—Mikey estará aqui em
seguida. —Selena entrou majestosamente no salão rosado com aquela declaração,
oferecendo a Demetria um de seus sorrisos mais alegres.
Demetria elevou a
vista de seu livro, uma manuseada e decididamente nada glamorosa copia de Morte
d'Arthur que pegou emprestada da biblioteca de Lorde Rudland.
—Sério? — murmurou,
mesmo sabendo muito bem que era esperado que Mikey chegasse àquela tarde.
—Sério? — imitou Selena.
—Isso é tudo o que pode dizer? Perdão, mas tinha a impressão de que estava
apaixonada pelo garoto, oh, me desculpe, agora é um homem, não é assim?
Demetria voltou para
sua leitura.
—Disse que não estava
apaixonada por ele.
—Bom, pois deveria
estar — replicou Selena. — E estaria, se te dignasse há passar algum tempo com
ele.
Os olhos de Demetria,
que estavam se movendo com determinação pelas palavras da página, detiveram‐se
de repente. Elevou a vista.
—Perdão, mas, não
está em Oxford?
—Bom, sim — disse Selena,
tirando importância do comentário com um movimento da mão como se as sessenta
milhas de distância não tivessem transcendência, — mas esteve aqui na semana
passada, e quase não ficou com ele.
—Isso não é verdade —
replicou Demetria. — Demos um passeio a cavalo pelo Hyde Park, fomos ao Gunter
tomar sorvete, e inclusive tomamos um barco pelo Serpentine aquele dia em que
fez tanto calor.
Selena se deixou cair
em uma cadeira próxima, cruzando os braços.
—Não é suficiente.
—Ficou louca — disse Demetria.
Agitou ligeiramente a cabeça e a virou de volta a seu livro.
—Sei que vai querer Mikey.
Só precisa passar um pouco de tempo na companhia dele.
Demetria apertou os
lábios e manteve os olhos firmemente sobre o livro. Aquela não era uma conversa
que pudesse chegar a nada sensato.
—Estará aqui só
durante dois dias — meditou Selena. — Vamos ter que trabalhar rápido.
Demetria passou a
página de repente e disse:
—Faz o que quiser Selena,
mas não tomarei parte em suas intrigas. —Então elevou a vista com alarme. —
Não, mudarei de ideia. Não faça o que quiser. —e deixasse as coisas em suas
mãos, terminarei drogada e de caminho a Gretna Green antes de me dar conta.
—Uma ideia
intrigante.
—Livvy, nada de se
fazer de casamenteira. Quero que me prometa isso.
A expressão de Selena
se tornou maliciosa.
—Não farei uma
promessa que talvez não possa manter.
—Selena.
—OH, muito bem. Mas
não pode parar Mikey se ele tiver em mente se fazer de casamenteiro. E a julgar
por seu atual comportamento, bem que poderia ser.
—Enquanto você não
interfira...
Selena sorveu pelo
nariz e tentou parecer ofendida.
—Dói que pense sequer
que eu faria uma coisa assim.
—OH, por favor. —Demetria
voltou para o livro, mas era quase impossível concentrarem‐se
na trama quando sua mente estava continuamente contando para trás... Vinte...
Dezenove... Dezoito...
Certamente, Selena não
seria capaz de ficar em silencio durante mais de vinte segundos.
Dezessete...
Dezesseis...
—Mikey seria um
marido encantador, não acha?
Quatro segundos. Era
extraordinário, inclusive para Selena.
—Obviamente é jovem,
mas nós também somos.
Demetria a ignorou
cuidadosamente.
—Adam provavelmente
também teria sido um bom marido se Camille não tivesse aparecido e o arruinado.
Demetria levantou a
cabeça de repente.
—Não acha que esse é
um comentário bastante desagradável?
Selena lhe dirigiu um
pequeno sorriso.
—Sabia que estava me
escutando.
—É quase impossível
não fazê‐lo — murmurou Demetria.
—Só estava dizendo
que... —Selena elevou o queixo, e seu olhar se moveu para a entrada a costas de
Demetria. — E aqui está ele. Que coincidência.
—Mikey — disse
alegremente Demetria, virando no assento para poder dar uma olhada por cima do
encosto do sofá. Exceto que não era Mikey.
—Sinto decepcioná‐la —
disse Adam, uma das comissuras de sua boca se retorceu em um preguiçoso e
extremamente suave sorriso.
