Quando no dia
seguinte Adam retornou para casa, retirou‐se a seu estúdio com um copo
de brandy e a mente turvada. A festa na casa de Lady Chester não estava programada
para terminar até dentro de alguns dias, mas inventou uma história a respeito
de assuntos urgentes que tinha que tratar com seus advogados na cidade e foi embora
antes. Estava bastante seguro de poder comportar‐se como se nada tivesse acontecido,
mas não estava tão seguro de que Demetria poderia. Era inocente?
Ao menos tinha sido?
E não estava acostumada a esse tipo de fingimento. E em consideração a
reputação dela, tudo deveria parecer escrupulosamente normal.
Lamentava não ter
tido oportunidade de explicar as razões de sua partida prematura. Não pensava
que ela pudesse sentir‐se ultrajada; depois de tudo, disse a ela que precisava de tempo
para pensar. Também disse que iriam se casar; certamente não poriam em dúvida
suas intenções por tomar poucos dias para refletir a respeito da inesperada
situação.
Não lhe escapava a
enormidade de seus atos. Tinha seduzido uma jovem dama solteira. Uma que
gostava de verdade e que respeitava. Uma que sua família adorava.
Para um homem que não
desejava voltar a se casar, era evidente que não esteve pensando com o cérebro.
Gemendo, afundou‐se
em uma poltrona e recordou as regras que ele e seus amigos tinham estabelecido
anos atrás quando deixaram Oxford para inundar‐se nos prazeres de Londres e
da alta sociedade. Só eram dois. Não envolver‐se com damas casadas, a não
ser que fosse extremamente óbvio que ao marido não importava. E sobre todas as
coisas, nada de virgem. Nunca, nunca, nunca seduzir uma virgem.
Nunca.
Tomou outro gole da
bebida. Bom Deus. Necessitava‐se uma mulher, havia dúzias que teriam sido mais convenientes. A
adorável e jovem condessa viúva esteve frequentemente o agradando. Katherine
teria sido a amante perfeita e não haveria necessidade de casar com ela.
Matrimônio.
Havia tentado uma
vez, quando possuía um coração romântico e estrelas nos olhos e isso o
destruiu. Era realmente gracioso. No casamento, as leis da Inglaterra davam
absoluta autoridade ao marido, mas nunca se sentiu com menos controle de sua
vida do que quando esteve casado.
Camille enterrou seu
coração na terra e o converteu em um homem colérico e desalmado. Alegrava‐se
de que tivesse morrido. Alegrava‐se. Em que tipo de homem o convertia
isso? Quando o mordomo o encontrou em seu estúdio e vacilando informou que
houve um acidente, e que sua esposa estava morta, Adam nem sequer se sentiu aliviado.
O alívio ao menos teria sido uma emoção inocente. Não, o primeiro pensamento do
Adam foi...
Graças a Deus.
E sem importar quanto
desprezível pudesse ter sido Camille, sem importar quantas vezes desejou não
ter se casado com ela, não deveria ter sentido algo mais caridoso ante sua
morte? Ou ao menos, algo que não fosse tão inteiramente pouco caridoso?
E agora... E agora...
Bom, a verdade era que não desejava casar. Era o que tinha decidido quando
trouxeram o corpo morto de Camille para casa e foi o que voltou a ratificar
quando esteve ante sua sepultura. Teve uma esposa. Não desejava outra. Ao menos
não em um futuro próximo.
Mas apesar dos
melhores esforços de Camille, aparentemente não tinha matado tudo o que era bom
e correto nele, porque aqui estava planejando casar com Demetria.
Sabia que era uma boa
mulher e sabia que nunca o trairia, mas, Deus querido, sim podia ser ela
teimosa. Adam se lembrou dela na loja de livros, atacando o proprietário com a
bolsa. Agora se converteria em sua esposa. Corresponderia a ele mantê‐la
separada dos problemas.
Amaldiçoou e tomou
outro gole. Não desejava esse tipo de responsabilidade.
