, já não poderá continuar fugindo do problema por mais tempo.
- Então Joseph não pôde agir em nome de seus vassalos? - perguntou Demétria -. É essa a razão pela qual o lar de meu irmão foi destruído?
- É muito ingênua se acredita que Joseph não fez nada. Expulsou imediatamente aqueles bastardos das propriedades de seus vassalos.
- Agiu da mesma forma que agiram com ele, Nicholas? - Demétria sussurrou sua pergunta -. Joseph também matou os inocentes assim como os culpados?
- Não - respondeu Nicholas -. Não fez nada com as mulheres e as crianças. Apesar de tudo o que possa dizer de seu irmão, Demétria, os Wexton não são sanguinários. E nossos homens tampouco se escondem atrás de cores falsas quando atacam.
- Sebastian não me diz nada - Demétria voltou a protestar -. Você esquece que sou apenas uma irmã. Não mereço que ele compartilhe seus pensamentos comigo. - Seus ombros se encurvaram. OH, Deus, havia tanto a refletir, tanto que raciocinar e esclarecer... -. O que vai acontecer se o rei ficar do lado de Sebastian? O que acontecerá a seu irmão, então?
Nicholas ouviu o medo que havia em sua voz. De repente Demétria estava se comportando como se realmente se importasse com o que pudesse acontecer com Joseph. Aquilo não tinha nenhum sentido, considerando sua posição como prisioneira. Lady Demétria conseguiria confundi-lo se ele assim o permitisse.
- Joseph é um homem que tem pouca paciência, e seu irmão selou seu destino quando ousou tocar em um Wexton - disse -. Meu irmão não vai esperar que o rei volte para a Inglaterra para que possa ordenar uma luta de morte com o bastardo de seu irmão. Não, Joseph vai matar Sebastian, com ou sem a bênção do rei.
- A que você se refere quando diz que Sebastian tocou em um Wexton? - perguntou Demétria -. Havia outro irmão Wexton e Sebastian o matou? - supôs.
- Ah, assim finge que também nada sabe a respeito de Miley. É essa a maneira que funciona este jogo? - quis saber Nicholas.
Um súbito nó de medo oprimiu o estômago de Demétria, porque não deixou de perceber a aterradora expressão que acabava de aparecer nos olhos do Nicholas.
- Por favor - murmurou, baixando a cabeça contra seu ódio -. Tenho que saber tudo a respeito disto. Quem é Miley?
- Nossa irmã.
Demétria, de repente, levantou a cabeça.
- Iriam à guerra por sua irmã? - perguntou. Parecia totalmente assombrada. Nicholas não soube que conclusões tirar de semelhante reação.
- Nossa irmã foi à corte, e enquanto estava ali, Sebastian a surpreendeu em um momento em que estava sozinha - explicou -. Violou-a, Demétria, e bateu nela com tamanha brutalidade que é um milagre que tenha sobrevivido. Seu corpo se curou, mas sua mente ficou em pedaços.
A compostura de Demétria caiu definitivamente. Deu as costas a Nicholas para que este não pudesse ver as lágrimas que corriam por suas bochechas.
- Sinto muito, Nicholas - murmurou.
- E acredita no que acabo de lhe contar? - quis saber Nicholas, falando com voz enrouquecida. Queria estar certo de que lady Demétria já não seria capaz de continuar negando a verdade.
- Uma parte dessa história, sim - respondeu Demétria -. Sebastian é capaz de bater em uma mulher até matá-la. Mesmo assim, não sei se poderia violar uma mulher, mas se disser que foi isso que aconteceu, então eu acreditarei em você. Meu irmão é um homem muito malvado. Não lhe concedo minha defesa.
- Então no que você não acredita? - perguntou Nicholas, voltando a gritar.
- O que você me disse me faz pensar que você dá valor a sua irmã - confessou Demétria -. Isso é o que me deixa tão confusa.
- OH, em nome de Deus! Pode-se saber do você que está falando?
