sábado, 16 de junho de 2018

O Diário Secreto da Senhorita Demetria Cheever Capitulo 9


Demetria passou a seguinte semana fingindo ler tragédias Gregas. Era impossível manter a mente concentrada em um livro o suficiente para ler um de verdade, mas posto que tivesse que olhar as letras na página de vez em quando, e pensou que bem poderia escolher algo de acordo com seu humor.
Uma comédia a teria feito chorar. Uma história de amor, que Deus a perdoasse, a teria feito desejar morrer imediatamente.
Selena, a quem nunca foi conhecida por sua falta de interesse nos assuntos de outras pessoas, foi incessante na busca da razão que havia atrás do mau humor de Demetria. De fato, as únicas vezes em que não interrogava Demetria, era quando tentava alegrála. Selena estava na metade de uma dessas sessões de ânimo, entretendo Demetria com histórias sobre certa condessa que tinha jogado a seu marido de casa até que este aceitou deixála comprar quatro pequenos poodles como mascotes, quando Lady Rudland chamou brandamente à porta.
—OH, bem — disse, colocando à cabeça pela porta. — Estão as duas aqui.
Selena, não se sente dessa forma. Não é próprio de uma dama.
Selena ajustou submissamente sua postura antes de perguntar.
—O que ocorre, mamãe?
—Queria informálas de que fomos convidados à casa da Lady Chester para uma visita campestre na próxima semana.
—Quem é Lady Chester? —inquiriu Demetria, deixando seu novo manuseado volume de Tosquio sobre o colo.
—Nossa prima — respondeu Selena. — Terceiro ou quarto grau, não posso recordar.
—Segundo – corrigiu lady Rudland. — E aceitei o convite em nome de todos.
Seria de má educação não aceitar, já que é um familiar tão próximo.
—Adam vai? —perguntou Selena.
Demetria quis agradecer mil vezes a amiga por ter perguntado o que ela não se atrevia a expressar.
—É melhor que vá. Conseguiu escapar das obrigações familiares durante muito tempo — disse Lady Rudland com incomum dureza. — Se não o fizer, terá que responder ante mim.
—Céus — disse Selena impassível. — Que ideia tão terrível.
—Não sei o que acontece com esse menino — disse Lady Rudland com um movimento de cabeça. — É quase como se estivesse nos evitando.
Não, pensou Demetria com um sorriso triste, só a mim.
Adam dava tapinhas impaciente com o pé enquanto esperava que sua família descesse. Pela décima quinta vez essa manhã, encontrouse desejando parecer mais ao resto dos homens da alta sociedade, muitos dos quais ignoravam as mães ou as tratavam como fragmentos de penugens. Mas de alguma forma, sua mãe conseguiu que aceitasse ir aquela condenada festa de fim de semana no campo, a qual é obvio Demetria também iria.
Era um idiota. Esse dia estava conseguindo que o fato se voltasse cada vez mais claro.
Um idiota que aparentemente tinha ofendido o destino, porque logo que sua mãe chegou ao vestíbulo, disse:
—Terá que ir com Demetria.
Aparentemente os deuses tinham um mórbido senso de humor.
Clareou a garganta.
—Acha que é boa ideia, mãe?
Ela lhe dirigiu um olhar de impaciência.
—Não vai seduzir à garota, não é?
Maldita fosse!
—Claro que não. É só que terá que ter em conta sua reputação. O que dirão as pessoas quando nos vir chegar à mesma carruagem? Todo mundo saberá que passamos várias horas a sós.
—Todo mundo pensa em vocês como se fossem irmão e irmã. Encontrarnosemos a uma milha de Chester Park e trocaremos, e assim chegará com seu pai. Não haverá nenhum problema. Além disso, seu pai e eu precisamos falar a sós com Selena.
—O que fez agora?
—Aparentemente chamou Georgiana Elster de tola.
—Georgiana Elster é uma tola.
—Na cara, Adam! Disse na cara.
—Desajuizado da parte dela, mas nada que requeira uma repreensão de duas horas, em minha opinião.
—Isso não é tudo.
Adam suspirou. Sua mãe estava decidida. Duas horas a sós com Demetria. O que tinha feito para merecer aquela tortura?