Era muito. Só desejava
descansar. Isso era pedir muito? Um descanso de ter que pensar em alguém mais
que não fosse ele mesmo. Um descanso de ter que preocupar‐se,
de ter que proteger seu coração de outro golpe.
Era isso ser muito
egoísta? Provavelmente. Mas depois de Camille, merecia um pouco de egoísmo.
Certamente, era necessário.
Mas por outro lado, o
matrimônio poderia trazer alguns benefícios oportunos.
Apenas pensar em Demetria,
começou a lhe fazer cócegas pela pele. Na cama, debaixo dele. E logo quando
começou a imaginar o que poderia trazer o futuro...
Demetria. De volta na
cama. E outra vez na cama. E outra vez na cama. E outra vez...
O que estava pensado?
Demetria.
Casamento. Com a Demetria.
E raciocinou,
terminou o resto da bebida, realmente gostava mais que quase todo o resto das
pessoas. Era certamente mais interessante e mais amena para conversar que
qualquer das outras damas da alta sociedade. Dever‐se‐ia
ter uma esposa, provavelmente poderia ser Demetria. Era uma maldita melhor
visão que qualquer outra.
Ocorreu que não
estava enfocando este assunto de uma maneira terrivelmente romântica.
Necessitaria mais tempo para pensar. Talvez devesse ir à cama com a esperança
de que sua mente estivesse mais clara pela manhã. Com um suspiro, deixou o copo
na mesa e ficou de pé, logo o pensou melhor e voltou a levantar o copo. Outro
brandy poderia ser
justo o que necessitava.
À manhã seguinte, a
cabeça de Adam pulsava e certamente sua mente não estava mais disposta a lutar
com o assunto que tinha entre mãos do que esteve a noite anterior. É obvio,
ainda planejava casar‐se com Demetria... Um cavalheiro não comprometia uma dama de bom
berço sem pagar as consequências.
Mas odiava o
sentimento de estar sendo apressado. Não importava que este enredo fosse
inteiramente culpa dela; precisava sentir que solucionou todas as coisas a sua
própria satisfação.
Foi por isso que,
quando desceu para tomar o café da manhã, a carta de seu amigo Lorde Harry
Winthrop foi uma distração muito bem‐vinda. Harry estava considerando
comprar uma propriedade em Kent. Gostaria que Adam fosse dar uma olhada para
lhe oferecer sua opinião.
Adam partiu em menos
de uma hora. Era só por poucos dias. Encarregar‐se‐ia de
Demetria na volta.
******
Demetria não se
importou muito de Adam ter abandonado a festa antes do tempo. Se pudesse ela
teria feito o mesmo. Além disso, podia pensar mais claramente na ausência dele
e embora realmente não houvesse muito que debater. Comportou‐se de
forma contrária a cada principio pelos quais foi educada, e se não se casasse com
Adam, estaria desonrada para sempre. Ao menos era um pequeno alívio sentir‐se parcialmente
com o controle de suas emoções.
Alguns dias depois
quando retornou a Londres, Demetria tinha plena esperança de que Adam desse a
cara imediatamente. Realmente não tinha intenção de forçá‐lo a
casar, mas um cavalheiro era um cavalheiro e uma dama era uma dama, e quando ambos
se juntavam em geral o que seguia era um matrimônio. Ele sabia. E havia dito que
se casaria com ela.
E certamente queria
fazer isso. Havia se sentida profundamente comovida pela intimidade
compartilhada... Ele devia ter sentido algo também. O sentimento não podia ter
sido unilateral, ao menos não completamente.
Quando perguntou à
Lady Rudland onde ele estava, conseguiu manter um tom casual, mas ela respondeu
que não tinha nem a menor ideia, só sabia que tinha deixado a cidade. Demetria
sentiu o aperto no peito, e murmurou: "OH" ou "Já vejo" ou algo
assim, antes de subir correndo as escadas para meter‐se
no quarto, onde chorou tão silenciosamente como pôde.