- Você me fez objeto de sua cólera porque Sebastian desonrou o sobrenome dos Wexton, ou porque realmente ama sua irmã?
A incrível obscenidade daquela pergunta encheu Nicholas de fúria. Agarrou Demétria, virou-a bruscamente até deixá-la face a face com ele, enquanto suas mãos apertavam dolorosamente os ombros.
- É obvio que amo minha irmã! - gritou -. Olho por olho, Demétria. Arrebatamos de seu irmão o que ele mais dá valor. Você! Agora Sebastian virá atrás de você, e quando o fizer, morrerá.
- Assim, eu sou responsável pelos pecados de meu irmão?
- É um peão que será utilizado para atrair o demônio - resmungou Nicholas.
- Esse plano tem uma falha - murmurou Demétria, e a vergonha que sentia ressonou em sua voz -. Sebastian não virá por mim. Não significo o suficiente para que ele venha por mim.
- Sebastian não é nenhum idiota - disse Nicholas, enfurecendo-se porque de repente compreendeu que Demétria não podia ter falado mais sério.
Nem Demétria nem Nicholas ouviram Joseph chegar.
- Tire as mãos de cima dela, Nicholas. Agora!
Nicholas se apressou a obedecer e inclusive deu um passo atrás, interpondo um pouco de distância entre ele e sua prisioneira.
Joseph foi até seu irmão, com a intenção de averiguar por que Demétria estava chorando. Permitiu que Nicholas visse quão furioso estava.
Demétria se colocou entre os dois irmãos e encarou Joseph.
- Não me fez nenhum mal - disse -. Seu irmão só estava me explicando como vou ser usada. Isso é tudo.
Joseph pôde ver a dor que havia nos olhos de Demétria, mas antes que pudesse lhe fazer uma pergunta, ela deu meia volta, agarrou sua bolsa e acrescentou:
- É hora de montar o cavalo.
Tentou andar para Nicholas para retornar ao acampamento. Joseph viu como seu irmão se apressava a se separar do caminho de Demétria.
O irmão mais novo parecia preocupado. - Quer que eu acredite que ela não é culpada - murmurou.
- Demétria lhe disse isso? - perguntou Joseph.
- Não, não o fez - admitiu Nicholas encolhendo os ombros -. Não se defendeu a si mesma em nenhum momento, Joseph, mas se comportou de uma maneira condenadamente inocente. Demônios, não a entendo! Pareceu muito surpresa que nos importemos com nossa irmã. Acredito que isso também foi uma autêntica reação. De fato, chegou a me perguntar se dávamos valor a Miley.
- E como reagiu Demétria quando você lhe respondeu? - perguntou Joseph.
- Pareceu sentir-se ainda mais perplexa. Não a entendo - murmurou Nicholas -. Quanto mais rápido concluirmos este plano, melhor será. Lady Demétria não é o que eu esperava.
- Lady Demétria é uma contradição - admitiu Joseph -. Deus bem sabe que ela não conhece seu próprio valor. - Suspirou ao pensar no que tinha podido observar até o momento, e logo disse -: Venha, o tempo corre. Se nos apressarmos, estaremos em casa antes do anoitecer.
Nicholas respondeu à ordem com um assentimento de cabeça e começou a andar junto de seu irmão.
Enquanto voltava para acampamento, Demétria decidiu que não iria a nenhuma parte. Ficou imóvel no centro da clareira, com sua capa envolvendo seus ombros. Ansel pegou sua bolsa e Demétria não tinha protestado por isso na frente o escudeiro. Dava-lhe igual se a sua bagagem fosse com Joseph. Para falar a verdade, não acreditava que houvesse nada que lhe importasse. Quão único queria era que a deixassem em paz.
Joseph andou até seu escudeiro, para terminar de ajustar os arreios de combate. Indicou com a mão para Demétria que subisse em seu cavalo, e depois continuou andando. Então, ele se deteve de repente e voltou lentamente para olhar Demétria, sem poder acreditar no que parecia ter visto.