—Sinto muito —
resmungou Demetria, sentindo‐se inesperadamente tola. — Estávamos falando dele.
—Também estávamos
falando de você — disse Selena. — Recentemente, de fato, por isso fiz alguns
comentários a sua entrada.
—Coisas diabólicas eu
espero.
—OH, é obvio — disse Selena.
Demetria arrumou para
sorrir apesar de ter os lábios fechados enquanto ele se sentava a seu lado.
Selena se inclinou
para frente e descansou o queixo coquetemente sobre a mão.
—Estava dizendo a Demetria
que achava que seria um marido horrível.
Ele pareceu divertido
enquanto se reclinava para trás.
—É bastante certo.
—Mas estava a ponto
de dizer que com a formação adequada — continuou Selena— poderia se reabilitar.
Adam ficou de pé.
—Vou.
—Não, não vá! —gritou
Selena rindo. — É obvio, só estou tirando o sarro. Já é muito tarde para te
redimir. Mas Mikey... Bom, Mikey é como um pedaço de argila.
—Não direi a ele que
disse isso — murmurou Demetria.
—Não diga que não
está de acordo comigo. —Provocou Selena. — Não teve tempo de ficar horrível,
como fazem o resto dos homens.
Adam olhou a irmã com
manifesto assombro.
—Como é possível que
esteja aqui sentado te escutando dar um sermão sobre como dirigir os homens?
Selena abriu a boca
para replicar, algo inteligente e engenhoso, com certeza mas justo então
apareceu o mordomo na entrada e o economizou a todos.
—Sua mãe requer sua
companhia, Lady Selena.
—Voltarei — advertiu Selena
enquanto saía excitada do aposento. — Estou impaciente para terminar esta
conversa. —E então, com um sorriso travesso e uma sacudida de seus dedos, foi.
Adam suprimiu um
gemido, sua irmã seria a morte de alguém, só esperava que não fosse á dele e
olhou Demetria. Parecia um novelo sobre o sofá, os pés sob o corpo e um enorme
e poeirento livro no colo.
—Uma leitura densa?
—murmurou ele.
Ela elevou o livro.
—OH — disse ele, os
lábios crisparam.
—Não ria — advertiu
ela.
—Nem em sonhos.
—Tampouco minta —
disse ela, sua boca assumiu aquela expressão de tutora que parecia saber fazer
tão bem.
Ele se recostou para
trás com um risinho.
—Bom isso não pode
prometer.
Durante um momento,
simplesmente ficou ali sentada, parecendo dura e severa a partes iguais, e
então mudou a expressão do rosto. Nada dramático, nada alarmante, mas
suficiente para deixar claro que ela tinha estado debatendo algo em sua mente.
E que chegou a uma conclusão.
—O que pensa sobre Mikey?
—perguntou.
—É meu irmão — disse
ele.
Ela estendeu a mão e
fez um movimento rápido com o pulso, como dizendo:
Que mais?
—Bom — disse,
tentando ganhar tempo. Realmente, o que esperava que dissesse? — É meu irmão.
Ela elevou os olhos
para cima sarcasticamente.
—Bastante revelador
de sua parte.
—O que está
perguntando exatamente?
—Quero saber o que
pensa dele — insistiu.
O coração parou no
peito sem uma razão que pudesse identificar.
—Está me perguntando
—inquiriu com cautela — se acho que Mikey seria um bom marido?
Dirigiu aquele solene
olhar dela, e então piscou, e do mais estranho foi quase como se estivesse
esclarecendo antes de dizer, em um tom do mais normal:
—Parece que todo
mundo tenta nos juntar.
—Todo mundo?
—Bom pelo menos Selena.
—Não é precisamente a
pessoa a quem pediria conselhos românticos.
—Então não acredita
que devesse me propor a conquistar Mikey — disse ela, inclinando‐se
para frente.
Adam piscou. Conhecia
Demetria e a tinha conhecido durante anos, por isso estava bastante seguro de
que não havia modificado sua postura com a intenção de exibir seus
surpreendentemente adoráveis seios. Mas resultou ser uma grande distração.
—Adam? —murmurou.
—É muito jovem —
deixou escapar.
—Para mim?
—Para qualquer uma.
Por Deus, só tem vinte e um anos.
—Na realidade, ainda
tem vinte.