Mas logo apareceu seu
lado otimista, e decidiu que talvez tenha sido chamado para ocupar‐se
de uma emergência nos assuntos da fazenda. Havia um longo caminho até
Northumberland. Certamente estaria fora ao menos por uma semana.
Uma semana chegou e
passou, e no coração de Demetria cresceu a frustração da mão do desespero. Não
podia perguntar pelo paradeiro dele. Ninguém da família
Bevelstoke percebeu
que tinha uma estreita relação, Demetria sempre foi considerada amiga de Selena,
não de Adam. E se perguntasse repetidamente onde ele estava, seria suspeito. E
não era necessário dizer que Demetria não tinha uma razão lógica para ir pessoalmente
à morada do Adam perguntar por ele. Isso arruinaria completamente sua
reputação. Ao menos agora sua desonra ainda era um assunto particular.
Entretanto quando
passou outra semana, decidiu que já não podia suportar ficar em Londres por
mais tempo. Inventou uma enfermidade para o pai e disse aos
Bevelstoke que devia
retornar a Cumberland imediatamente para cuidar dele. Todos estavam
terrivelmente preocupados, e Demetria se sentiu um tanto culpada quando Lady
Rudland insistiu que viajasse na carruagem com dois criados e uma donzela.
Mas tinha que fazê‐lo.
Não podia permanecer em Londres nem um minuto mais. Era muito doloroso.
Poucos dias depois,
estava em casa. Seu pai estava perplexo. Não sabia muito a respeito de mulheres
jovens, mas lhe asseguraram que todas queriam temporadas em Londres. Mas ele
não se importava; certamente Demetria nunca foi um incomodo. A metade do tempo
nem sequer se dava conta de que ela estava ali. Assim que lhe afagou a mão e
retornou a seus apreciados manuscritos.
Quanto a Demetria,
quase se convenceu de que estava contente de estar de volta ao lar. Tinha
sentido saudades dos prados verdes e do ar puro dos Lagos, o sereno transportar
do povoado, o costume de levantar e deitar cedo. Bom, talvez isso não... Sem
compromissos e sem nada que fazer dormia até o meio‐dia
e ficava acordada até tarde na noite, rabiscando furiosamente em seu diário.
Só dois dias depois
da chegada de Demetria, chegou uma carta de Selena.
Demetria sorriu
enquanto a abria... Estava segura de que a impaciência de Selena a levou a lhe
enviar uma missiva imediatamente. Antes de lê‐la, os olhos de Demetria voaram
sobre a carta procurando o nome de Adam, mas não o mencionava. Sem estar segura
de se sentia desiludida ou aliviada, voltou para o princípio e começou a ler. Selena
escrevia que Londres era aborrecido sem ela. Não tinha se dado conta de quanto
desfrutava das secas observações de Demetria quanto à sociedade até que já não
as teve. Quando voltava para casa? Seu pai estava curado? Se não fosse assim, estava
melhorando ao menos? (sublinhado três vezes, em um estilo típico da Selena).
Demetria leu essas
frases sentindo uma pontada na consciência. Seu pai estava no andar de baixo,
no estúdio, examinando seus manuscritos sem nem sequer o menor dos resfriados.
Com um suspiro, Demetria
empurrou sua consciência a um lado e dobrou a carta de Selena, deixando‐a na
gaveta da escrivaninha. Disse que uma mentira não era sempre um pecado.
Certamente havia desculpas para algo que teve que fazer para escapar de
Londres. Onde tudo o que podia fazer era permanecer sentada, esperando com
desejo que Adam se decidisse a passar por ali.
É obvio, que tudo o
que fazia no campo era sentar‐se e pensar nele. Uma noite se obrigou a contar quantas vezes
aparecia seu nome no diário, e para seu absoluto desgosto, o total era de
trinta e sete.
Evidentemente a
viagem ao campo não estava clareando a mente.
Logo, depois de uma
semana e meia, chegou Selena em uma visita surpresa.
—Livvy, o que está
fazendo aqui? —Perguntou Demetria enquanto se apressava a entrar na sala onde a
esperava sua amiga. — Há alguém ferido? Aconteceu algo de errado?