Demétria havia voltado a lhe dizer que não. Joseph ficou tão assombrado por aquela exibição de desafio que não reagiu imediatamente. Demétria sacudiu a cabeça uma terceira vez, e depois se virou bruscamente e começou a andar para o bosque.
- Demétria!
O rugido de Joseph a deteve. Demétria se voltou instintivamente para olhá-lo, rezando dentro de sua cabeça para ter a coragem de voltar a desafiá-lo.
- Suba no meu cavalo. Agora.
Olharam-se o um ao outro durante um longo momento repleto de silêncio. Então Demétria percebeu que todos os outros tinham feito uma pausa no que estavam fazendo e ficaram olhando. Joseph não se voltaria atrás diante de seus homens. A maneira com que ele a estava olhando deixou isso muito claro a Demétria.
Demétria recolheu suas saias e se apressou em ficar diretamente diante de Joseph. Os homens podiam estar olhando, mas se ela falava em voz baixa, então não poderiam ouvir o que dizia a quem os comandava.
- Não vou com você, Joseph. E se não fosse tão teimoso, já teria compreendido que Sebastian não virá atrás de mim. Está desperdiçando seu tempo. Deixe-me aqui.
- Para que sobreviva aqui longe de todos? - perguntou Joseph com um sussurro tão suave como tinha sido o dela -. Não duraria nem uma hora.
- Sobrevivi a situações piores, milord - respondeu Demétria, erguendo seus ombros -. Minha decisão já está tomada, barão. Não vou com você.
- Demétria, se um homem se negasse a minha ordem da maneira com que você acaba de fazer, não viveria tempo suficiente para poder alardear sobre isso. Quando dou uma ordem, espero que seja cumprida. Não ouse voltar a me responder com uma negativa, ou um reverso de minha mão fará você pagar por isso, deixando-a atirada no chão.
Era um blefe de bastante mau gosto por parte de Joseph, e ele lamentou que essas palavras tivessem saído de sua boca. Ele estava segurando o braço de Demétria, e soube que inadvertidamente estava lhe fazendo mal e só percebeu quando ela torceu o rosto em uma careta de dor. Joseph a soltou imediatamente, esperando que ela corresse para obedecê-lo.
Demétria não se moveu. Elevou o olhar para ele, com aquela majestosa compostura novamente presente em seu rosto, e disse sem se alterar:
- Estou acostumada com os golpes que me atiram ao chão, assim faça o que quiser. E quando eu voltar a me colocar de pé, pode voltar a me derrubar com um murro se assim for seu desejo.
Suas palavras deixaram Joseph um pouco preocupado. Sabia que Demétria estava dizendo a verdade. Franziu o cenho, enfurecido ao pensar que alguém se atreveu a maltratá-la e sabendo, sem necessidade de que ela o dissesse, que era Sebastian quem tinha aplicado o castigo.
- E por que seu irmão ia...?
- Isso não tem importância - Demétria o interrompeu antes que Joseph pudesse terminar sua pergunta. Agora lamentava por ter dito alguma coisa. Demétria não queria simpatia ou compaixão. Quão único queria era que a deixassem só.
Joseph suspirou.
- Suba no meu cavalo, Demétria.
Aquele novo rompante de coragem, que tinha dado forças a Demétria por uns instantes, a abandonou assim que viu flexionar o músculo junto à bochecha de Joseph. O movimento acentuou a tensão que mantinha seu queixo apertado.
Joseph desafogou a irritação que sentia deixando escapar com um rouco grunhido. Depois fez com que ela virasse até deixá-la com o rosto virado ao lugar no qual seu cavalo estava atado e a empurrou suavemente.
- Deu-me outra razão para matar Sebastian - murmurou.
Demétria começou a se virar para lhe pedir que explicasse sua observação, mas a expressão que havia nos olhos de Joseph indicava que ele havia esgotado sua paciência. Demétria aceitou o fato de que tinha saído perdedora daquela discussão. Joseph estava decidido a levá-la com ele, sem se importar com o que ela dissesse ou fizesse.
