O melhor sempre é
aquele que treina na
mais severa das
disciplinas.
Rei Arquídamo da
Esparta
Demétria
não queria que ninguém a surpreendesse chorando. Quando deixou Miley, realmente
não tinha nenhum destino certo em mente. Apenas queria encontrar um lugar
tranquilo onde colocar um pouco de ordem em suas emoções.
Sua
primeira escolha foi a sala, mas quando se aproximava da entrada ouviu que
Nicholas estava falando com alguém. Continuou andando, desceu o seguinte lance
de degraus, agarrou sua capa de inverno do cabide que havia junto ao recinto
dos soldados, e lutou com as pesadas portas até que conseguiu abri-las o
suficiente para poder deslizar entre elas.
O
ar estava bastante frio e poderia fazer um urso tremer. Demétria envolveu seus
ombros com a capa e apertou o passo. A lua dava luz suficiente para que pudesse
ver por onde ia e assim que rodeou a choça do açougueiro, apoiou-se no muro de
pedra da fortaleza e começou a chorar como uma criança. Ela chorava alto,
indisciplinada, e infeliz também, porque depois de ter feito tudo isso,
continuava a se sentir tão mal quanto antes. Sua cabeça doía e suas bochechas
ardiam, e estava consumida pelo soluço.
A
raiva não ia embora.
Uma
vez que Miley começou sua história, ela contou até a última consequência dela.
Demétria não tinha mostrado nenhuma reação visível sobre aquele horror, mas
sentia que seu coração estava a ponto de arrebentar de dor. Morcar! O bastardo
era tão culpado do ocorrido como Sebastian, e no entanto, ninguém jamais chegaria
a saber que ele tinha participado daquilo.
-
O que você está fazendo aqui fora?
Demétria
deixou escapar uma exclamação abafada. Joseph tinha-lhe dado um susto de morte,
saindo de um nada para plantar-se junto dela.
Demétria
tratou de dar-lhe as costas, mas Joseph não permitiu. Ele a pegou pelo queixo e
a obrigou a levantar o olhar para ele.
Teria
que estar cego para não perceber que ela estava chorando. Demétria pensou em
dar uma breve desculpa, mas então começou a chorar outra vez assim que ele a
tocou.
Joseph
a puxou para seus braços, e parecia contente em mantê-la ali até que Demétria
recuperasse o controle de si mesma. Era evidente que ele acabava de nadar no
lago,
já
que ele pingava da cabeça até a cintura. Demétria também não o ajudava em
secar-se, porque chorava, ofegava e soluçava sobre o macio pelo que cobria o
peito de Joseph.
-
Você vai congelar até a morte, andando por aí meio nu - disse entre soluços -.
E desta vez eu não vou esquentar seus pés.
Se
Joseph lhe respondeu, ela não pôde ouvir. Seu rosto estava pressionado no ombro
dele. Ela também acariciava seu peito. Joseph imaginou que Demétria nem sequer
percebia o que estava fazendo, ou entendia o efeito que suas ações tinham sobre
ele.
Demétria
de repente tentou se afastar de Joseph. Sua cabeça se chocou com o queixo dele,
murmurou uma desculpa, e depois cometeu o erro de levantar o olhar para ele.
Sua boca estava realmente muito próxima. Demétria não podia deixar de olhar
para ela, enquanto se lembrava com bastante clareza como tinha se sentido
quando o beijou tão descaradamente aquela noite na tenda.
Queria
voltar a beijá-lo.
Joseph
teve que ter lido suas intenções, porque sua boca foi baixando lentamente para
a boca de Demétria.
Ele
só pretendia lhe dar um beijo suave e delicado. Sim, sua intenção era
consolá-la, mas então os braços de Demétria deslizaram ao redor de seu pescoço
e sua boca se abriu imediatamente para receber a dele. A língua de Joseph soube
tirar vantagem daquele beijo e colou-se com a boca de Demétria.
Deus,
ela era maravilhosa! Ela poderia fazê-lo arder em poucos minutos. E tampouco ia
permitir que ele fosse suave e delicado. Os sons que ela fazia, no mais
profundo de sua garganta, fizeram-no deixar de lado todo pensamento de
consolá-la.
Joseph
a sentiu estremecer junto dele, e só então se lembrou de onde eles estavam.
Separou-se a contragosto de Demétria, tolamente esperando que houvesse um
protesto por parte dela. Ele teria que beijá-la novamente, ele decidiu, e, em
seguida, foi em frente e fez exatamente isso antes que sua suave e sensual
mulher tivesse a chance de pedir.
Joseph
fazia com que todo o corpo de Demétria ardesse de desejo. Ela pensou que não
teria a força necessária para deter-se, até que de repente a mão dele roçou em
seu seio. A sensação foi maravilhosa, e quando ela percebeu o quanto ela
desejava mais daquilo, ela se afastou dele.