—Não aconteceu nada —
respondeu Selena animadamente. — Só vim buscá‐la. É necessária
desesperadamente em Londres.
O coração de Demetria
começou a pulsar erraticamente.
—Quem?
—Eu! —Selena
entrelaçou o braço com o dela e a levou para a sala de estar.
Santo Deus eu sou um
completo desastre sem você.
—Sua mãe te deixou
abandonar a cidade no meio da temporada? Não posso acreditar.
—Virtualmente me
empurrou pela porta. Desde que partiu me comportei horrivelmente.
Demetria começou a
rir apesar de si mesma.
—Certamente não deve
ter sido tão mau.
—Não estou brincando.
Mamãe sempre disse que é uma boa influência, mas acredito que não se deu conta
de quão certo era até que foi. —Selena lhe dedicou um sorriso culpado. — Parece
que não sou capaz de conter a língua.
—Nunca foi. —Demetria
sorriu e liderou o caminho para o sofá. — Você gostaria de tomar chá?
Selena assentiu.
—Não entendo por que
me meto em tantos problemas. A maioria das coisas que digo não é nem a metade
mal do que você diz. É a língua mais malvada de
Londres.
Demetria puxou o
cordão para chamar uma criada.
—Não sou.
—OH, sim, é. É a
pior. E sei que sabe. E nunca se mete em problemas por nada disso. É
terrivelmente injusto.
—Sim, bom, talvez não
diga as coisas tão escandalosamente como você ‐ respondeu Demetria,
reprimindo um sorriso.
—Tem razão — suspirou
Selena. — Sei que tem razão, mas ainda assim é imensamente incomodo. Você
verdadeiramente tem um senso de humor malicioso.
—OH, vamos, não sou
tão má.
Selena deixou escapar
uma curta risada.
—OH, sim é. Adam
também sempre fala, assim não sou só eu.
Demetria engoliu com
força o nó que estava formando rapidamente na garganta ante a menção de seu
nome.
—Então, voltou para a
cidade? — Perguntou, Oh tão casualmente.
—Não. Faz séculos que
não o vejo. Está em algum lugar de Kent com os amigos.
Kent? As pessoas não
podiam viajar muito mais longe de Cumberland e ainda permanecer na Inglaterra,
pensou Demetria melancolicamente.
—Está ausente há
bastante tempo.
—Sim, assim é não é
verdade? Mas, bom, está com Lorde Harry Winthrop, e
Harry sempre foi algo
mais que um pouquinho selvagem, se entende o que quero dizer.
Demetria temia
entender.
—Estou segura que se
deixaram levar pelo vinho, as mulheres e coisas desse tipo — continuou Selena.
— Certamente nenhuma dama decorosa vai frequentar.
Rapidamente o nó
reapareceu na garganta de Demetria. O pensamento de
Adam com outra mulher
era extremamente doloroso, especialmente agora que sabia que tão perto podiam
estar um homem e uma mulher. Inventou todo tipo de razões para sua ausência...
Seus dias estavam cheios de raciocínios e desculpas em sua defesa. Era, pensou
amargamente, seu único passatempo.
Mas nunca pensou que
estava com outra mulher. Ele sabia quão doloroso era ser traído. Como podia
fazer o mesmo a ela?
Não a amava. A
verdade a golpeou e a esbofeteou, enterrando as pequenas e sujas unhas justo no
coração.
Não a amava, e ela
ainda o amava tanto que doía. Era algo físico. Podia sentir, apertando e
cravando, e graças ao céu, Selena estava examinando o vaso grego premiado de
seu pai, porque não pensava que pudesse ocultar a agonia de seu rosto.
Com algum tipo de
comentário resmungado que não foi dito com a intenção de ser entendido, Demetria
ficou de pé e rapidamente cruzou o recinto até a janela, pretendendo olhar o
horizonte.
—Bom, deve estar
divertindo‐se — conseguiu dizer.
—Adam? —Escutou a
suas costas. — Certamente, ou não ficaria tanto tempo.