Suspirou profundamente cheio de melancolia e depois andou na direção do cavalo de Joseph. A maioria dos soldados ainda não tinha recomeçado suas tarefas. Todos olhavam para Demétria, que tentou parecer serena. Dentro de seu peito, seu coração batia como se fosse arrebentar. Embora o medo de temperamento de Joseph pesasse muito sobre seu ânimo, agora havia uma preocupação ainda maior que a torturava: o cavalo de Joseph. Que a agarrassem e a jogassem na garupa daquele enorme e feio monstro era uma coisa, mas montar sem ajuda era algo muito distinta.
- Que covarde sou - murmurou Demétria para si mesma.
Agora imitava o padre Berton, que tinha o hábito de falar consigo mesmo, e se lembrou de que em uma ocasião seu tio havia lhe dito que não havia ninguém mais interessado no que pudesse dizer, a não ser ele mesmo. Aquela lembrança tão querida para ela fez com que chegasse a sorrir.
- Oh, padre Berton, quão envergonhado o senhor iria se sentir se pudesse me ver agora... Tenho que montar um cavalo saído do inferno, e certamente vou envergonhar a mim mesma.
A ironia de sua preocupação finalmente conseguiu abrir passagem através de seu medo.
- Por que estou tão preocupada em me envergonhar, se o cavalo de Joseph vai me pisotear até me matar? O que importará então se eles pensarem que sou uma covarde? Já estarei morta.
Seu argumento ajudou a aliviar o temor que sentia. Demétria estava começando a se acalmar um pouco, até que percebeu que o cavalo parecia estar lhe observando. Quando o animal começou a arranhar o chão com as patas dianteiras, Demétria chegou à conclusão de que tampouco gostava de nada do que via. Inclusive, chegou a dar coices enquanto a olhava fixamente. Demétria decidiu que aquele cavalo tão estúpido tinha adquirido todas as odiosas características de seu dono.
Armou-se de coragem e foi para o cavalo, detendo-se junto ao seu lado. O animal não gostou muito daquilo e, de fato, tentou separá-la, empurrando-a com seu flanco traseiro. Demétria levantou a mão para agarrar-se à sela, mas então o cavalo soltou um relincho que a fez retroceder com um salto.
Cheia de exasperação, Demétria colocou suas mãos nos quadris.
- É maior que eu, mas certamente não tão inteligente - disse.
Ela ficou satisfeita ao ver o cavalo realmente olhava para ela. Demétria sabia que o cavalo não podia entender o que ela estava dizendo, mas o mero feito de ter conseguido atrair sua atenção, já bastava para fazer com que se sentisse melhor.
Demétria sorriu à besta enquanto ia avançando com tímidos pequenos passos até colocar-se diante do animal.
Uma vez que esteve na frente do animal, puxou as rédeas, obrigando-o a baixar a cabeça. E logo começou a lhe sussurrar, falando em um tom de voz muito baixo e suave enquanto lhe explicava, cuidadosamente, todos seus temores.
- Nunca aprendi a montar e essa é a razão pela qual tenho tanto medo de você - disse-lhe -. É tão forte que poderia me pisotear. Não ouvi seu dono chamar seu nome, mas se você me pertencesse, eu o chamaria Silenus. Esse é o nome de um dos meus deuses favoritos da antiguidade. Silenus era um dos poderosos espíritos da natureza, selvagem e indômito, e por isso se parecia muito com você. Sim, acredito que Silenus é um nome muito apropriado para você.
Quando terminou aquele monólogo, Demétria soltou as rédeas.
- Seu dono me ordenou que suba em sua garupa, Silenus - disse -. Peço-lhe que fique quieto, porque continuo com muito medo.