-
Será melhor que você vá para dentro antes que vire uma pedra de gelo - Demétria
disse, e sua voz soou em um tom bastante seco.
Joseph
suspirou. Demétria estava fazendo aquilo outra vez, tentando afastar-se dele.
Ele a pegou em seus braços, ignorando seus protestos, e começou a andar para o
castelo.
-
Miley falou com você a respeito do que aconteceu com ela? - perguntou Joseph
quando sua mente conseguiu encontrar o foco outra vez.
-
Ela falou - respondeu Demétria -. Mas não repetirei uma única palavra do que
ela me disse, não importa o quão insistente você possa ser. Se desejar pode me
torturar, mas mesmo assim eu....
-
Demétria... – seu suspiro prolongado a deteve.
-
Prometi a Miley que não diria nada a ninguém, especialmente a você. Sua irmã
tem muito medo de você, Joseph. É uma situação realmente lamentável, certamente
- concluiu.
Demétria
tinha pensado que seu aviso encheria Joseph de fúria, e ficou surpresa quando o
viu assentir.
-
É assim que deveria ser - disse, encolhendo os ombros -. Sou seu lord além de
seu irmão, e o primeiro deve ter preferência sobre o segundo.
-
Não é assim como deveria ser - argumentou Demétria -. Uma família deveria estar
unida. Todos deveriam comer juntos e nunca brigar entre eles. Deveriam....
-
Como demônios você vai saber o que uma família deveria ou não deveria fazer?
Você viveu com seu tio - afirmou Joseph, sacudindo a cabeça com exasperação.
-
Bom, pois mesmo assim continuo sabendo como deveriam agir as famílias
-protestou Demétria.
-
Não questione meus métodos, Demétria - disse Joseph com um grunhido -. Por que
você estava chorando? - perguntou depois, mudando rapidamente de assunto.
-
Pelo que meu irmão fez com Miley - sussurrou Demétria. Apoiou o rosto no ombro
de Joseph -. Meu irmão arderá no inferno durante toda a eternidade.
-
Sim - respondeu Joseph.
-
Sebastian é um homem com desejo assassino. Não condeno você por querer matá-lo,
Joseph.
Joseph
sacudiu a cabeça.
-
E o fato de não me condenar faz com que você se sinta melhor? - perguntou.
Demétria
acreditou ter ouvido uma ponta de diversão em sua voz.
-
Eu mudei minha opinião sobre matar. Eu estava chorando por causa dessa perda -
murmurou -. E pelo que eu tenho que fazer.
Joseph
esperou que Demétria se explicasse. Chegaram às portas do castelo. Joseph abriu
uma delas sem incomodá-la por isso, e a força que havia nele voltou a
assombrá-la. Custou-lhe toda sua determinação, assim como ambas as mãos,
também, para manter uma dessas portas abertas o suficiente para escapulir entre
elas, sem que pegassem seu traseiro e, no entanto, Joseph não tinha mostrado o
menor esforço.
-
O que você tem que fazer? - perguntou Joseph, incapaz de conter sua
curiosidade.
-
Tenho que matar um homem.
A
porta foi fechada com um golpe seco no mesmo instante em que Demétria murmurava
sua confissão. Joseph não estava muito certo de tê-la ouvido corretamente. Ele
decidiu que teria paciência suficiente para esperar até que tivessem chegado a
seu quarto, antes de lhe fazer mais pergunta a esse respeito.
Ele
carregou Demétria escada acima, ignorando seus protestos de que podia andar e
quando chegaram ao nível do salão não se deteve, mas sim continuou subindo até
chegar ao seguinte nível. Demétria acreditava que ele a levava aos aposentos da
torre. Quando chegaram à entrada da estrutura circular, Joseph virou na direção
oposta e continuou andando por um corredor escuro. Estava muito escuro para que
ela pudesse ver aonde ele a levava.
Demétria
estava bem curiosa, porque até aquele momento nem sequer tinha percebido
naquela estreita entrada. Chegaram ao final do corredor, e Joseph abriu uma
porta e carregou Demétria para dentro. Obviamente aquele era o quarto em que
ele dormia, compreendeu Demétria, enquanto pensava que era muito amável por
parte de Joseph ceder seus aposentos por aquela noite.
O
quarto estava quente e era muito acolhedor. Um grande fogo ardia dentro da
lareira, dando calor e um brilho suave ao resto dos aposentos. Uma única janela
ocupava o centro da parede em frente, coberta por uma pele de animal no lugar
das portinholas. Uma grande cama ocupava a maior parte da parede de pedra junto
à lareira, com uma arca perto dela.