—Exato — disse
incômodo, desejando que houvesse alguma forma de reajustar o lenço sem parecer
idiota. Estava começando a sentir calor e estava ficando mais difícil manter a
atenção concentrada em algo mais que Demetria sem ser óbvio.
Ela chegou para trás.
Graças a Deus.
E não disse nada.
Até que ele não pôde
evitar dizer:
—Então, tem a
intenção de persegui‐lo?
— Mikey? — pareceu pensar—
Não sei.
Ele bufou.
—Se não sabe, então
claramente não deveria.
Ela se virou e o
olhou diretamente aos olhos.
—Isso é o que pensa?
O que o amor deveria ser óbvio e claro?
—Quem falou de amor?
—sua voz soou ligeiramente cruel, o que lamentou, mas certamente ela entendia
que aquela era uma conversa insustentável.
—Hmmm.
Teve a desagradável
sensação de que o julgou e de que saiu perdendo. Uma conclusão que foi
reforçada quando voltou sua atenção ao livro que tinha no colo.
E ali se sentou, como
um completo idiota, simplesmente olhando‐a ler seu livro, tentando
idear algum tipo de comentário engenhoso.
Ela levantou a vista,
seu rosto irritantemente plácido.
—Tem planos para esta
tarde?
—Nenhum. — Respondeu
bruscamente, ainda que tivesse a intenção de dar um passeio a cavalo.
—OH. Espera que Mikey
chegue logo.
—Estou informado. —Por
isso falávamos dele — explicou como se importasse. — Virá para meu aniversário.
—Sim, é obvio.
Inclinou‐se
para frente uma vez mais. Que Deus o ajudasse.
—Recorda? —perguntou.
— Vamos ter uma refeição familiar amanhã de noite.
—É obvio que me
lembro — murmurou ele, embora não se lembrava.
—Hmmm — murmurou ela
— enfim, obrigada por sua opinião.
—Minha opinião —
repetiu. De que demônio falava agora?
—Sobre Mikey. Há
muitas coisas a levar em consideração e de verdade desejava sua opinião.
—Bom. Agora já a tem.
—Sim. —Ela sorriu. —
Alegro‐me. Porque sinto um grande respeito por você.
De alguma forma
estava conseguindo fazê‐lo se sentir como se fosse algum tipo de relíquia antiga.
—Sente um grande
respeito por mim? —as palavras deslizaram desagradavelmente de sua língua.
—Bom, sim. Achava que
não?
—Francamente, Demetria,
a maior parte do tempo não tem nem ideia do que pensa —espetou.
—Penso em você.
Os olhos dele voaram
aos dela.
—E em Mikey, claro. E
em Selena. Como se as pessoas pudesse viver na mesma casa com ela e não pensar
nela. —Fechou o livro de repente e ficou em pé. — Imagino que deveria ir
procurá‐la. Ela e sua mãe não estão de acordo sobre alguns vestidos que Selena
quer encomendar e prometi ajudá‐la em sua causa.
Levantou‐se e
a escoltou até a porta.
—Na de Selena ou na
de minha mãe?
—Caramba, na de sua
mãe, é obvio — disse Demetria rindo. — Sou jovem, mas não tola.
E com aquilo, partiu.
10
DE JUNHO DE 1819
Tive
uma estranha conversa com Adam esta tarde. Não era minha intenção fazê‐lo sentir ciúmes, embora
suponha que poderia interpretar dessa forma, se alguém conhecesse meus
sentimentos por ele, o que é obvio ninguém faz.
Entretanto,
sim era minha intenção inspirar certas noções de culpa no relacionado À Morte
d'Arthur. Nisso, não acredito que tive êxito.
Mais à tarde, Adam
voltou depois de cavalgar pelo Hyde Park com o amigo Lorde Westholme, só para
encontrar Selena rondando pelo salão principal.
—Chis! — disse.
Era suficiente para
que qualquer um ficasse curioso, e por isso Adam foi imediatamente ao seu lado.
—Por que estamos tão
calados? —perguntou, negando‐se a sussurrar.
Ela lançou um olhar
de aborrecimento.
—Estou bisbilhotando.
Adam não podia
imaginar a quem, posto que estivesse aproximando‐se com cautela à escada que
descia para a cozinha. Mas então ouviu o tom melodioso de uma risada.
—Essa é Demetria?
—perguntou.
Selena assentiu.