Joseph já tinha terminado de se preparar. Agora permanecia imóvel do outro extremo da clareira, observando com crescente espanto enquanto Demétria falava com seu cavalo. Não podia ouvir o que ela estava dizendo. Deus, mas ela estava tentando subir na sela de montar do lado errado! Joseph se preparou para gritar uma advertência, certo de que o animal iria empinar, mas as palavras ficaram presas em sua garganta, quando viu que Demétria se sentava no alto do enorme animal. Todo aquilo era errado e certamente estranho, mas Joseph não teve alternativa que suspirar. Agora entendia por que Demétria sempre se agarrava a ele quando cavalgavam juntos. Tinha medo de seu cavalo. Joseph se perguntou se aquele ridículo medo se limitava a seu cavalo ou abrangeria todos os cavalos.
Joseph reparou que o cavalo, sempre nervoso, não tinha movido nem um só músculo para perturbar a torpe subida de Demétria até a sela de montar. E que o pendurassem se ela não havia se inclinado para baixo, dizendo alguma coisa a mais ao animal, depois de ter conseguido se instalar!
- Viu o que eu acabo de ver?
Nicholas tinha formulado a pergunta atrás das costas de Joseph.
Joseph assentiu, mas não se virou. Continuava olhando para Demétria com um sorriso congelado nos cantos de seus lábios.
- Quem você acha que a ensinou a montar? - perguntou Nicholas, sacudindo a cabeça com uma careta de diversão -. Não parece ter nem a mais remota ideia de como se faz.
- Ninguém lhe ensinou - comentou Joseph -. Isso é óbvio, Nicholas. E é curioso, mas meu cavalo não parece se sentir muito aborrecido pela falta de educação de Demétria - acrescentou, sacudindo a cabeça e começou a andar para a dama sobre a qual esteve falando.
O jovem escudeiro, Ansel, aproximou-se de Demétria na direção oposta. Um sorrisinho depreciativo iluminava seu sardento rosto, e começou a exortar Demétria a respeito de sua evidente incapacidade para montar.
- Tem que montar pela esquerda - disse com grande autoridade. Depois agarrou sua mão, como se fosse baixá-la ao chão com um puxão para que pudesse voltar a montar corretamente. O cavalo começou a se agitar no mesmo instante em que Joseph aparecia. A mão de Ansel saiu voando, assim como o resto de seu corpo.
- Não volte a tocá-la nunca mais!
O rugido de Joseph seguiu Ansel enquanto ele caía no chão. Aparentemente ileso depois da queda. O escudeiro se apressou a levantar e assentiu submissamente.
O pobre moço parecia estar tão horrorizado por ter aborrecido seu senhor, que Demétria decidiu intervir em sua defesa.
- Seu escudeiro teve a consideração de me ensinar - declarou -. Queria apenas me ajudar a descer, porque em minha pressa cometi o estúpido erro de montar pelo lado equivocado.
Ansel lançou um rápido olhar de gratidão a Demétria, antes de voltar-se para seu lord, inclinando-se diante dele. Joseph assentiu, aparentemente satisfeito com a explicação.
Quando Demétria compreendeu que Joseph se dispunha a montar em Silenus, fechou os olhos, certa de que não demoraria para ver-se lançada ao chão.
Joseph a viu fechar os olhos antes que Demétria virasse seu rosto para o outro lado. Sacudiu a cabeça, perguntando-se que demônios podia estar acontecendo agora, e depois subiu à sela, colocando Demétria em seu colo, em uma única e rápida ação.
A grossa capa de Joseph envolvia Demétria, que se apoiou em seu antes que pudesse começar a se preocupar com aquele ato.
- Você não é melhor que Sebastian - murmurou para si mesma -. Por acaso pensa que não percebi que nem sequer arrumou tempo para enterrar seus mortos, antes de sair da fortaleza de meu irmão? Sim, eu notei isso. É igualmente implacável. Matou sem mostrar nenhum sinal de remorso.
Joseph teve que recorrer a todo o domínio de si mesmo para não agarrar sua prisioneira e sacudi-la até colocar algum juízo em sua cabeça.
- Demétria, não enterramos nossos mortos, porque nenhum de meus homens morreu - disse-lhe finalmente.
Demétria ficou tão surpresa com aquela resposta que se atreveu a levantar a vista para ele. A parte superior de sua cabeça se chocou com o queixo dele, mas Demétria não procurou se desculpar.
