terça-feira, 25 de dezembro de 2018

ESPLENDOR DA HONRA Capitulo 5



Os ímpios fogem sem que haja ninguém a persegui-los;
mas os justos são ousados como um leão
Provérbios, 28, 1.
Santo Deus, seriam atacados. Paralisada pelo estupor, Demétria começou a tremer de medo. O fato de ter perdido o controle de si mesma com tanta rapidez a enfureceu imensamente. Demétria jogou os ombros para trás, resolvida a pensar com lógica. Inspirou uma profunda e tranquilizadora respiração. Assim, disse a si mesma, agora posso decidir o que tenho a fazer.
OH, como desejou ser valente! Suas mãos estavam começando a ter cãibras, e só então percebeu que estava espremendo as pregas de sua capa com tal força que seus dedos doíam por causa da pressão.
Demétria sacudiu a cabeça, rezando para que a ajuda divina a ajudasse a se decidir.
Com certeza, como prisioneira de Joseph, não tinha o dever de alertá-lo a respeito da ameaça que se estava aproximando. Podia ficar em silêncio e fugir logo que começasse a batalha.
Aquela possibilidade não demorou a ser descartada, porque Demétria compreendeu que caso fizesse tal coisa, então haveria ainda mais mortes. Se avisasse a Joseph, possivelmente poderiam se apressar em sair daquele lugar. Sim, se saíssem imediatamente dali poderiam chegar a se afastar o suficiente para que não pudessem atacá-los, e dessa maneira a batalha não iria acontecer. Por acaso salvar vidas não era mais importante que seu próprio plano de fuga?
Demétria decidiu que ia interceder. Recolheu as saias de seu vestido, correu em busca de seu captor, pensando que era muito irônico que fosse ela que o advertisse do iminente ataque.
Joseph estava de pé no centro de um círculo de soldados, com Nicholas junto dele. Demétria foi avançando ao redor dos homens e se deteve quando esteve atrás de Joseph.
- Quereria ter uma conversa com você, barão - interrompeu Demétria.
Sua voz quebrou por causa da tensão, e suas palavras apenas chegaram a ter um pouco de volume. Sem dúvida essa foi a razão pela qual Joseph não deu importância ao seu pedido, já que simplesmente não a escutou.
- Tenho que falar com você - disse Demétria, repetindo seu pedido em um tom bem mais alto. Depois se atreveu a tocar seu ombro.
Joseph continuou sem lhe dar confiança.
Demétria voltou a tocá-lo, agora fazendo-o com mais força que antes.
Joseph aumentou o tom de sua voz, enquanto continuava falando com seus homens a respeito de algum assunto que Demétria sabia que tinha que ser totalmente insignificante, em comparação com o que ela estava tentando lhe dizer.
Deus, mas que teimoso era aquele homem! Demétria retorceu suas mãos, ficando ainda mais alarmada, a cada segundo que passava, e consumindo-se de preocupação ao pensar que todos aqueles soldados, que agora mesmo estavam subindo pelas colinas, podiam cair sobre eles a qualquer momento.
De repente a frustração de ter que esperar sem poder fazer nada até que Joseph se dignasse reconhecer sua presença se voltou insuportável. A ira tomou o controle. Utilizando até o último grama de força que possuía, Demétria chutou Joseph completamente. O alvo que escolheu para semelhante ação foi a parte de trás do joelho direito do barão, e sua pontaria não pôde ser mais certeira.
Demétria compreendeu imediatamente a insensatez de sua temerária ação, quando uma terrível pontada de dor subiu por sua perna. Os dedos de seu pé certamente estariam quebrados devido ao tremendo impacto, e o único consolo que encontrou para a dor que acabava de infligir-se foi o fato de que, por fim, tinha conseguido atrair a atenção de Joseph. E de uma maneira bastante rápida, além disso. Joseph se voltou para ela, movendo-se com a celeridade de um lobo, quando se dispõe a saltar sobre sua presa.
Parecia achar-se mais assustado que furioso. Demétria não pôde evitar fixar-se em suas mãos, apertadas em punhos, mas que permaneciam imóveis sobre seus quadris. Enquanto torcia o rosto por causa da dor que sentia nos dedos de seus pés, Demétria descobriu que agora era igualmente doloroso olhar diretamente no rosto de Joseph. O que fez em vez disso foi virar-se para olhar para Nicholas e ao fazê-lo aliviou seu desconforto, porque agora o rosto do irmão refletia a expressão mais ridícula que se pudesse imaginar.