A
cama e a arca eram os únicos móveis daquele quarto. Mas estava limpa, quase
impecável. Aquele fato fez Demétria sorrir. Não sabia por que aquilo a
agradava, mas se alegrava em saber que Joseph não gostava de desordem assim
como ela.
E
então por que permitia que o salão principal estivesse sempre tão abandonado?
Agora que tinha visto seus aposentos, aquilo não tinha sentido para Demétria.
Decidiu perguntar-lhe logo quando ainda estava de bom humor. Então Demétria
voltou a sorrir, porque acabava de perceber que era bem provável que ela se
tornasse uma anciã, antes que Joseph conseguisse alcançar uma mudança tão
notável em sua maneira de ser.
Joseph
não parecia ter absolutamente nenhuma pressa em soltá-la. Foi até a lareira,
apoiou os ombros contra a borda do manto espesso, e começou a esfregar de
frente e para trás, obviamente aliviando uma súbita coceira. Demétria se
agarrou a ele tão desesperadamente como se nisso estivesse sua vida. Deus, ela
desejou que ele estivesse usando uma camisa! Aquilo não era decente, disse a si
mesma, porque gostava de muito tocar sua pele. Joseph era como um deus de
bronze. Sua pele era quente ao tato, e com as palmas de suas mãos descansando
sobre seus ombros, ela podia sentir como seus músculos moviam-se debaixo das
pontas de seus dedos a cada ondulação.
Demétria
desejou poder entender a maneira que reagia em relação a ele. Ora, seu coração
estava voltando a bater desenfreadamente! Atreveu-se a lançar um rápido olhar
para cima, e ao fazê-lo descobriu que Joseph a contemplava com muita atenção.
Ele era muito atraente, e Demétria desejou que ele fosse feio.
-
Você vai me segurar pelo resto da noite? - perguntou, conseguindo que sua voz
soasse ridiculamente desgostada.
Joseph
encolheu os ombros, o que quase fez com que Demétria caísse. Voltou a se
segurar nele, e quando Joseph sorriu, compreendeu que era bem provável que ele
estivesse se sacudindo daquela maneira só para fazer com que ela se unisse a
ele.
-
Primeiro responda minha pergunta e então eu vou soltá-la - Joseph decidiu.
-
Vou responder sua pergunta - disse ela.
-
Você me disse que estava pensando em matar um homem?
-
Sim, eu disse - ela olhava para o queixo dele, enquanto lhe respondia.
Demétria
esperou por um interminável minuto até que Joseph comentasse sua afirmação. Ela
pensou que provavelmente ele daria um sermão sobre sua lamentável debilidade na
tarefa de matar alguém.
Mesmo
assim, não estava preparada para a gargalhada de Joseph. Ela começou como um
surdo rumor dentro de seu peito, mas foi adquirindo volume rapidamente até que
ele estava quase sufocando em verdadeira alegria.
Ele
a ouviu perfeitamente bem, afinal. Demétria havia dito que ia matar um homem. A
princípio aquela declaração pareceu tão assombrosa que Joseph acreditou que ela
estivesse brincando. Mas a expressão tão solene que havia em seu rosto indicava
que ela realmente falava a sério.
A
reação dele não a agradou muito. Deus o ajudasse, ele não conseguia parar de
rir. Ele deixou Demétria escorregar de seu abraço, mas manteve suas mãos
segurando os ombros dela, assim ela não poderia fugir.
-
E quem é o infeliz homem que você planeja matar? - ele finalmente conseguiu
perguntar -. Seria um de nós, Wexton, por ventura?
Demétria
se afastou dele.
-
É obvio que não se trata de um Wexton embora, para ser bem honesta, e no caso
de eu ter uma alma malvada, você seria o primeiro em minha preparada para
aqueles que eu liquidaria, milord.
-
Ah - disse Joseph, ainda sorrindo -. Se não é um de nós, minha doce e delicada
lady, então quem você deseja liquidar? - ele perguntou, utilizando a ridícula
expressão que Demétria empregou ao se referir ao ato de matar.
-
Sim, Joseph, é verdade. Sou uma doce e delicada donzela, e já é hora de você
entender isso - respondeu Demétria, cuja voz agora não soava particularmente
doce.
Demétria
foi até a cama e se sentou na beirada. Depois dedicou um bom tempo alisando as
saias de seu vestido e finalmente colocou as mãos no colo. O fato de falar com
tanta facilidade em tirar a vida de outra pessoa a deixava realmente assustada.
Mas afinal de contas, o homem que ela pensava em matar certamente precisava que
o matassem, não?
-
Não conseguirá seu nome de mim, Joseph. Isto é um assunto meu, não seu.