- Havia corpos caídos por todo o chão, Joseph.
- Eram os soldados de Sebastian, Demétria, não meus - respondeu Joseph.
- Espera que eu acredite que seus soldados são superiores aos deles...?
- Espero que deixe de testar meu temperamento, Demétria - respondeu Joseph.
Ela soube que Joseph falava muito sério quando cobriu bruscamente sua cabeça com a capa.
Demétria chegou à conclusão de que Joseph era um homem horrível, e de que obviamente não tinha coração. Sim, porque se tivesse sido dotado de emoções humanas, então nunca teria sido capaz de matar um semelhante com facilidade.
O certo era que Demétria não podia imaginar a si mesma tirando a vida de outra pessoa. Ter levado uma existência tão reclusa apenas com o padre Berton e seus dois companheiros não a preparou para enfrentar alguém como Sebastian ou Joseph.
Demétria tinha aprendido que a humildade era uma meta imensamente valiosa. Sim, obrigava-se a adotar a mansidão diante de seu irmão, enquanto fervia de ira por dentro. Rezava para que ela não tivesse uma alma tão escura como a de Sebastian. Eles tinham compartilhado o mesmo pai. Demétria queria acreditar que ela havia herdado a bondade do lado materno da família, e nenhuma das vis peculiaridades de seu pai. Será que ela se enganava com tal esperança?
Não demorou a ficar muito esgotada para que pudesse continuar se preocupando com isso. A jornada daquele dia estava demonstrando ser a mais difícil de suportar, e os nervos de Demétria se viram submetidos a uma dura prova. Ouviu a observação de um dos soldados ao dizer que já estavam quase em casa, e possivelmente por acreditar que o final se aproximava, cada nova hora parecia muito mais longa que as anteriores.
O terreno, escarpado e montanhoso, obrigava-os a ir mais devagar. Joseph não podia manter seu habitual frenético ritmo de marcha. Foram vários os momentos nos quais Demétria teve certeza de que o cavalo ia tropeçar em alguma coisa, e passou a maior parte daquele longo e torturante dia com os olhos fechados, e os braços de Joseph ao redor dela. A preocupação terminou por levá-la ao esgotamento, convencida como estava de que não demorariam a ser precipitados em uma daquelas fendas profundas, que Silenus parecia tão apaixonado em chegar o mais perto possível.
Um dos soldados gritou a novidade quando por fim chegaram às terras de Wexton. Um coro de vivas ressoou pelas colinas. Demétria suspirou com alívio. Recostou-se no peito de Joseph e sentiu como a tensão ia-se dissipando rapidamente de seus ombros. Estava muito cansada para poder se preocupar com o que lhe aconteceria quando entrasse no lar de Joseph. O mero fato de descer de Silenus já era uma bênção suficiente, por agora.
O dia tinha estava se tornando cada vez mais frio. Demétria foi ficando impaciente, progressivamente, à medida que os minutos necessários para chegar às terras de Wexton se convertiam em longas horas, e continuava sem poder avistar a fortaleza de Joseph.
As últimas luzes do dia já estavam se desvanecendo, quando Joseph ordenou fazerem uma parada. Foi Nicholas quem o convenceu a parar. A áspera troca de palavras, que ocorreu entre os dois irmãos, indicou a Demétria que aquela parada não era do agrado de Joseph. Também notou que Nicholas não parecia se sentir nada ofendido pelas duras observações de seu irmão mais velho.
- Por acaso é mais fraco que nossa prisioneira? - perguntou Joseph a Nicholas quando este insistiu para que descansassem durante uns minutos.
- Já não sinto minhas pernas - replicou Nicholas com um encolher de ombros.
- Lady Demétria não se queixou - comentou Joseph depois de ter elevado a mão para indicar a seus homens que se detivessem.
- Sua prisioneira está muito assustada para dizer alguma coisa - zombou Nicholas -. Esconde-se debaixo de sua capa e chora junto a seu peito.