—Mikey acaba de
chegar e estão descendo juntos.
—Por quê?
Selena lançou uma
olhada pelo outro lado do canto e se virou repentinamente para ficar frente a Adam.
—Mikey tinha fome.
Adam tirou as luvas.
—E necessita que Demetria
lhe dê de comer?
—Não, desceram pelas
bolachas de manteiga da senhora Cook. Ia me juntar a eles, pois odeio ficar
sozinha, mas agora que está aqui, acho que deixarei que você me faça companhia.
Adam lançou um olhar
para a parte de abaixo do salão, mesmo que fosse impossível ver seu irmão e Demetria.
—Eu também estou
bastante faminto — murmurou pensativo.
—Abstenha‐se —
ordenou Selena. — Necessitam tempo.
—Para comer?
Ela revirou os olhos.
—Para se apaixonarem.
Havia algo bastante
mortificante em receber tal olhar de desdém da irmã menor, mas Adam decidiu que
tomaria, se não o caminho mais longo, ao menos um intermédio, e por isso lhe
dirigiu um olhar de superioridade e devolveu sucintamente: — E têm a intenção
de fazer tudo isso com as bolachas e o chá em uma só tarde?
—É um começo —
replicou Selena. — Não te vejo fazer nada para juntar o casal.
Aquilo pensou Adam
com inesperada contundência, era porque qualquer idiota podia ver que seria um
péssimo casamento. Queria muito ao Mikey, e o tinha em tão alta estima como
qualquer um poderia ter a um menino de vinte anos, mas estava claro que era o
homem errado para Demetria. Era verdade que só chegou a conhecê‐la
bem nessas poucas semanas passadas, mas inclusive ele podia ver que ela era
madura para sua idade. Necessitava alguém que fosse mais maduro, mais velho, que
soubesse apreciar suas magníficas qualidades. Alguém que pudesse ter mão firme quando
seu caráter fizesse uma de suas estranhas aparições.
Mikey, supunha,
poderia ser esse homem... Em dez anos.
Adam olhou a irmã e
disse, com firmeza:
—Necessito de comida.
—Adam, não! —Mas Selena
não pôde detê‐lo.
Quando tentou, ele já
estava a meio caminho do vestíbulo.
Os Bevelstoke sempre
tiveram uma casa relativamente informal, ao menos quando não entretinham a
convidados, e por isso, nenhum dos criados se sentiu particularmente surpreso
quando Mikey apareceu pela cozinha, abrandando a cozinheira com sua doçura, com
sua expressão de cachorrinho, e logo se deixou cair na mesa com Demetria. Para
esperar enquanto a cozinheira preparava com rapidez algumas de suas mais
famosas bolachas de manteiga. Acabava de deixá‐las sobre a mesa, ainda
fumegantes e cheirando a glória, quando Demetria ouviu um audível bater de
porta atrás dela.
Virou, piscando, para
ver Adam de pé na base das escadas, com aparência de libertino, envergonhado e totalmente
adorável, tudo de uma vez. Suspirou. Não pôde evitar.
—Desci as escadas de
dois em dois — explicou, embora ela não estivesse totalmente segura da
importância daquilo.
—Adam — grunhiu Mikey,
muito ocupado comendo a terceira bolacha para lhe dar as boas‐vindas
de forma mais eloquente.
—Selena me disse que
estavam aqui — disse Adam. — Cheguei a um bom momento. Estou esfomeado.
—Temos um prato de
bolachas, se quiser. —Disse Demetria, fazendo um gesto para o prato que estava
sobre a mesa.
Adam deu um encolher
de ombros e se sentou a seu lado.
—A senhora Cook que
fez?
Mikey assentiu.
Adam pegou três, logo
se virou para a cozinheira com a mesma expressão de cachorrinho que Mikey havia
adotado antes.
—OH, muito bem —
soprou, adorando claramente a atenção. — Farei mais.
Justa então Selena
apareceu na entrada, os lábios apertados enquanto fulminava o irmão maior com o
olhar.
—Adam — disse com voz
irritada. — Disse que queria te mostrar o novo livro que tenho.
Demetria afogou um
gemido. Havia dito a Selena que deixasse de tentar forçar a união.
—Adam — disse Selena
com os dentes apertados.
Demetria decidiu que
se Selena perguntasse alguma vez por aquilo, diria que simplesmente não se pôde
conter, assim elevou a vista, sorriu docemente, e perguntou.