Mama está
desesperada, ou estaria se não estivesse tão ocupada se desesperando por mim.
Agora, incomodaria que ficasse aqui contigo? Haverbreaks é muito grande quando
não há ninguém em casa e está cheio de correntes de ar.
—É obvio que não me
incomoda. — Demetria permaneceu na janela poucos instantes mais, até que pensou
que era capaz de olhar Selena sem começar a chorar.
Ultimamente estava
muito emotiva.
— Será um grande
prazer para mim. — Aqui é um pouco solitário com apenas meu pai para me fazer
companhia.
—OH, sim. Como vai?
Melhorando, espero.
—Meu pai? —Demetria
se sentiu agradecida pela interrupção provocada pela donzela que veio em
resposta sua demanda. Antes de dar a volta para Selena, ordenou o chá. — Ehm,
está muito melhor.
—Deveria procurá‐lo
para desejar melhoras. Além disso, mamãe me pediu que mandasse lembranças.
—OH, não, não deveria
fazer isso — disse Demetria apressadamente. — Não gosta que o recorde sua
enfermidade. É muito orgulhoso, já sabe.
Selena, que nunca foi
do tipo que medisse as palavras, disse:
—Isso é muito
estranho.
—Sim, bom, é uma
doença masculina — improvisou Demetria.
Tinha ouvido tantas
vezes a respeito das doenças femininas; certamente os homens deviam ter algum
tipo de padecimento que fosse exclusivamente deles. E se não fosse assim,
estava segura que Selena não saberia.
Mas Demetria não
tinha contado com a insaciável curiosidade da amiga.
—OH, sério? —
Suspirou inclinando‐se para frente. — O que é exatamente uma doença masculina?
—Não deveria falar
disso — disse Demetria rapidamente, dando a seu pai uma silenciosa desculpa. —
Envergonharia enormemente.
—Mas...
—E sua mãe se
desgostaria muito comigo. Realmente não é um tema adequado para ouvidos
inocentes.
—Ouvidos inocentes? —
Bufou Selena. — Como se seus ouvidos fossem menos inocentes que meus.
Podia ser que seus
ouvidos fossem, mas o resto dela certamente não o era, pensou Demetria
sarcasticamente.
—Não falemos mais
desse assunto — disse firmemente. — Deixarei a sua magnífica imaginação.
Selena resmungou um
pouco, mas finalmente suspirou e perguntou:
—Quando voltará para
casa?
—Estou em casa —
recordou Demetria.
—Sim, sim, é obvio.
Esta é sua casa oficial, sei, mas te asseguro que toda a família Bevelstoke
sente saudades, então quando voltará para Londres?
Demetria apanhou o
lábio inferior entre os dentes. Obviamente nem toda a família Bevelstoke sentia
saudades, ou certo membro dela não teria permanecido tanto tempo em Kent. Mas
ainda assim, retornar a Londres era a única maneira que poderia lutar por sua
felicidade, e ficar sentada aqui em Cumberland, chorando com seu diário e
olhando mal humoradamente pela janela, a fazia sentir como uma imbecil exímia.
—Sim, sou uma imbecil
— murmurou para si mesma, — ao menos deverei me converter em uma imbecil
substancial.
—O que foi o que
disse?
—Disse que sim
retornarei a Londres — respondeu Demetria com grande decisão. — Papai está bem
o suficientemente para se arrumar sem mim.
—Esplêndido. Quando
partimos?
—OH, penso que em
dois ou três dias. —Demetria não era tão valente para não desejar pospor o
inevitável por poucos dias. — Preciso empacotar minhas coisas, e certamente
está cansada pela viagem através do país.
—Estou um pouco
cansada. Talvez devessem ficar uma semana. Assumindo que a estas alturas não
esteja cansada da vida do campo. Não me importaria ter um breve descanso da
congestão de Londres.
—OH, não, isso está
bem — assegurou Demetria. Adam podia esperar.
Certamente não ia
casar com ninguém no ínterim, e ela podia usar esse tempo para reforçar sua
coragem.