- Eu gostaria de ter uma palavra com você a sós - declarou Demétria, quando por fim se sentiu capaz de voltar a olhar para Joseph
A preocupação que tinha ouvido na voz de Demétria despertou a curiosidade de Joseph. Assentiu e, agarrando-a pelo braço, levou-a para o outro lado do acampamento.
Demétria tropeçou duas vezes.
Em um dado momento Joseph suspirou, um suspiro bem prolongado e cheio de cansaço; Demétria soube que isso iria beneficiá-la.
Demétria pouco se incomodava se Joseph a fizesse se sentir sem importância como se fosse um espinho em sua pele. Assim que ela se explicasse, Joseph não iria mais considerar sua interrupção como um incômodo. De fato, inclusive podia chegar a lhe agradecer, embora Demétria duvidasse que aquele homem fosse capaz de semelhante reação.
E o que era ainda mais importante, as mortes poderiam ser evitadas. Esse pensamento lhe deu a coragem necessária para olhar para Joseph, diretamente nos olhos.
- Uns homens estão vindo pelo vale - disse.
Demétria tinha esperado que houvesse uma reação imediata diante de sua informação, mas Joseph se limitou a olhá-la em silêncio. Não mostrou absolutamente nenhuma reação.
Aquilo fez com que Demétria se visse obrigada a repetir suas palavras.
- Alguns soldados vêm para cá subindo pelas colinas - disse -. Pude ver o sol refletindo-se em seus escudos. Não acha que deveria fazer algo a respeito?
Acaso ia transcorrer toda uma eternidade antes que, por fim, chegasse a empreender algum tipo de ação? Demétria considerou aquela possibilidade enquanto esperava que Joseph dissesse algo.
Ele estava olhando para ela da maneira mais inquietante possível, com seu duro e anguloso rosto mostrando claramente a perplexidade que sentia. Demétria também acreditou ver cinismo ali, naqueles olhos cinza que a gelavam com o olhar. Finalmente, chegou à conclusão de que Joseph estava tentando decidir se ela estava dizendo a verdade.
- Eu nunca disse uma mentira em toda minha vida, barão - assegurou-lhe -. Se me seguir, vou mostrar que digo a verdade.
Joseph contemplou àquela bonita jovem que se mantinha tão orgulhosamente erguida na frente dele. Grandes olhos azuis elevavam o olhar para ele para observá-lo em uma imensa confiança. Mechas de cabelos castanho avermelhado flutuavam através de suas bochechas. A bolinha de terra que havia em um lado de seu nariz atraía a atenção de Joseph.
- Por que me faz esta advertência? - perguntou-lhe.
- Por quê? Para que possamos nos afastar deste lugar o mais depressa possível - respondeu Demétria, franzindo o cenho ante a estranha pergunta que Joseph acabava de lhe fazer -. Não quero que haja mais mortes.
Joseph assentiu, satisfeito com sua resposta, e chamou Nicholas com um gesto. Seu irmão ficou imóvel a seu lado, tratando de ouvir o que ele estava dizendo.
- Lady Demétria acaba de perceber que estão nos seguindo - observou Joseph.
Nicholas se mostrou surpreso. Ele não tinha chegado a perceber, em nenhum momento, que estivessem sendo seguidos, e se virou para olhar para Demétria.
- Estão-nos seguindo? - perguntou -. Sabe disso há quanto tempo, Joseph?
- Desde o meio-dia - respondeu Joseph, encolhendo os ombros.
- São saqueadores? - inquiriu Nicholas.
Sua voz se suavizou em uma tentativa de imitar a atitude de despreocupação que tinha visto seu irmão adotar. Por dentro, enfurecia-se com o fato de Joseph ter ficado em silêncio ao longo de toda a tarde. Mas também se sentia bastante perplexo, e se perguntava por que razão Demétria ter-lhes-ia advertido.
- Não são saqueadores, Nicholas.
Um momento de silêncio, que pareceu não ia terminar nunca, prolongou-se entre os dois irmãos antes que uma sombra de compreensão passasse velozmente pelo rosto de Nicholas.
- O rato persegue o lobo? - perguntou.
- Se Deus quiser, desta vez ele está à frente de seus homens - respondeu Joseph.
Nicholas sorriu. Joseph assentiu e, então, continuou falando.
- Eu pensei enfrentá-los um pouco mais perto de casa, em Creek Crossing, mas as colinas abaixo de nós, pode nos proporcionar a mesma vantagem. Diga aos homens que se preparem.
Nicholas deu meia volta e correu através da clareira, gritando a ordem de montar.