—E que livro seria?
Selena a fulminou com
o olhar.
—Já sabe qual.
—Poderia ser aquele
que fala do Império Turco, ou o sobre Trapaceiros no Canadá, ou aquele que fala
da filosofia de Adam Smith?
—Esse do Smith —
respondeu bruscamente Selena.
—Sério? —perguntou Mikey,
virando para sua gêmea com renovado interesse. — Não tinha nem ideia de que
você gostasse desse tipo de coisas. Este ano lemos A Riqueza das Nações. É uma
mescla bastante interessante de filosofia e economia.
Selena sorriu
apertadamente.
—Estou segura de que
sim. Assegurarei de te dar minha opinião uma vez termine de lê‐lo.
—Até onde leu?
—Perguntou Adam.
—Só umas poucas
páginas.
Ou ao menos isso foi
o que Demetria acreditou ouvir. Era difícil estar segura devido ao apertado dos
dentes de Selena.
—Quer uma bolacha, Selena?
—perguntou Adam, e em seguida sorriu de maneira fugaz e zombadora a Demetria,
como dizendo: Nos dois estamos juntos nisto.
Parecia um
jovenzinho. Brilhava com um jovem. Parecia... Feliz.
E Demetria se
derreteu.
Selena cruzou o
aposento e se sentou ao lado de Mikey, mas pelo caminho se inclinou e sussurrou
na orelha de Demetria:
—Estava tentando te
ajudar.
Entretanto, Demetria
ainda estava se recuperando do sorriso de Adam. Sentia como se o estômago
tivesse caído aos pés, à cabeça dava voltas, e parecia como se seu coração
estivesse pulsando em uma sinfonia completa. Ou estava apaixonada ou tinha pegado
a gripe. Jogou um olhar furtivo ao cinzelado perfil de Adam e suspirou.
Todos os sinais
apontavam para o amor.
—Demetria. Demetria!
Elevou a vista para Selena,
quem dizia seu nome impacientemente.
—Mikey quer conhecer
minha opinião sobre As Riquezas das Nações quando acabar de lê‐lo.
Disse que você o leria comigo. Estou segura de que poderemos conseguir outra
cópia.
—O que? OH, sim, de
acordo, eu adorarei lê‐lo. —Foi só quando viu o sorriso de satisfação de Selena que Demetria
se deu conta do que acabava de aceitar.
—Ha, Demetria — disse
Mikey, inclinando‐se sobre a mesa e dando palmadinhas na mão com a dele. — Tem que
me contar se está desfrutando da temporada.
—Estas bolachas estão
deliciosas — declarou Adam em voz alta, alargando a mão para pegar uma. —
Perdoe Mikey, poderia mover o braço? —Mikey devolveu o braço a sua antiga
posição, e Adam pegou uma bolacha e a colocou com rapidez na boca. Sorriu
amplamente. — Maravilhosas como sempre, senhora Cook!
—Prepararei outro
prato para você em apenas alguns minutos — assegurou‐a, radiante
ante a adulação.
Demetria esperou que
terminasse a troca e então disse a Mikey.
—Está sendo adorável.
Apenas gostaria que você estivesse aqui mais frequentemente para desfrutar
conosco.
Mikey se virou para
ela com um preguiçoso olhar que deveria ter feito seu coração pular.
— Eu também gostaria
— disse — mas ficarei durante a maior parte do verão.
—Não terá muito tempo
para as damas, receio — interpôs Adam amavelmente. — Pelo que me lembro, minhas
férias do verão passava de farra com os amigos. Era muito divertido. Não irá
querer perder isso
Demetria o olhou de
forma estranha. Adam soava quase muito alegre.
—Estou seguro de que
foi — respondeu Mikey. — Mas também gostaria de ir a alguns dos eventos da
sociedade.
—Boa ideia — disse Selena.
— Irá querer adquirir um pouco de saber estar entre a sociedade.
Mikey virou para ela.
—Tenho suficiente saber,
muito obrigado.
—É obvio que sim, mas
não há nada como a experiência real para refinar um homem.
Mikey ruborizou.
—Tenho experiência, Selena.
Demetria arregalou os
olhos.
Adam ficou de pé em
um único e fluido movimento.
—Acho que esta
conversa está se deteriorando com rapidez até um nível nada adequado para
ouvidos tenros.