Joseph
não estava de acordo, mas decidiu esperar um pouco antes de arrancar a verdade.
-
E quando matar esse homem, Demétria, voltará a despejar a comida que leva no
estômago?
Demétria
não respondeu. Joseph pensou que provavelmente estivesse percebendo quão
insensato era seu plano.
-
E também vai chorar? - ele perguntou, repetindo com sua pergunta a reação de
Demétria depois de ter matado o soldado que atacou Nicholas.
-
Vou me lembrar de não comer nada antes de matá-lo, Joseph, de maneira que não
vomitarei. E se eu chorar depois de matá-lo, então eu vou encontrar algum lugar
privado de maneira que ninguém vai me ver chorar. Essa explicação é suficiente
para você?
Demétria
respirou fundo, fazendo um esforço tremendo para manter a expressão a mais
tranquila possível. Deus, já se sentia como uma pecadora!
-
A morte não é algo que se possa fazer com bom ânimo - disse depois -. Mas a
justiça também não deve ser enganada.
Joseph
voltou a rir. Aquilo enfureceu Demétria.
-
Eu gostaria de dormir agora, por isso, por favor, vá embora.
-
Você acredita que pode me dizer para deixar meu próprio quarto? - perguntou
Joseph.
Agora
ele não estava rindo, e Demétria não teve coragem de olhar para ele.
-
Eu acreditava que sim - admitiu -. Se eu estou sendo pouco respeitosa, lamento
por isso. Mas você sabe que eu não minto. É muito amável ao me ceder sua cama
por uma noite. Eu realmente aprecio sua gentileza, Joseph. E amanhã retornarei
à torre depois que os aposentos de Miley forem devidamente limpos.
Ela
ficou sem fôlego quando terminou sua explicação.
-
Sua honestidade é muito refrescante.
-
Sim, mas de vez em quando me leva a fazer coisas que não deveria.
Demétria
suspirou. Continuava olhando para suas mãos, desejando que Joseph se apressasse
e que fosse de uma vez. Então ouviu um golpe surdo. Aquele ruído atraiu sua
atenção e quando levantou o olhar, o fez bem a tempo de ver como Joseph tirava
sua segunda bota e a deixava cair no chão.
-
Ficar na minha frente sem usar a camisa é uma indecência - declarou Demétria -.
E agora está tirando o resto de suas roupas antes de partir? Você fica na
presença de lady Eleanor desta maneira?
Demétria
pôde sentir como se ruborizava. Estava decidida a ignorar Joseph. Se ele
quisesse desfilar por aí seminu, então, ela teria que fechar seus olhos. E
Joseph não teria uma única palavra de despedida da parte dela.
Demorou
um pouco para perceber quais eram as intenções de Joseph. Demétria o observava
pela extremidade do olho, e viu como Joseph se ajoelhava diante do fogo e
acrescentava outro grosso tronco. Demétria quase agradeceu por aquela cortesia,
até que se lembrou que estava decidida em ignorá-lo. Deus, Joseph sempre a
fazia perder a linha de raciocínio, não era assim?
Joseph
se levantou e foi para a porta. Antes que Demétria soubesse o que ele estava
prestes a fazer, ele deslizou a grossa tábua de madeira pelos dos aros de
metal.
Seus
olhos se abriram de espanto. Ela estava trancada dentro do quarto, mas o
verdadeiro problema, tal como ela via, era o fato de Joseph estar no lado
errado da porta. E nem sequer uma doce e delicada lady de nobre berço podia
interpretar mal o significado daquela ação.
Demétria
deixou escapar um suspiro de indignação, saltou da cama e correu para a porta.
Em sua mente só havia uma intenção: ia sair daquele quarto e se afastar de
Joseph.
Ele
a observou lutar com o fecho por um instante. Quando ficou convencido de que
Demétria nunca conseguiria saber como funcionava o insólito ferrolho que havia
debaixo da barra, foi para a cama. Ele decidiu ficar de calças em deferência
aos sentimentos de Demétria, que parecia estar a ponto de perder o controle.
-
Venha para cama, Demétria - Joseph pediu enquanto se deitava em cima dos
cobertores.
-
Não dormirei perto de você - Demétria gaguejou.
-
Já dormimos juntos...
-
Só uma vez dentro daquela tenda, Joseph, e isso foi por necessidade. Cada um
compartilhou o calor do outro.
-
Não, Demétria, porque eu dormi perto de você cada noite depois disso - informou
Joseph.
Demétria
se virou para olhá-lo fixamente.
-
Você não fez isso!
-
Sim, eu fiz.
Joseph
sorria para ela.
-
Como pode mentir com tanta facilidade? - quis saber Demétria.
Ela
não lhe deu tempo para responder, mas se virou novamente para a porta e
recomeçou seu trabalho sobre o ferrolho.