—Perfeito. Então
vamos cavalgar amanhã pela tarde? Morro por um bom galope.
—Isso soa ideal. —
Chegaram o chá, e Demetria se ocupou de servir o fumegante líquido. — Acredito
que uma semana é perfeita.
*****
Uma semana depois, Demetria
estava convencida além de toda dúvida de que não podia voltar para Londres.
Jamais. Seu período, que era tão regular que certamente era mensal, não tinha
aparecido. Deveria ter sangrado alguns dias antes da chegada de Selena. Os
primeiros dias venceram as preocupações, dizendo a si mesma que era só porque
estava deprimida. Logo com a excitação da chegada de Selena, esqueceu‐se
do assunto. Mas agora tinha mais de uma semana de atraso. E esvaziava seu
estômago cada manhã. Demetria tinha levado uma vida protegida, mas era uma garota
do campo, e sabia o que isso significava.
Deus querido, um
bebê. O que ia fazer? Deveria dizer ao Adam; não havia como evitar. Embora não
queria usar uma vida inocente para forçar um matrimônio que obviamente não
estava destinado a acontecer, como podia negar ao filho seu direito de
nascimento? Mas o pensamento de viajar a Londres era pura agonia. Já estava
doente de persegui‐lo e esperá‐lo, de ter esperanças e rezar para que talvez algum dia ele
chegasse a amá‐la. Por uma maldita vez, bem que ele poderia ir a ela.
E ele o faria, não é?
Era um cavalheiro. Poderia não amá‐la, mas certamente ela não
poderia tê‐lo julgado tão completamente mal. Ele não evitaria sua responsabilidade.
Demetria sorriu
fracamente para si mesma. Assim estavam as coisas. Ela era um dever. Teria...
Depois de tantos anos de sonhar, na verdade conseguiria ser Lady Adam, mas não
seria mais que uma obrigação. Colocou a mão no estômago. Este deveria ser um
momento de alegria, mas, entretanto, tudo o que desejava era chorar.
Soou um golpe na
porta de seu dormitório. Demetria levantou a vista sobressaltada, mas não
pronunciou uma palavra.
—Demetria! —A voz de Selena
era insistente. — Abre a porta. Posso ouvir que está chorando.
Demetria tomou um
profundo fôlego e caminhou para a porta. Não seria simples ocultar o segredo de
Selena, mas tinha que tentar. Selena era extremamente leal e nunca trairia a
confiança de Demetria, mas não obstante, Adam era seu irmão. Não podia prever o
que Selena faria. Demetria não se surpreenderia que ela mesma pusesse uma
pistola nas costas e o fizesse partir para o norte.
Demetria deu uma
rápida olhada no espelho antes de dirigir‐se à porta. Podia enxugar as
lágrimas, mas teria que culpar o jardim do verão pelos olhos avermelhados.
Inspirou
profundamente várias vezes, colocou o sorriso mais alegre que pudesse em seus
lábios e foi abrir a porta.
Não enganou Selena
nem por um minuto.
—Santo céu, Demetria
— disse, apressando‐se a rodeá‐la com os braços. — O que aconteceu?
—Estou bem —
assegurou Demetria. — Meus olhos sempre ardem nesta época do ano.
Selena se afastou,
olhou‐a por um momento, logo fechou a porta com o pé.
—Mas está muito
pálida.
A Demetria começou a
revolver‐se o estômago e engoliu convulsivamente.
—Penso que peguei
algum tipo de... —Ondeou a mão no ar, com a esperança de que essa ação
terminasse a oração por ela. — Talvez devesse me sentar.
—Não pode ter sido
nada que tenha comido — disse Selena ajudando‐a a alcançar a cama. — Ontem
mal tocou a comida, e em qualquer caso, eu comi o mesmo que você e mais.
—Inclinou Demetria para frente para acomodar os travesseiros. — E me sinto tão
bem como sempre.
—Talvez tenha me
resfriado — murmurou Demetria. — Possivelmente deveria retornar a Londres sem
mim. Não desejo que também caia doente.