Mikey pareceu como se
quisesse dizer algo mais, mas por sorte para a paz familiar, Selena uniu as
mãos com um alentador:
—Bem dito!
Mas Demetria a
conhecia muito para confiar nela, ao menos quando se tratava de se fazer de
casamenteira. E era certo que logo se encontraria sendo a receptora final do
sorriso mais matreiro de Selena.
—Demetria — disse
quase muito encantada.
—Er, sim?
—Não me disse que
queria levar Mikey a aquela loja de luvas que vimos na semana passada? Têm as
melhores luvas que já vi — continuou Selena, dirigindo o comentário para Mikey.
— Tanto para homem como para mulher. Pensamos que talvez necessitasse um par.
Não estávamos seguras de que tipo de qualidade era a que se encontrava em
Oxford, sabe?
Era um tipo de
discurso pouco sutil, e Demetria estava segura de que Selena sabia. Lançou um
olhar furtivo ao Adam, quem estava observando o procedimento com um ar de
diversão. Ou talvez fosse desgosto. Às vezes era difícil discernir.
—O que diz, querido
irmão? — disse Selena com sua voz mais encantadora. —
Iremos?
—Não posso pensar em
nada que me agrade mais.
Demetria abriu a boca
para dizer algo, então viu a futilidade de fazê‐lo e a fechou. Mataria Selena.
Ia entrar no quarto dela e matar a intrometida garota. Mas por agora, sua única
opção era dizer que sim. Não desejava fazer nada que pudesse levar
Mikey a acreditar que
tinha sentimentos românticos por ele, mas seria o cúmulo da insensibilidade
tentar escapar do passeio justo na frente dele.
E por isso, quando se
deu conta de que três pares de olhos estavam concentrados e espectadores nela,
não pôde mais que dizer:
—Podemos ir hoje.
Seria estupendo.
—Irei com vocês —
anunciou Adam, ficando decisivamente de pé.
Demetria virou para
ele surpreendida, igual à Selena e Mikey. Adam nenhuma vez mostrou interesse em
acompanhá‐los a nenhuma de suas saídas quando estavam em Ambleside, e na
realidade, por que deveria fazer? Era nove anos mais velhos que eles.
—Necessito um par de
luvas — disse ele simplesmente, seus lábios se curvaram ligeiramente como se
dissesse: por que outra razão iria?
—É obvio — disse Mikey,
ainda piscando ante a inesperada atenção por parte de seu irmão maior.
—Que bom de sua parte
o sugerir — disse Adam bruscamente. — Obrigado, Selena.
Ela não pareceu
alegrar‐se muito.
—Será genial que nos
acompanhe — disse Demetria, talvez um pouco mais entusiasta do que tinha sido
sua intenção. — Não se importa, não é, Mikey?
—Não, claro que não.
—Mas parecia como se importava. Ao menos um pouco.
—Terminou com seu
leite e bolachas, Mikey? — perguntou Adam. —
Deveríamos nos pôr em
caminho. Parece que a tarde ficará nublada.
Mikey alargou a mão
para agarrar outra bolacha, a maior da mesa.
—Podemos levar uma
carruagem fechada.
—Irei procurar meu
casaco — disse Demetria, ficando de pé. — Vocês dois podem decidir a carruagem.
Nos encontramos no salão? Em vinte minutos?
—A acompanharei para
acima — disse rapidamente Mikey. — Preciso pegar algo de minha mala de viagem.
O casal abandonou a
cozinha, e Selena se virou em seguida para Adam com uma expressão que era
positivamente felina.
—O que ocorre
contigo?
Olhou‐a de
maneira insossa.
—Desculpe?
—Estive trabalhando
com cada fôlego de meu corpo para que esses dois fiquem juntos e você está
arruinando tudo.
—Não fique dramática
— disse com um breve movimento de cabeça. — Só vou comprar luvas. Não deterá um
casamento, se de verdade houver algum iminente.
Selena franziu o
cenho.
—Se não o conhecesse
bem, pensaria que está com ciúmes.
Por um momento, Adam
não pôde fazer outra coisa que olhá‐la. E então encontrou o
sentido comum , e a voz, e disse bruscamente:
—Bom, conhece‐me
bem. Assim que agradeceria que não fizesse acusações infundadas.
Com ciúmes de Demetria.