—Chamou sir Robert Kent “arminho muito grande".
—Na cara, suponho.
Lady Rudland assentiu.
—O que é um arminho?
—Não tenho a menor ideia, mas suponho que não seja um elogio.
—Um arminho é uma doninha, acredito — disse Demetria enquanto entrava no vestíbulo com um vestido de viagem azul nata.
Sorriu aos dois, irritantemente composta.
—Bom dia, Demetria — disse Lady Rudland energicamente. — Vai com Adam.
—Sério? —Quase se afogou com suas próprias palavras e teve que encobrir com um pouco de tosse. Adam achou uma juvenil satisfação nisso.
—Sim. Lorde Rudland e eu precisamos falar com Selena. Esteve dizendo algumas coisas bastante inapropriadas em público.
Escutouse um gemido das escadas. Três cabeças giraram ao redor para olhar
Selena enquanto descia.
—É realmente necessário, mamãe? Não pretendia fazer mal. Nunca teria chamado de bruxa miserável lady Finchcoombre se soubesse que ia se vingar.
O sangue abandonou o rosto de Lady Rudland.
—Chamou lady Finchcoombre de miserável?
—Não sabia? — Perguntou fracamente Selena.
—Adam, Demetria, sugiro que vão já. Nos veremos em algumas horas.
Afastaramse em silencio até a carruagem que os esperava, e Adam sustentou a mão no alto para ajudar Demetria enquanto subia. Os dedos enluvados dela pareciam elétricos sobre os dele, mas ela não devia ter sentido o mesmo, posto que soasse singularmente imutável quando murmurou:
—Espero que minha presença não seja uma prova muito dura para você, milord.
A resposta de Adam foi uma mescla entre grunhido e suspiro.
—Eu não planejei, sabe?
Sentou de frente a ela.
—Sei.
—Não tinha nem ideia de que... —Ela levantou a vista. — Sabe?
—Sei. Minha mãe estava bastante resolvida a falar a sós com Selena.
—OH. Obrigada por acreditar, então.
Ele deixou sair o ar contido, olhando pela janela durante um momento enquanto a carruagem ficava em movimento.
—Demetria eu não acredito que seja algum tipo de mentirosa e incorrigível.
—Não, claro que não — disse ela com rapidez. — Mas parecia bastante furioso quando me ajudou a subir à carruagem.
—Estava furioso com o destino, Demetria, não contigo.
—Que bom — disse ela friamente. — Bom, se me desculpar, trouxe um livro. — retorceuse de forma que a maior parte possível de suas costas estivesse de rosto a ele e começou a ler.
Adam esperou ao redor de trinta segundos antes de perguntar.
—O que é isso que está lendo?
Demetria ficou gelada, logo se moveu lentamente, como se estivesse completando a mais odiosa das tarefas. Levantou o livro.
— Ésquilo.
—Que deprimente.
—Igual ao meu humor.
—OH querida, isso foi um dardo envenenado?
—Não seja condescendente, Adam. Nestas circunstâncias, é pouco apropriado.
Ele elevou as sobrancelhas.
—E o que significa isso exatamente?
—Significa que depois de tudo o que... Ehh... Ocorreu entre nós, sua atitude de superioridade já não é justificada.
—Caramba! Essa sim que foi uma frase longa.
Demetria deixou que seu olhar respondesse por ela. Aquela vez, quando voltou a segurar o livro, cobriu inteiramente o rosto.
Adam riu entre dentes e inclinou para trás, surpreso pelo muito que estava se divertindo. As mais caladas eram sempre as mais interessantes. Demetria talvez nunca escolhesse por si mesma colocarse no centro das atenções, mas podia defenderse em uma conversa com inteligência e estilo. Fazêla fisgar o anzol era altamente divertido. E não se sentia culpado nem um pouco por isso. Apesar de sua malhumorada forma de agir, Adam não tinha dúvidas de que ela desfrutava de cada farpa de seus enfrentamentos verbais tanto quanto ele.
Talvez aquela viagem não fosse tão terrível. Só tinha que assegurarse de mantêla ocupada naquele tipo de divertida conversa e não olhar os lábios dela muito tempo.