A
recompensa por seus esforços consistiu em uma lasca debaixo da delicada pele de
seu polegar. Demétria soltou um chiado de raiva.
-
E agora tenho a uma parte desta maldita madeira debaixo de minha pele, graças a
você - murmurou enquanto baixava a cabeça para examinar o machucado.
Joseph
suspirou. Demétria ouviu do outro extremo do quarto o exagerado som que saiu de
seus lábios, mas não ouviu quando Joseph se moveu e quando ele agarrou
subitamente sua mão, ela saltou para trás, atingindo o topo de sua cabeça com a
extremidade do queixo de Joseph.
-
Você se move como um lobo - ela falou enquanto permitia que Joseph a levasse
para luz do fogo -. Não estou fazendo nenhum elogio, Joseph, por isso pode
deixar de sorrir.
Ele
ignorou seus murmúrios. Ele estendeu a mão sobre o manto e pegou um punhal
muito afiado cuja ponta era quase tão fina como a de uma agulha. Demétria
fechou os olhos até que sentiu a primeira espetada. Então teve que abri-los,
porque se não observasse Joseph, ele provavelmente cortaria seu polegar.
Demétria se inclinou para baixo até que, inadvertidamente, bloqueou seu polegar
dos olhos de Joseph.
Ele
puxou a mão de Demétria para cima, deixando-a melhor iluminada e inclinou sua
cabeça sobre ela para terminar sua tarefa. A testa de Demétria tocou a de
Joseph. Ela não se separou, e ele tampouco o fez.
Joseph
cheirava muito bem.
Demétria
voltava a cheirar a rosas.
A
lasca foi extraída. Demétria não disse uma única palavra a Joseph, mas ela
estava olhando para ele com uma expressão tão confiante em seu rosto. Joseph
franziu o cenho em uma careta de frustração. Quando Demétria o olhava daquela
maneira, ele só podia pensar em tomá-la em seus braços e beijá-la. Demônios,
admitiu com desgosto, tudo o que ela tinha a fazer era olhar para ele e ele já
queria deitar com ela!
Joseph
jogou a adaga de volta no manto e, em seguida, voltou para a cama. Não havia
soltado a mão de Demétria, e agora ele a arrastava atrás dele.
-
Pensa em matar um homem quando nem sequer pode tirar uma lasca - ele murmurou.
-
Não vou dormir com você - declarou Demétria em um tom que não podia ser mais
enfático enquanto se detinha junto à cama, decidida a vencer -. Você é o homem
mais arrogante e teimoso, que já conheci. Minha paciência está se esgotando,
Joseph. Eu não vou aguentar muito mais.
Demétria
percebeu que seu erro estava em aproximar-se muito de Joseph, quando gritou sua
ameaça. Joseph estendeu os braços para ela e, literalmente, a levou para cima
dele. Demétria aterrissou sobre seu colo com um golpe surdo. Joseph a tirou de
cima dele para deixá-la a seu lado, com sua mão ainda fechada sobre o punho de
Demétria.
Ele
fechou os olhos, em uma óbvia tentativa de esquecer da presença dela. Demétria
o encarou.
-
Você me odeia demais para dormir perto de mim. Você mentiu, não foi, Joseph?
Não estivemos dormindo juntos. Eu me lembraria.
-
Você é capaz de dormir durante uma batalha - observou Joseph. Seus olhos
estavam fechados, mas agora ele sorria -. E não odeio você, Demétria.
-
Você com certeza me odeia - replicou Demétria -. Não se atreva a mudar de ideia
agora.
Ela
esperou um longo momento para que Joseph lhe respondesse. Quando ele não disse
uma palavra, Demétria começou tudo de novo.
-
A ação que nos uniu não teve nada de nobre. Eu salvei sua vida. E como você me
pagou por isso? Pois bem, você me arrastou até este lugar esquecido por Deus, e
poderia acrescentar que constantemente abusando de minha doce natureza. Eu
acredito que convenientemente você esqueceu que também salvei a vida de
Nicholas.
Deus,
como desejou que Joseph abrisse os olhos para que ela pudesse ver sua reação!
-
Agora eu cuidei de Miley. Mas me pergunto se você não terá planejado isso desde
o primeiro momento. - Esse pensamento lhe fez franzir o cenho e continuou
falando -: A esta altura, você deveria admitir que eu sou a inocente em todo
esse seu plano. Sou eu que estou sendo tratada injustamente. Ora, quando penso
em tudo o que tive que suportar...
O
ronco de Joseph a fez calar. De repente Demétria ficou tão furiosa que desejou
ter coragem para gritar na orelha dele.