Demétria tinha ficado muito atônita para que conseguisse falar. Seu plano de dar o aviso, a fim de que pudesse evitar que houvesse uma batalha, se evaporou assim que a risada de Nicholas chegou até ela. Mas não tinha entendido qual podia ser o significado da breve conversa mantida pelos irmãos. Tinham falado em adivinhações, dizendo bobagens sobre ratos e lobos.
- Então eu estava certa - balbuciou finalmente -. Na realidade, você é igual a Sebastian, não é?
Joseph ignorou seu ataque de fúria.
- Monte em meu cavalo, Demétria - disse-lhe -. Iremos ao encontro de seu irmão juntos.
Demétria estava muito furiosa para que passasse por sua cabeça protestar. Disse a si mesma que Joseph jamais viraria as costas a um combate. Acaso não tinha aprendido aquela lição quando tentou convencê-lo de sair das terras de Sebastian?
Antes que pudesse perceber o que acabava de fazer, Demétria se viu instalada em cima da garupa de Silenus. Sua ira tinha feito com que se esquecesse a respeito de seu medo, e agora nem sequer podia se lembrar por qual dos lados tinha montado no cavalo.
Joseph foi até ela, agarrou as rédeas e começou a conduzir ao animal através da clareira.
Demétria se agarrou à sela de montar para continuar com vida, inclinando os ombros para frente para aquele duro trabalho. Os estribos eram muito baixos para que seus pés pudessem alcançá-los, e seu traseiro batia a cada passo que dava o animal. Lamentavelmente, Demétria sabia que era inexperiente em montar, e agradeceu que Joseph não estivesse olhando para ela.
- Com que nome você chama seu cavalo? - perguntou.
- Cavalo - respondeu Joseph, falando por cima do ombro -. Meu animal é um cavalo e é assim que eu o chamo.
- Tal como eu suspeitava. É tão frio e desumano que nem sequer foi capaz de encontrar um tempo para nomear seu leal cavalo. Eu lhe dei um nome. Silenus. O que lhe parece? - perguntou Demétria.
Joseph se negou a responder àquela pergunta. O fato de Demétria ter o descaramento de colocar um nome em seu cavalo deveria irritá-lo, mas seus pensamentos já estavam concentrados na batalha que os aguardava. Joseph não iria se distrair por uma conversa tão insignificante.
Demétria sorriu para si mesma, sentindo-se muito satisfeita com a maneira com que soube provocá-lo. Então, Ansel apareceu junto dela, trazendo consigo outro cavalo, uma montaria salpicada de cinza que parecia ser muito mais dócil que Silenus. Joseph se virou para Demétria, jogou-lhe as rédeas sem dizer uma palavra e montou no cinzento.
O sorriso congelou bruscamente no rosto de Demétria. Agarrou as rédeas que acabavam de lhe jogar, sentindo-se terrivelmente aflita quando percebeu que Joseph esperava que fosse ela que guiasse o animal. O cavalo deve ter percebido a preocupação que a embargava, porque em seguida começou a afastar-se para o lado. Seus pesados cascos atingiam o chão com uma força suficiente para desmontar Demétria, que lamentou ter feito um bom trabalho na hora de fingir que sabia montar.
Nicholas apareceu do outro lado de Demétria, cavalgando sobre um cavalo castanho. Em seguida obrigou sua montaria a aproximar-se do cavalo de Joseph, efetivamente bloqueando a passagem do arisco animal.
- Ainda estão a certa distância daqui - observou, depois, dirigiu-se a seu irmão mais velho por cima da cabeça de Demétria -. Vamos esperá-los, irmão?
- Não - respondeu Joseph -. Iremos encontrá-los no meio do caminho.
Os soldados já estavam em formação atrás do trio, armando um terrível barulho enquanto o faziam. Demétria pareceu que Joseph esperava até que o ruído teve diminuído um pouco antes de dar o sinal.
- Ficarei aqui até que retorne - disse então a Joseph.
Sua voz tinha-se mostrado cheia de desespero. Joseph se virou para olhá-la, sacudiu a cabeça e virou novamente para o vale.
- Eu ficarei aqui - anunciou Demétria.
- Não o fará - replicou Joseph, sem sequer se incomodar em lhe dirigir o olhar por um instante, enquanto lançava aquela áspera negativa.
- Você pode me amarrar em uma árvore - sugeriu Demétria.
- Ah, lady Demétria, mas acredito que não vai querer negar a Sebastian a visão de seu lindo rosto, não é? - Nicholas fez aquela pergunta com um sorriso no seu -. Prometo-lhe que será a última coisa que ele verá antes de morrer - acrescentou o irmão mais novo de Joseph.