—Tolices. Não posso
deixá‐la sozinha estando assim.
—Não estou sozinha.
Estou com meu pai.
Selena a olhou.
—Sabe, não tenho
intenção de desmerecer seu pai, mas penso que com muita dificuldade saberá o
que fazer com uma pessoa doente. A metade do tempo, nem sequer estou segura de
que recorde que estamos aqui.
Demetria fechou os
olhos e se afundou entre os travesseiros. Selena tinha razão, é obvio. Adorava
o pai, mas sinceramente, quando se tratava de assuntos que envolviam uma
interação com outro ser humano, era um caso completamente perdido.
Selena subiu na beira
da cama, afundando o colchão com seu peso. Demetria tratou de ignorá‐la,
tentou fingir que não notava, apesar de ter os olhos fechados, que
Selena a estava
olhando fixamente, simplesmente esperando que reconhecesse sua presença.
—Demetria, por favor,
me diga o que está acontecendo — disse Selena brandamente. — É seu pai?
Demetria negou com a
cabeça, mas justo, nesse momento, Selena mudou de posição. O colchão ondulou
debaixo delas, de forma parecida com o movimento de um bote, e embora Demetria
nunca tivesse padecido de enjoos nenhuma única vez em sua vida, seu estômago
começou a revolver‐se, e subitamente se tornou imperativo...
Demetria se levantou
de um salto, jogando Selena ao chão. Conseguiu chegar bem a tempo a bacia que
havia no recinto.
—Deus seja louvado —
disse Selena, mantendo uma respeitosa conservadora distância. — Quanto tempo
faz que você está assim?
Demetria evitou
responder. Mas seu estômago fez arcadas em resposta.
Selena deu um passo
atrás.
—Er, eu posso ajudar
em algo?
Demetria sacudiu a
cabeça, agradecida de que seu cabelo estivesse preso para trás.
Selena a observou
durante alguns instantes, logo foi para a tigela e umedeceu um pano.
—Aqui tem — disse,
sustentando‐o diante dela, com o braço completamente estirado.
Demetria tomou
agradecida.
—Obrigada —
sussurrou, limpando o rosto.
—Não acredito que
isto seja um resfriado — disse Selena.
Demetria sacudiu a
cabeça.
—Estou bastante
segura de que o pescado de ontem à noite estava perfeitamente bem e não posso
imaginar...
Demetria não precisou
ver o rosto de Selena para interpretar seu ofego. Sabia.
Podia ser que ainda
não acreditasse de tudo, mas sabia.
—Demetria?
Demetria permaneceu
imóvel em seu lugar, inclinada pateticamente sobre a bacia.
—Está... Por acaso
você...?
Demetria engoliu
convulsivamente. E assentiu.
—OH, Senhor. OH,
Senhor. OH, OH, OH, OH, OH...
Era, talvez, a
primeira vez em sua vida que Demetria via Selena ficar absolutamente sem
palavras. Demetria terminou de limpar a boca, e logo, com o estômago ainda um
pouco revolto, finalmente se separou da bacia e se sentou um pouco mais reta.
Selena ainda a estava
olhando fixamente como se tivesse visto um fantasma.
—Como? — Perguntou
finalmente.
—Como de costume —
replicou Demetria. — Garanto que não há motivo para informar à Igreja.
—Sinto muito. Sinto
muito. Sinto muito — disse Selena apressadamente. Não tinha intenção de
transtorná‐la. É só que... Bom... Deve saber... Bom... É só que isto é uma
tremenda surpresa.
—Também me
surpreendeu — respondeu Demetria com uma voz certamente apagada.
—Não pode ter sido tanta
surpresa — disse Selena sem pensar. — Quero dizer, se fez... Esteve... —Deixou
que as palavras se desvanecessem, dando‐se conta de que falou de
mais.
—Ainda assim foi uma
surpresa, Selena.
Selena ficou calada
por um momento enquanto absorvia o impacto.
—Demetria, eu devo
perguntar...
—Não o faça! —
Advertiu Demetria. — Por favor, não me pergunte com quem.