-
Sou eu quem deveria odiar você - murmurou para si mesma. Ela ajeitou seu
vestido e se deitou sobre suas costas -. Se eu não tivesse meus próprios e
satisfatórios planos, estaria muito zangada por tudo o que você fez para
arruinar meu bom nome, Joseph. Agora nem sequer posso fazer um casamento
adequado. Disso já não há nenhuma dúvida, mas admito que o perdedor será
Sebastian e não eu. Meu irmão ia vender me ao melhor lance. Ao menos isso foi o
que ele disse que ia fazer. Agora ele só vai me matar se conseguir se aproximar
o suficiente - murmurou -. E tudo isso por sua causa - acrescentou com
veemência.
Quando
terminou suas reclamações, Demétria estava esgotada.
-
Como vou conseguir que você me prometa alguma coisa? E eu já dei minha palavra
à pobre Miley - acrescentou com um bocejo cheio de cansaço.
Então
Joseph se moveu. Demétria foi pega totalmente despreparada, e só teve tempo de
abrir os olhos antes que Joseph se inclinasse sobre ela. O rosto de Joseph
estava muito perto do dela, e seu hálito era como uma cálida e doce carícia
sobre as bochechas de Demétria. Uma das pesadas coxas de Joseph a deixou presa.
Santo
Deus, e além disso ela estava deitada de barriga para cima!
-
Se você se aproveitar de mim, encontrarei alguma maneira de contar a lady
Eleanor - conseguiu balbuciar.
Joseph
virou seus olhos para o céu.
-
Demétria, sua mente está consumida pela obsessão de que eu vou...
Ela
colocou bruscamente a mão em cima da boca de Joseph e a manteve ali.
-
Não se atreva a dizê-lo - replicou -. E por que outra razão você estaria
estendido em cima de mim como a uma manta se não quisesse...?
Demétria
igualava sua visão com a de Joseph.
-
Você está tentando me enlouquecer - ela o acusou.
-
Você já está - anunciou Joseph.
-
Saia de em cima de mim. Você pesa mais que as portas da sua casa.
Joseph
deslocou seu peso até que sua massa ficou sustentada pelos cotovelos. Sua
pélvis repousava sobre a de Demétria. Joseph podia sentir o calor que havia
dentro dela.
-
Que promessa você quer de mim?
A
pergunta pareceu deixar Demétria bastante confusa.
-
Miley - recordou Joseph.
-
Oh - disse Demétria, quase sem fôlego -. Eu pensei em esperar até manhã para
falar com você a respeito de Miley, mas não tinha percebido que você me
obrigaria a dormir com você. E esperava pegar você de melhor humor...
-
Demétria...
A
última sílaba de seu nome foi articulada mediante um longo e cuidadosamente
controlado gemido, e a maneira com que Joseph apertava seu queixo fez com que
Demétria soubesse que havia esgotado sua paciência.
-
Desejo que me dê sua palavra de que Miley poderá viver aqui com vocês durante
todo o tempo que ela quiser, e que não vai obriga-la a se casar sob nenhuma
circunstância. Pronto. Ficou claro o bastante para você?
Joseph
franziu o cenho.
-
Amanhã falarei com Miley - declarou depois.
-
Sua irmã está muito assustada para falar abertamente com você, mas se eu puder
lhe dizer que você deu sua palavra, então acredito que você perceberá uma
mudança bastante considerável nela. Miley está muito preocupada, Joseph, e se
pudermos aliviar a carga que pesa sobre ela, então ela se sentirá muito melhor.
Joseph
teve vontade de sorrir. Demétria tinha adotado o papel de mãe de Miley, tal
como ele suspeitava que ela faria. Sentiu-se imensamente satisfeito em ver que
seu plano tinha funcionado.
-
Muito bem. Diga a Miley que dei minha palavra. Terei que falar com o Liam -
acrescentou, quase como uma ideia de último momento.
-
Liam terá que encontrar alguém mais para se casar. E de qualquer maneira, Miley
acredita que agora o contrato já não é mais obrigatório. Além disso Liam vai
querer uma mulher que não tenha sofrido mácula alguma e isso faz com que eu
desgoste dele imensamente.
-
Nem sequer conhece esse homem - disse Joseph com exasperação -. Como pode
julgá-lo tão facilmente?
Demétria
franziu o cenho. Joseph tinha razão, embora quase lhe doesse ter que concordar
com aquela afirmativa.
-
Liam sabe o que aconteceu a Miley? - perguntou.
-
A esta altura toda a Inglaterra sabe. Sebastian está se assegurado disso.
-
Meu irmão é um homem muito perverso.
-
Seu tio Berton é da mesma opinião a respeito de Sebastian? - perguntou Joseph
-
Como sabe o nome de meu tio? -perguntou Demétria.