Gostava muito daqueles lábios.
Mas não ia pensar nisso. Reataria o batepapo e tentar desfrutar igual fazia antes que de se envolverem em toda aquela confusão. Sentia bastantes saudades da velha amizade com Demetria, e supôs que já que ficariam presos juntos naquela carruagem durante duas horas, então veria o que poderia fazer para ajeitar as coisas.
—O que está lendo? —perguntou.
Ela levantou a vista, irritada.
—Ésquilo. Não me perguntou isso já?
—Queria dizer, que livro de Ésquilo — improvisou ele.
Para sua diversão, ela teve que baixar a vista ao livro antes de responder:
—As Euménides. — Ele piscou. —Você não gosta?
—Todas essas mulheres furiosas? Não acredito. Dême uma boa história de aventuras um dia qualquer.
—Eu gosto de mulheres furiosas.
—Sente uma forte empatia? OH, querida, não, não aperte os dentes, Demetria, você não gostaria de ter que ir ao dentista, juro isso.
A expressão dela foi tal, que ele não pôde fazer mais que rir.
—OH, não seja tão sensível, Demetria.
Ainda fulminandoo com o olhar, ela murmurou:
—Sinto muito, milord.
E logo conseguiu de algum jeito fazer uma reverencia total ali no meio da carruagem.
A risada de Adam explodiu em divertidas gargalhadas.
—OH, Demetria — disse, enxugando os olhos. — É uma joia.
Quando se recuperou por fim, ela estava olhandoo como se ele estivesse louco. A ele ocorreu durante um segundo levantar as mãos como se fossem garras e soltar algum tipo de som animal estranho, só para confirmar suas hipóteses. Mas ao final, simplesmente se recostou para trás e sorriu de orelha a orelha.
Ela sacudiu a cabeça.
—Não o entendo.
Ele não respondeu, sem desejar que a conversa voltasse para águas mais sérias.
Ela voltou a elevar seu livro, e aquela vez, ele se dedicou há cronometrar quantos minutos passava antes que virasse a página. Quando o resultado foi de cinquenta segundos, desenhou um sorriso.
—Uma leitura difícil?
Demetria baixou lentamente o livro e lançou um olhar mortal em sua direção.
—Perdão?
—Muitas palavras grandes?
Ela simplesmente o olhou.
—Não mudou de página desde que começou.
Ela deixou escapar um forte grunhido e com grande determinação, passou a página.
—É em inglês ou em grego?
—Perdão?
—Se estiver em grego, isso explicaria sua velocidade.
Os lábios dela se abriram.
—Ou a falta dela — disse ele com um encolhimento de ombros.
—Sei ler grego — disse ela entre dentes apertados.
—Sim e é um lucro elogiável.
Ela baixou a vista a suas mãos. Estavam apertando o livro com tanta força, que os nódulos estavam ficando brancos.
—Obrigada — disse forçada.
Mas ele não tinha acabado.
—Pouco comum para uma mulher, não acha?
Aquela vez, ela decidiu ignorálo.
—Selena não pode ler em grego — disse ele conversador.
—Selena não tem um pai que não faz outra coisa que não seja ler em grego —
Demetria respondeu sem levantar a vista. Tentou concentrarse nas palavras da parte superior da nova página, mas não tinham muito sentido, posto que não tivesse terminado de ler à anterior. Nem sequer havia começado.
Deu tapinhas com um dedo enluvado contra o livro enquanto fingia ler. Não acreditava que houvesse maneira alguma de voltar para a página anterior sem que ele notasse. Tampouco importava muito, pois duvidava que conseguisse ler nada mais enquanto ele estivesse olhando com aquele olhar de cílios espessos para ela. Era mortal, decidiu. A fazia arder e estremecer ao mesmo tempo, ela estava completamente irritada com o homem.
Estava totalmente segura de que ele não tinha interesse em seduzila, mas apesar de tudo, estava fazendo um bom trabalho.
—Um talento peculiar, esse.
Demetria aspirou aos lábios e levantou a vista para ele.
—Sim?
—Ler sem mover os olhos.
Ela contou até três antes de responder.