- Não acredito - respondeu Joseph, separando um pouco a capa para que Nicholas pudesse ver o rosto de Demétria -. Vê alguma lágrima, Nicholas? - perguntou-lhe depois em tom cheio de diversão.
Nicholas sacudiu a cabeça. Joseph estava tentando fazer com que se sentisse inferior àquela bonita mulher que estreitava em seus braços. O ardil não tinha lhe afetado nem um pouco, e chegou a sorrir suavemente. O desejo de estirar as pernas e beber um pouco de cerveja era sua única preocupação naquele momento, junto com o fato de que sua bexiga estava a ponto de arrebentar.
- Pode ser que sua prisioneira seja muito tola para conhecer o medo - observou com um sorriso.
A observação não agradou Joseph, em nada. Despediu-se de Nicholas com o terrível cenho franzido, suficiente para fazer que seu irmão saísse correndo, e logo desmontou lentamente.
Joseph seguiu Nicholas com o olhar até que este desapareceu dentro do bosque, e logo se voltou para Demétria. Demétria estendeu os braços para ele em busca de ajuda, colocando as mãos sobre a curva de seus largos ombros. Até tratou de sorrir.
Joseph não lhe devolveu o sorriso. Não obstante, demorou um tempo imensamente longo para baixá-la ao chão. Suas mãos envolveram a cintura de Demétria quando a atraiu para ele, mas assim que os olhos dela estiveram à altura dos dele, e só com um pequeno espaço por separá-los, ele parou.
Demétria estirou as pernas com um gemido de dor que não conseguiu conter. Cada músculo de seu traseiro gritava em uma muda agonia.
Joseph teve a audácia de sorrir ante seu desconforto.
Demétria decidiu que Joseph sempre conseguia tirar o que de pior havia nela. De que outra maneira podia explicar aquele repentino e irresistível impulso de gritar com ele. Sim, Joseph cutucava o lado escuro do caráter de Demétria até conseguir deixá-lo em primeiro plano. Mas se ela nunca, nunca gritava a ninguém! Demétria era uma mulher doce e carinhosa, que foi abençoada com um temperamento sensato e aprazível. O padre Berton havia dito isso em muitas ocasiões.
E agora aquele guerreiro tentava arrebatar sua bondade natural zombando dela.
Bom, então Demétria não permitiria que isso acontecesse. Agora, Joseph não conseguiria fazer com que ela perdesse a paciência, não importava o quanto ele sorrisse de suas dores e aflições.
Olhou nos olhos dele, decidida a se manter firme, ainda que fosse só desta vez.. Ele a olhava fixamente, como se pensasse que dessa maneira poderia encontrar a resposta a algum enigma que o intrigava.
O olhar de Joseph foi baixando lentamente até que se viu contemplando a boca de Demétria, e Demétria se perguntou o que ele estaria olhando, quando percebeu que estava olhando para a boca de Joseph.
Ruborizou-se, embora sem saber o porquê.
- Nicholas está muito enganado - disse -. Não sou nenhuma tola.
O sorriso de Joseph, maldita fosse sua negra alma, tornou-se um pouco maior.
- Já pode me soltar - disse Demétria, lançando-lhe o que esperava ser um olhar altivo.
- Se o fizer você cairá de bruços - anunciou Joseph.
- E isso iria deixá-lo satisfeito? - perguntou ela, fazendo todo o possível para que sua voz empregasse o mesmo suave sussurro que ele tinha utilizado, quando fez aquele comentário tão humilhante.
Joseph encolheu os ombros e a soltou subitamente, Oh, realmente não restava dúvida de que o barão de Wexton era um homem terrível! Joseph sabia com toda certeza o que ia acontecer. Demétria teria caído sobre seu traseiro se não se agarrasse ao braço dele, porque, agora, suas pernas não pareciam ser capazes de se lembrar do que consistia sua obrigação.
- Não estou acostumada a cavalgar durante tantas horas seguidas - apressou-se em dizer.