Bom Deus, o que seria a seguinte coisa em que pensaria Selena? Ela cruzou de
braços.
—Bom, certamente está
agindo de forma estranha.
Durante toda sua
vida, Adam tratou a jovem irmã de diferentes maneiras. Em geral, de forma
benignamente descuidada. Às vezes, adotava um rol mais amistoso, surpreendendo‐a
com presentes e adulações quando era conveniente para ele fazê‐lo.
Mas a distância entre
as idades assegurou que nunca a tratasse como a igual, que nunca falasse sem
primeiro considerá‐la uma menina.
Mas agora, ao acusá‐lo
daquilo, de desejar Demetria, de todas as coisas, arremeteu contra ela sem
medir suas palavras, sem reduzir sua magnitude nem seus sentimentos. E sua voz
foi rude, cortante e afiada quando disse:
—Se olhasse além de
seu próprio desejo de ter Demetria constantemente a sua disposição, veria que
ela e Mikey são extremamente incompatíveis.
Selena ofegou ante o
inesperado ataque, mas se recuperou com rapidez.
—A minha disposição?
— repetiu furiosa. — Agora quem faz acusações infundadas? Sabe tão bem como
qualquer um que adoro Demetria e não quero mais que sua felicidade. Além disso,
falta a ela beleza e um dote, e...
—OH, pelo amor de...
—Adam fechou a boca com força antes de amaldiçoar diante de sua irmã. — A
menospreza — espetou.
Por que as pessoas
insistiam em ver Demetria como à desajeitada moça que tinha sido? Talvez não se
ajustasse ao atual padrão de beleza da sociedade como Selena, mas possuía algo
muito mais profundo e interessante. Era possível olhá‐la e
saber que havia algo atrás de seus olhos. E quando sorria, não era algo
praticado, não era de maneira zombadora, OH, muito bem, às vezes sim era de
forma zombadora, mas poderia aceitar, já que possuía exatamente o mesmo senso
de humor que ele. E realmente, apanhados em Londres para a temporada como
estavam, estavam obrigados a encontrar‐se com um montão de coisas
dignas de brincadeira.
—Mikey seria um
excelente par para ela — continuou Selena com veemência.
— E ela para... —
deteve‐se, ofegou, e colocou a mão com força sobre a boca.
—OH, e agora o que? —
disse Adam irritado.
—Isto não é pela Demetria,
não é? É por Mikey. Não acha que ela seja boa o suficientemente para ele.
—Não — replicou
instantaneamente com uma estranha e quase indignada voz.
— Não — voltou a
dizer medindo desta vez as palavras com mais cuidado. — Nada poderia estar mais
longe da realidade. São muito jovens para casar. Especialmente Mikey.
Selena se sentiu
imediatamente ofendida.
—Isso não é verdade,
somos...
—É muito jovem —
cortou com frieza — e não precisa olhar além deste aposento para ver por que um
homem não deveria casar‐se tão jovem.
Não o entendeu no
ato. Adam viu o momento exato em que sim, viu a compreensão, e logo a
compaixão.
E ele odiava a
compaixão.
—Sinto muito. —Deixou
escapar Selena. As duas palavras lhe garantiram que voltariam a colocá‐lo
uma vez mais sobre a margem. E então voltou a dizer. — Sinto muito.
E fugiu. Demetria
tinha estado esperando no salão rosado durante vários minutos quando apareceu
uma criada na entrada e disse:
—Peço que me desculpe
senhorita, mas Lady Selena me pediu que lhe dissesse que não descerá.
Demetria deixou em
seu lugar a estatueta que tinha estado examinando e olhou à criada com
surpresa.
—Sente‐se
indisposta?
A criada pareceu
vacilar e Demetria não desejou pô‐la em uma posição difícil quando
simplesmente podia ir ver Selena ela mesma, assim disse:
—Não importa.
Perguntarei eu mesma.
A criada se inclinou
em uma reverência, e Demetria se voltou para a mesa que estava ao seu lado para
assegurar‐se de que havia devolvido a estatueta de volta a antiga posição,
então, lançando uma última olhada. Sabia que lady Rudland gostava que fizesse
ornamento de sua curiosidade, mas deixando as coisas em seu lugar— caminhou
para a porta.
E chocou contra um
longo corpo masculino.
Adam. Soube inclusive
antes que falasse. Poderia ter sido Mikey, ou um lacaio, ou poderia ter sido —
que Deus a ajudasse, que vergonha — Lorde Rudland, mas não era. Era Adam.