—Alguns de nós não temos a necessidade de articular as palavras quando leem
Adam.
—Touché, Demetria. Sabia que ainda ficava alguma faísca.
Cravou as unhas com força no assento acolchoado. Um, dois, três. Segue contando. Quatro, cinco, seis. A aquele passo, teria que chegar até cinquenta se quisesse controlar seu caráter.
Adam a observou mover a cabeça ligeiramente ao som de algum ritmo desconhecido e sentiu curiosidade.
—O que faz?
Dezoito, dezenove...
—O que?
—O que faz?
Vinte.
—Está ficando extremamente incomodo Adam.
—Sou persistente. —Sorriu zombador. — Acreditei que você, de todas as pessoas, apreciaria esse traço. E agora, o que estava fazendo? Estava meneando a cabeça de uma forma da mais curiosa.
—Se quer saber — disse cortante — estava contando interiormente para assim poder controlar meu temperamento.
Ele a olhou durante um momento, então disse:
—Sinto calafrios somente em pensar o que poderia ter me dito se tivesse deixado de contar antes.
—Estou perdendo a paciência.
—Não! —disse ele com fingida incredulidade.
Agarrou o livro uma vez mais, tentando ignorálo.
—Deixa de torturar esse pobre livro, Demetria. Nos dois sabemos que não está lendo.
—Vai me deixar em paz? – Ela explodiu por fim.
—Até que número chegou?
—O que?
—Que número? Disse que estava contando para assim não ofender minha tenra sensibilidade.
—Não sei. Vinte. Trinta. Não sei. Deixei de contar faz mais ou menos uns quatro insultos.
—Chegou até trinta? Mentiu Demetria. Não acredito que tenha perdido sua paciência comigo absolutamente.
—Sim, perdi — disse ela com os dentes apertados.
—Não acredito.
—Aaaargh! — atirou o livro nele. Bateu em um lado da cabeça.
—Ai!
—Não seja menino.
—Não seja tirana.
—Deixa de me provocar!
—Não estava te provocando.
—OH, por favor, Adam.
—OH, de acordo — disse petulante, esfregando o lado da cabeça. — Estava te provocando. Mas não teria feito se não tivesse me ignorado.
—Me perdoe, mas achei que queria que te ignorasse.
—De onde diabo tirou essa ideia?
A boca de Demetria se abriu de repente.
—Está louco? Me evitou como a uma praga durante ao menos os últimos quinze dias. Até evitou sua mãe para me evitar.
—Bom, não é verdade.
—Diga a sua mãe.
Ele piscou.
—Demetria, eu queria que fôssemos amigos.
Ela sacudiu a cabeça. Havia palavras mais cruéis na língua inglesa?
—Não é possível.
—Por que não?
—Não pode ter ambas as coisas. —Continuou Demetria, usando cada gota de energia para evitar que sua voz tremesse. — Não pode me beijar e logo me dizer que quer que sejamos amigos. Não pode me humilhar como fez nos Worthington, e logo declarar que gosta de mim.
—Temos que esquecer o que aconteceu — disse ele brandamente. — Devemos deixar para trás, se não pelo bem de nossa amizade, então pelo de nossa família.
—Você pode fazer isso? — Exigiu Demetria. — De verdade pode esquecer? Porque eu não.
—É obvio que posso — disse, um pouco facilmente.
—Careço de sua sofisticação, Adam — disse, e logo acrescentou gelidamente.
Ou talvez, não sou tão superficial como você.
—Eu não sou superficial, Demetria. —Devolveu com rapidez. — Sou sensato.
Deus sabe que um de nós tem que ser.
Demetria desejou ter algo que dizer. Desejou ter alguma mordaz resposta que o humilhasse, que o deixasse sem palavras, deixandoo como um montão sujo e gelatinoso de patética podridão.
Mas em lugar disso só tinha a si mesmo e as horríveis e furiosas lágrimas que lhe ardiam atrás dos olhos. E nem sequer estava segura de poder fulminálo adequadamente com o olhar, assim olhou a outro lado, contando os edifícios enquanto passavam pela janela e desejando estar em qualquer outro lugar.
E com qualquer outra pessoa.