-
Você me disse - respondeu Joseph, sorrindo ao ver como ela abria seus olhos.
-
Quando? Tenho uma memória excelente e não me lembro de ter mencionado.
-
Quando estava doente, contou-me a respeito de seu tio.
-
Pois se falei não me lembro. Foi muito grosseiro de sua parte escutar o que eu
disse.
-
Não havia como deixar de ouvir sua voz - disse Joseph, sorrindo ante a
lembrança -. Você gritava tudo que você falava.
Ele
exagerava só para provocar a reação de Demétria. Quando ela não estava na
defensiva, suas expressões eram inocentemente refrescantes de se ver.
-
Conte-me que mais eu disse - exigiu Demétria em um tom carregado de suspeita.
-
A lista é muito longa. Basta dizer que você me contou tudo isso.
-
Tudo? - exclamou Demétria, que agora parecia horrorizada.
Deus,
aquilo era terrivelmente constrangedor. E se ela havia chegado a dizer o quanto
gostava de beijá-lo?
Um
suave brilho iluminou os olhos de Joseph. Provavelmente ele estaria apenas
zombando dela. Isso não estava nada bem, e Demétria decidiu que faria
desaparecer aquele sorriso.
-
Então eu lhe disse os nomes de todos os homens que levei para minha cama, não
é? Bom, suponho que o jogo terminou - concluiu com um suspiro.
-
Seu jogo terminou no momento em que nos encontramos - disse Joseph suavemente.
Demétria
sentiu como se acabasse de ser acariciada, e não soube como reagir.
-
E o que isso significa exatamente? - perguntou.
Joseph
sorriu.
-
Você fala demais - ele disse -. Esse é outro defeito que você deveria tentar
corrigir.
-
Isso é ridículo! - replicou Demétria -. Eu falei suficientemente pouco com você
durante toda a semana e você me ignorou por completo. Como pode dizer que falo
demais? - perguntou, atrevendo-se a cravar um dedo em seu ombro.
-
Não estou sugerindo nada. Limito-me a expor os fatos - respondeu Joseph,
observando-a com muita atenção e vendo a labareda que iluminou seus olhos
azuis.
Fazer
com que Demétria mordesse a isca era muito fácil. Joseph sabia que deveria
parar, mas na verdade estava desfrutando muito da maneira com que ela reagia.
Não havia nenhum mal nisso, e agora Demétria estava tão furiosa como uma gata
selvagem.
-
Desagrada-lhe que eu diga o que penso?
Joseph
assentiu.
Demétria
achou que agora ela era um verdadeiro patife. Uma mecha de escuros cabelos
tinha caído para frente e repousava sobre sua testa. Ele também estava
sorrindo. Oh, aquilo teria levado um santo a cair em tentação!
-
Então deixarei de falar com você. Juro que nunca mais voltarei a falar com
você. Isso agradaria você?
Ele
voltou a assentir, embora desta vez tenha feito muito mais devagar que antes.
Demétria respirou fundo enquanto se preparava para lhe dizer o que pensava a
respeito de sua indelicadeza, mas Joseph a silenciou. Baixou a cabeça e roçou
os lábios de Demétria com os seus, deixando-a bem surpresa para reduzi-la a uma
submissão temporária.
Sem
que houvesse nenhum treinamento, Demétria abriu a boca para a insistente língua
de Joseph e então ele começou a fazer amor lentamente com sua língua. Deus,
podia sentir o fogo que ardia dentro dela! Suas mãos se estenderam junto aos
lados do rosto de Demétria e seus dedos se enredaram em seu magnífico cabelo.
Como
a desejava! O beijo passou rapidamente de uma delicada carícia para se
transformar em uma amostra de paixão selvagem. Suas línguas duelaram uma e
outra vez até que Joseph quase perdeu a razão de tanto querer mais. Sabia que
deveria se deter, e já se preparava para se separar dela quando sentiu que as
mãos de Demétria tocavam suas costas. A carícia era muito suave e hesitante, e
a princípio se mostrou tão leve como uma mariposa, mas assim que Joseph soltou
um grunhido e voltou a se envolver na doçura da boca de Demétria, sua carícia
passou a adquirir uma nova pressão. Suas bocas se tornaram ardentes e úmidas, e
se agarravam a uma à outra.
Joseph
sentiu como um súbito estremecimento percorria o corpo de Demétria e ouviu o
gemido entrecortado que escapou de seus lábios quando, de muito má vontade, foi
se afastando dela.
Os
olhos de Demétria estavam nublados pela paixão e seus lábios, vermelhos e
inchados, chamavam-no pedindo que ele voltasse a saboreá-la. Joseph sabia que
não deveria ter iniciado aquilo que não podia terminar. Todo seu corpo palpitava
de desejo, e precisou de um supremo ato de vontade para afastar-se dela.