—Foi Mikey?
—Não! —Replicou
violentamente. E logo murmurou. — Por Deus.
—Então, quem?
—Não posso dizer —
disse Demetria, quebrando a voz. — Foi... Foi alguém totalmente inadequado...
Não... Não sei no que estava pensando, mas, por favor, não volte a me
perguntar. Não quero falar disso.
—Está bem — disse Selena,
evidentemente dando‐se conta que seria imprudente pressioná‐la
mais. — Não voltarei a perguntar, prometo. Mas, o que vamos fazer?
Demetria não pôde
evitar sentir‐se um pouco animada pelo uso da palavra vamos.
—Digo Demetria, está
segura de que está grávida? — Perguntou Selena de súbito, com os olhos
brilhando de esperança. — Poderia ser só um atraso. A minha atrasa todo o
tempo.
Demetria deu uma
significativa olhada a bacia. E logo sacudiu a cabeça e disse:
—Eu nunca atraso.
Jamais.
—Terá que ir a algum
lugar — disse Selena. — O escândalo será espetacular.
Demetria assentiu.
Planejava enviar uma carta a Adam, mas isso não podia dizer a Selena.
—O melhor que podemos
fazer é tirá‐la do país. Ao continente, talvez. Que tal está seu francês?
—É triste.
Selena suspirou
afligida.
—Nunca foi muito boa
com os idiomas.
—Nem você tampouco —
disse Demetria.
Selena decidiu não se
dignar a responder isso, em troca sugeriu:
—Por que não vai a
Escócia?
—Com meus avôs?
—Sim. Não me diga que
a rejeitarão devido a sua condição. Sempre está dizendo quão bons são.
Escócia. Sim, essa
era a solução perfeita. Notificaria Adam e ele poderia encontrá‐la
ali. Poderiam casar‐se sem publicar as admoestações e então, tudo ficaria ao menos
bem.
—Eu a acompanharei —
disse Selena decididamente. — Ficarei todo o tempo que puder.
—Mas, o que dirá a
sua mãe?
—OH, direi que alguém
adoeceu. Funcionou antes, não é assim? — Selena dedicou a Demetria um olhar
penetrante, um que claramente dizia que sabia que inventou a história a
respeito de seu pai.
—Isso é uma
quantidade incrível de pessoas doente.
Selena deu um encolher
de ombros.
—É uma epidemia. Mas
raciocine para que ela permaneça em Londres. Mas, o que dirá a seu pai?
—OH, qualquer coisa —
respondeu Demetria tirando importância. — Não dá muita atenção ao que faço.
—Bom, por uma vez
isso é uma vantagem. Partiremos hoje.
—Hoje? —Disse Demetria
como um eco.
—Depois de tudo, já
empacotamos, e não há tempo a perder.
Demetria olhou seu
estômago que ainda estava plano.
—Não, creio que não.
13
DE AGOSTO DE 1819
Selena
e eu chegamos hoje a Edimburgo. A vovó e o vovô ficaram bastante surpresos ao me
ver. Ficaram ainda mais surpresos quando disse o motivo de minha visita.
Estavam muito silenciosos e sérios, mas nem por um momento me fizeram ver que
estavam decepcionados ou envergonhados de mim. Sempre os amarei por isso.
Livvy
mandou uma nota a seus pais dizendo que tinha me acompanhado a
Escócia.
Cada manhã me pergunta se veio o período. Como eu já havia previsto, não aconteceu.
Me encontro olhando o ventre constantemente. Não sei o que espero ver.
Certamente
não irá crescer da noite para o dia, e certamente não tão precocemente.
Devo
dizer ao Adam, sei que devo fazer isso, mas parece que não posso escapar de Selena
e não posso escrever a carta na presença dela. Por muito que a adore, terei que
espantá‐la.
Certamente não posso tê‐la
aqui quando Adam chegar, que certamente virá uma vez que receba minha nota,
assumindo, é obvio que alguma vez seja capaz de enviar.
OH,
céus, ai vem ela.