E aquilo era o pior, porque em toda sua vida, inclusive com uma melhor amiga que era mais bonita, mais rica, e tinha melhores conexões que ela, Demetria nunca desejou estar com ninguém mais do que com quem estava.
Em toda sua vida, Adam fez coisas das quais não estava orgulhoso. Tinha bebido muito e vomitado sobre um tapete valioso. Apostado dinheiro que não possuía.
E inclusive uma vez montou seu cavalo com muita dureza e pouco cuidado e deixou o animal manco durante uma semana.
Mas nunca havia se sentido tão baixo como enquanto olhava o perfil de Demetria, dirigido de forma tão decidida para a janela.
Tão decididamente longe dele.
Não falou durante um longo momento. Deixaram Londres para trás, atravessando os subúrbios onde os edifícios se tornavam mais escassos e longínquos entre si, e finalmente alcançaram o ondulado campo aberto.
Ela não o olhou nem uma vez. Sabia. Tinha estado olhandoa.
E por isso, por fim, posto que não pudesse tolerar outra hora mais de silêncio, nem podia chegar a expor o que era exatamente o que significava aquele silêncio, falou.
—Não pretendia te insultar, Demetria — disse em voz suave, — Mas sei quando algo é uma má ideia. E ter uma confusão amorosa contigo é uma ideia extremamente má.
Ela não se virou, mas a ouviu dizer:
—Por quê?
Olhoua, incrédulo.
—No que está pensando, Demetria? Não importa nada sua reputação? Se correrem rumores sobre nós, estará arruinada.
—Ou teria que se casar comigo — disse com voz baixa e maliciosa.
—O que não tenho intenção de fazer. Sabe. —Jurou em voz baixa. Deus santo, aquilo estava saindo tudo errado. — Não quero me casar com ninguém. —Explicou. — E isso também sabe.
—O que eu sei — a devolveu com rapidez, os olhos com brilhos de evidente fúria — é que... — e então parou, fechando com força a boca e cruzando os braços.
—O que? —exigiu ele.
Ela voltou a virar para a janela.
—Não o entenderia. —E logo adicionou. — Nem me escutaria.
Seu tom depreciativo foi como se tivesse unhas lhe arranhando sob a pele.
—OH, por favor. A petulância não combina com você.
Ela se virou com rapidez.
—E como deveria agir? Digame, como se supõe que tenho que me sentir?
Os lábios dele se curvaram.
—Agradecida?
Agradecida?
Ele se sentou para trás, seu corpo inteiro era uma prova viva de insolência.
—Poderia ter te seduzido, sabe? Com facilidade. Mas não o fiz.
Ela ofegou e se tornou para trás, e quando falou, sua voz foi baixa e letal.
—É odioso, Adam.
—Só estou te dizendo à verdade. E sabe por que não fiz mais? Por que não retirei a camisola de seu corpo, a deitei, e tomei ali mesmo naquele sofá?
Ela arregalou os olhos, e sua respiração ficou audível e ele soube que estava sendo cru, grosseiro, e sim, odioso, mas não podia deterse, não podia deter sua franqueza, porque, maldita fosse, ela tinha que entender. Tinha que compreender quem era ele na realidade, e do que era e não era capaz de fazer.
E aquilo... Aquilo. Por ela. Conseguiu fazer o honrável por ela, e não estava sequer agradecida?
—Direi isso — virtualmente vaiou. — Contiveme pelo respeito que tenho a você. E te direi mais... — detevese, perjurou e ela o olhou interrogante, atrevida, provocadora, como dizendo: nem sequer sabe o que quer dizer.
Mas esse era o problema. Sabia, e esteve a ponto de dizer o muito que a tinha desejado. Que se estivesse em qualquer outro lugar que não fosse a casa de seus pais, não estava seguro de ter se detido.
Não estava seguro se poderia ter parado.
Mas ela não precisava saber aquilo. Não saberia. Não necessitava aquele poder sobre ele.
—Pode acreditar — murmurou, mais para si mesmo que para ela. — Não queria arruinar seu futuro. —Meu futuro é da minha conta — respondeu zangada. — Sei o que faço.