Joseph não acreditava que ela estivesse acostumada a montar nem um só instante. Deus, ela o deixava cada vez mais confuso! Não havia dúvida de que lady Demétria era a mulher mais desconcertante com que jamais encontrou. Quando andava era graciosa, mas também podia ser incrivelmente torpe. Foram tantas as ocasiões em que sua cabeça se chocou com o queixo de Joseph que ele acreditava que a cabeça de Demétria estivesse cheia de galos.
Demétria não tinha nem a mais remota ideia de quais seriam os pensamentos que passavam pela cabeça de Joseph. Mas ele estava sorrindo, e isso era algo com que tinha que se preocupar. Finalmente pôde se soltar dele. Deu-lhe as costas, e entrou lentamente no bosque para buscar um pouco de intimidade. Sabia que andava como uma anciã, e rezou para que Joseph não estivesse olhando para ela.
Quando voltou da densa floresta, Demétria andou em grande círculo ao redor dos homens, resolvida a expulsar os dores e cãibras de suas pernas antes que se visse obrigada a subir em Silenus, novamente. Deteve-se quando chegou ao extremo mais afastado daquela área triangular, e baixou o olhar para o vale de que acabavam de subir.
Joseph não parecia ter nenhuma pressa em recomeçar a jornada. Aquilo não tinha nenhum sentido para Demétria, já que se lembrava de quão irritado ele tinha ficado quando Nicholas pediu que fizessem uma parada. Agora se comportava como se dispusesse de todo o tempo do mundo. Demétria sacudiu sua cabeça. Joseph de Wexton era o homem mais desconcertante que jamais conheceu.
Decidiu sentir-se agradecida por aquela pausa. Precisava de uns minutos a mais a sós para fazer com que sua mente se esquecesse de todas suas preocupações, alguns preciosos minutos da mais pacífica solidão nos quais poderia recuperar o controle de suas emoções.
O dia quase tinha chegado ao fim, já que agora o sol começava a ficar no horizonte. Magníficas franjas de uma intensa cor laranja e uma tênue cor avermelhada atravessavam o céu, arqueando-se para baixo e dando a impressão de que chegavam a tocar o chão em algum lugar longínquo. Cada estação trazia consigo seus próprios e especiais tesouros, e a nudez do inverno que já estava muito próximo encerrava uma imensa beleza. Demétria estava tentando ignorar o barulho que havia atrás dela, concentrando-se em todo o esplendor que tinha lá embaixo, quando sua atenção foi subitamente atraída por uma faísca de luz que apareceu entre as árvores.
A piscada de luz desapareceu um instante depois. Cheia de curiosidade, Demétria continuou andando para a direita até que recapturou a luz. Era muito estranho, mas agora a luz parecia estar vindo de outra direção um pouco mais afastada, abaixo do vale.
Então as luzes se multiplicaram subitamente, até que pareceu como se cem velas tivessem sido acesas no mesmo instante: as luzes tremiam e piscavam.
A distância era grande, mas o sol agia como um espelho e ia aproximando cada vez mais aquelas faíscas. Como fogo, pensou Demétria... ou metal.
Então entendeu. Só homens que usassem armadura poderiam explicar a presença de semelhantes reflexos.
E havia centenas deles.




eu sei que sao capitulos longos, mas cansa ficar cortando o capitulo pela metade.....



Up and down (ogami ajjilhage)
You and me (dalkomhi dagawaseo)
What you want? Nal milgo danggiji
I’ll bring you back in
Up and down (jakkuman hetgallige)
You and me (daheul deut dahji anha)
What you want? Nareul maemdoneun aemaehan you and me

Para cima e para baixo (Os cinco sentidos me deixam tonta)
Você e eu (Nos aproximando docemente )
O que você quer? Você continua me empurrando
Eu vou te trazer de volta
Para cima e para baixo (Você continua me confundindo)
Você e eu (como se estivéssemos nos tocando, mas não!)
O que você quer? Você continua me circulando, você e eu
 hehehehe