- Você dois vão se deliciar com esta batalha, não é verdade? - perguntou Demétria. Estava tão atônita que sua voz tremia.
- Não resta dúvida de que eu desfrutarei com ela - respondeu Nicholas, encolhendo os ombros.
- Parece-me que está tão louco como seu irmão, Nicholas - disse Demétria.
- Você sabe que temos uma boa razão para querer ver seu irmão morto - anunciou Nicholas, e o sorriso foi abandonando lentamente seu rosto -. Da mesma maneira em que você deve querer nos ver mortos - acrescentou, zombando dela com um desdém deliberado em sua voz.
Demétria se apressou a olhar para Joseph para ver de que maneira ele reagia à observação que seu irmão acabava de fazer, mas o barão não parecia estar prestando nenhuma atenção na conversa deles. Voltou-se novamente para o Nicholas.
- Entendo por que querem matar Sebastian. E o que não quero é que você ou seu irmão morram neste confronto, Nicholas - acrescentou -. Por que pensa que desejo tal coisa?
Nicholas franziu o cenho, visivelmente confuso.
- Por que tipo de idiota você me toma, lady Demétria? - perguntou então -. Agora tenta me dizer que não vai tomar partido de Sebastian, não é? Sebastian é seu irmão.
- Não tomarei partido de ninguém - arguiu Demétria -. Não quero que ninguém morra.
- Oh, agora vejo qual é seu plano - replicou Nicholas, que estava quase gritando -. Vai esperar para ver quem será o ganhador e então vai escolher o bando ao qual vai se unir. Muito ardiloso de sua parte, realmente.
- Acredite no que quiser - respondeu Demétria -. Você se parece muito com seu irmão - acrescentou, sacudindo a cabeça.
Quando Nicholas sorriu, Demétria percebeu que se havia ele estava bem satisfeito com seu comentário.
- Não estou fazendo nenhum elogio, Nicholas - esclareceu -. É justamente o contrário. Está demonstrando que é tão teimoso e implacável como Joseph. Parece que desfruta matar tanto quanto ele - concluiu.
Por dentro Demétria não podia evitar se sentir horrorizada ante a maneira com que tinha tentado manipular Nicholas, até conseguir que ele perdesse o controle, mas, e que Deus a ajudasse, não parecia ser capaz de se conter.
- Pode me olhar nos olhos e honestamente dizer que não me odeia? - perguntou Nicholas. Estava tão furioso que marcava claramente sua veia no pescoço. Demétria pensou que queria atingi-la.
- Não odeio você, Nicholas. Admito que eu gostaria de odiá-lo, mas não odeio.
- E por que não me odeia? - perguntou Nicholas.
- Porque você ama sua irmã.
Nicholas se dispôs a dizer a Demétria que acreditava que ela fosse a mulher mais tola que ele já havia encontrado, quando Joseph atraiu sua atenção. O irmão mais novo se esqueceu imediatamente de Demétria e deu meia volta para levantar sua espada.
Joseph finalmente deu o sinal. De repente Demétria se sentiu tão aterrada que nem sequer pôde se lembrar de uma de suas preces.
Ia ser um combate de morte? Demétria já sabia o suficiente sobre a teimosia de Joseph para ter a certeza de que não se importava com quem estivesse contra ele.
Ela tentou, mas não conseguiu contar o número de soldados que estavam subindo pelas colinas. Cobriam o chão como gafanhotos.
Voltavam a superar o número de homens de Joseph?
Demétria pensou que aquilo seria uma autêntica carnificina, e todo porque Joseph ia lançar o desafio de honra e Sebastian não. Era algo muito fácil de entender, mas que sempre estaria além da compreensão de alguém como o barão de Wexton. Era evidente que Joseph tinha esquecido como tinha sido enganado por Sebastian para que acreditasse que este faria honra à trégua temporária que tinham acordado entre os dois. Foi assim que Sebastian havia capturado Joseph, mediante um simples engano.
Demétria conhecia Sebastian muito melhor que Joseph. Se ele sentisse que o aroma da vitória estava de seu lado, então seu irmão lutaria como um animal.
Demétria disse a si mesma que não lhe importava quem terminasse reivindicando a vitória. Se eles desejavam se matar uns aos outros, então que fosse assim. Seriam suas vontades que iriam prevalecer, não a dela.
- Eu não vou me importar - sussurrou uma e outra vez, até que suas palavras se converteram em um cântico desesperado.
Mas, por mais que ela pronunciasse aquelas palavras, Demétria não podia fazer com que elas fossem verdadeiras.





FELIZ NATAAALLLLLL

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