Com
outro gemido de frustração, Joseph se virou até ficar de lado. Depois, envolveu
a cintura de Demétria com seu braço e a atraiu para ele.
Demétria
queria chorar. Não podia entender o porquê em permitir, uma e outra vez, que
Joseph a beijasse. Ainda mais importante, ela não conseguia impedir que ela
mesma evitasse beijá-lo. Estava sendo tão lasciva como uma prostituta qualquer.
Tudo
que Joseph precisava fazer era tocá-la para que ela se desmanchasse pedaços.
Seu coração batia a toda velocidade, as palmas de suas mãos esquentaram, e ela
se via invadida por um infinito desejo de que houvesse algo mais.
Ouviu
Joseph bocejar, e concluiu que aquele beijo não tinha significado grande coisa
para ele depois apesar de tudo.
Aquele
homem a irritava tanto como uma brotoeja. Demétria decidiu que manteria uma
distância considerável a respeito dele, no mesmo instante em que contrariava
sua decisão fazendo com que seu corpo se moldasse à curva do corpo de Joseph.
Quando ela já havia quase conseguido se acomodar de maneira inteiramente
satisfatória, Joseph deixou escapar um áspero gemido. Suas mãos foram para os
quadris de Demétria e a seguraram firmemente.
Aquele
homem sempre tentava contrariá-la em tudo! Por acaso não percebia quão incômodo
era dormir vestindo o mesmo traje que usava para passear? Demétria voltou a se
mexer, e sentiu Joseph estremecer perto dela, e então pensou que ele poderia
estar preparando para gritar com ela.
Demétria
estava muito cansada para se preocupar com o mau humor de Joseph. Com um bocejo
próprio, adormeceu.
Foi,
sem dúvida, o desafio mais difícil que Joseph enfrentou. E se Demétria voltasse
a mover seu traseiro ainda que só mais uma vez, Joseph sabia que não conseguiria
superar aquela provação.
Nunca
tinha desejado uma mulher da maneira com que estava desejava Demétria. Joseph
fechou os olhos e deu uma profunda e trêmula inspiração. Demétria se moveu
suavemente junto dele e Joseph começou a contar até dez, prometendo-se que
quando chegasse a esse número mágico, iria se sentir um pouco mais dono de si
mesmo.
A
inocente aninhada contra ele não tinha, absolutamente, nenhuma ideia do perigo
que corria. Seu traseiro levava toda a semana distraindo Joseph. Imaginou a
maneira que Demétria andava, e de repente voltou a ver o delicado balançar de
seus quadris, quando passeava ao redor da fortaleza dos Wexton.
Demétria
afetaria os outros da mesma maneira que ela o afetava? Joseph franziu o cenho
ante aquela pergunta e terminou admitindo que sem dúvida ela afetaria. Sim,
porque ele já tinha visto os olhares que seus homens lançavam para ela quando a
atenção de Demétria estava dirigida para outro lugar. Inclusive o fiel Anthony,
o vassalo em quem Joseph mais confiava e seu melhor amigo, tinha mudado sua
atitude inicial para com Demétria. No começo da semana Anthony sempre estava
muito calado e era comum franzir o cenho, mas quando a semana chegou ao fim
Joseph percebeu que normalmente quem falava era seu vassalo.
E
agora Anthony também não seguia Demétria, porque caminhava ao lado dela.
Exatamente
onde Joseph queria estar.
Não
podia culpar Anthony pela debilidade em sucumbir aos encantos de Demétria.
Nicholas,
entretanto, já era outra questão. O irmão mais novo parecia ter-se encantado
por Demétria, e aquilo podia chegar a ser um problema.
Demétria
começou a se mover novamente. Joseph sentiu como se acabassem de marcá-lo com
ferro, e de repente um doloroso desejo reclamou toda sua atenção. Com um
grunhido de frustração, separou os cobertores e se levantou da cama. Embora
Demétria tivesse sido sacudida por aquele súbito movimento, não despertou.
-
Dorme como a uma criança inocente - murmurou Joseph para si mesmo, enquanto ia
para a porta.
Retornaria
a seu lago e enquanto sacudia a cabeça, Joseph compreendeu que encontraria
autêntico prazer naquele segundo mergulho.
Joseph
não era um homem paciente, mas queria que todas as questões estivessem
resolvidas antes de reclamar Demétria para si. Resignou-se ao fato de que
provavelmente agora nadaria mais frequentemente em seu lago. Não era um desafio
que o jogava para fora agora, mas um a necessidade de encontrar algum tipo de
liberação para o fogo que ardia em suas vísceras.
Com
um murmúrio de desgosto, Joseph fechou a porta.