Soprou desdenhoso.
—Tem vinte anos. Acha que sabe tudo.
Ela o olhou zangado.
—Quando eu tinha vinte, acreditava que sabia tudo — disse ele dando um encolher de ombros.
Os olhos dela se entristeceram.
—Eu também — disse brandamente.
Adam tentou ignorar o desagradável nó de culpa que se retorcia em seu estômago. Nem sequer estava seguro de por que se sentia culpado, e de fato, todo aquilo era ridículo. Não deveria sentirse culpado por não tomar a inocência dela e tudo o que conseguiu pensar em dizer foi:
—Algum dia me agradecerá por isso.
Ela olhou incrédula.
—Soa igual a sua mãe.
—Está ficando áspera.
—Pode me culpar? Está me tratando como uma menina, quando sabe muito bem que sou uma mulher.
O nó de culpabilidade fez que crescessem os tentáculos.
—Posso tomar minhas próprias decisões — disse desafiante.
—É óbvio que não. — inclinouse para frente, um perigoso brilho em seus olhos. — Ou não teria me deixado descer o vestido na semana passada e beijar seus seios.
Ela ruborizou com o carmesim profundo da vergonha, e sua voz tremeu com acusação quando disse:
—Não tente dizer que é minha culpa.
Ele fechou os olhos e passou ambas as mãos pelo cabelo, consciente de que acabava de dizer algo muito, muito estúpido.
—É obvio que não é sua culpa, Demetria. Por favor, esquece que disse isso.
—E quer que esqueça que me beijou também. —Sua voz estava desprovida de toda emoção.
—Sim. — Olhoua e viu uma espécie de falta de vida em seus olhos, algo que nunca tinha visto antes em seu rosto. — OH, Deus, Demetria, não faça isso.
—Não faça isto, faz aquilo. — Gritou. — Esquece isto, não esqueça aquilo. Seja claro, Adam. Não sei o que quer. E acredito que você tampouco.
—Sou mais velho que você nove anos — disse com voz imponente. — Não me menospreze.
—Sinto muito, sua alteza.
—Não faça isso, Demetria.
E o rosto dela, que tinha estado tão reservado e gélido, de repente estalou com emoção.
—Deixa de me dizer o que tenho que fazer! Alguma vez te ocorreu que eu queria que me beijasse? Que queria que me desejasse? E me deseja, sabe. Não sou tão tola para que possa me convencer do contrário.
Adam só pôde olhála fixamente, sussurrando:
—Não sabe o que diz.
—Claro que sim! — Os olhos cintilavam e as mãos curvaram tremulas e em punhos, e ele teve uma terrível, horrível premonição de que aquele era o momento.
Tudo dependia daquele momento, e soube, sem nem sequer pensar no que ela diria, e no que responderia que não terminaria bem.
—Sei exatamente o que estou dizendo — disse ela. — Desejo você.
O corpo dele se esticou e o coração apertou no peito. Mas não podia permitir que aquilo continuasse.
—Demetria, só acha que me deseja — disse com rapidez. — Nunca beijou ninguém antes e...
—Não me trate com condescendência. —Seus olhos o olharam diretamente, e estavam ardendo de desejo. — Sei o que quero e desejo você.
Ele aspirou de forma irregular. Merecia ser santificado pelo que estava a ponto de dizer.
—Não. Não me deseja. É uma teimosia.
—Maldito seja! — Explodiu. — Está cego? Está surdo, tolo e cego? Não é teimosia, idiota! Amo você!
OH, Meu Deus.
—Sempre te amei! Desde que nos vimos a primeira vez há nove anos. Amei todo este tempo, a cada minuto.
—OH, Meu Deus.
—E não me tente dizer que é um amor infantil porque não é. Pode ser que foi em algum momento, mas já não.
Adam não disse nada. Só ficou ali sentado como um imbecil e a olhou.
—Eu só... Conheço meu coração e te amo, Adam. E se tiver o menor pingo de decência, dirá algo, porque disse tudo o que talvez pudesse dizer e não posso suportar o silêncio e... OH, Por amor de Deus! Vai pelo menos piscar?
Ele nem sequer foi capaz de fazer aquilo.