Conhecia seu aroma. Conhecia o som de seu fôlego.
Sabia como era o cheiro
do ar o seu redor quando estava perto dele.
E foi então quando
soube, com total segurança, que aquilo era amor.
Era amor, e era o
amor de uma mulher por um homem. A jovenzinha que havia pensando nele como em
um cavalheiro de brilhante armadura já não existia. Agora era uma mulher.
Conhecia suas falhas e via seus defeitos, e ainda assim o queria.
Amava‐o e
queria curá‐lo, queria...
Não sabia o que
queria. Queria‐o por completo. Queria tudo. Ela...
—Demetria?
As mãos dele estavam
ainda em seus braços. Levantou a vista, inclusive embora soubesse que seria
quase insuportável enfrentar o azul de seus olhos. Sabia o que não veria ali.
E não viu. Não havia
amor, nem revelação. Mas parecia estranho, diferente.
E ela sentiu calor.
—Sinto muito —
gaguejou, inclinando‐se para se afastar. — Deveria ter mais cuidado.
Mas não a liberou.
Não imediatamente. Estava olhando‐a, a sua boca, e Demetria
pensou por um adorável e bendito segundo que talvez quisesse beijá‐la.
Conteve o fôlego, e
entreabriu os lábios, e...
E então tudo acabou.
Ele se afastou.
—Minhas desculpas —
disse, com inflexão de nenhum tipo. — Também deveria ter mais cuidado.
—Ia procurar Selena —
disse, sobre tudo porque não tinha nem ideia de que mais dizer. — Acaba de
mandar me avisar que não irá descer.
A expressão dele
mudou apenas o suficiente e com o suficiente cinismo para que soubesse que
sabia que algo ia mal.
—Deixa‐a —
disse. — Ficará bem.
—Mas...
—Por uma vez — disse
cortante — deixe que Selena se encarregue de seus próprios problemas.
Os lábios de Demetria
se abriram com surpresa ante seu tom. Mas se livrou de ter que responder graças
à chegada de Mikey.
—Preparados para
irmos? — perguntou jovialmente, completamente inconsciente da tensão no
aposento. — Onde está Selena?
—Não virá — disseram Demetria
e Adam ao uníssono.
Mikey olhou a um e
logo ao outro, ligeiramente desconcertado por sua resposta coletiva.
—Por quê? —
perguntou.
—Não se sente bem —
mentiu Demetria.
—O que vamos fazer —
disse Mikey, sem soar particularmente triste.
Sustentou o braço em
alto para Demetria. — Vamos?
Demetria olhou Adam.
—Ainda virá?
—Não. — E nem sequer
demorou mais de dois segundos em responder.
11
DE JUNHO DE 1819
Hoje
foi meu aniversário, encantador e estranho.
Os
Bevelstoke celebraram um jantar familiar em minha honra. Foi realmente doce e
amável, especialmente porque meu próprio pai provavelmente se esqueceu de que
hoje é outra coisa além do dia em que certo estudioso grego realizou certo
cálculo especial matemático ou alguma outra coisa muito importante.
Da
parte de Lorde e Lady Rudland: um belo par de brincos cor verde mar. Sei que
não deveria aceitar algo tão caro, mas não poderia armar um escândalo na mesa e
de fato disse: "Não posso..." (embora com um pouco de falta de
convicção) e fui categoricamente sossegada.
Da
parte de Mikey: um conjunto de preciosos lenços.
Da
parte de Selena: uma caixa de escrivaninha, com meu nome gravado. Anexou uma
pequena nota que advertia: "Só para você", e dizia, "Espero que
não possa usar isto durante muito tempo!". O que claramente significava
que esperava que meu nome logo fosse Bevelstoke.
Não
fiz comentários.
E da
parte de Adam, um frasco de perfume. Violetas. Imediatamente pensei no laço
violeta que colocou em meu cabelo quando tinha dez anos, mas é obvio não se recordou
de uma coisa assim. Não disse nada sobre isso; teria sido muito embaraçoso revelar
algo tão sentimental. Mas acredito que é um presente muito doce e encantador.
Não
parece que possa dormir. Passaram dez minutos desde que escrevi a frase anterior,
e embora boceje com frequência, não sinto as pálpebras nem um pouco pesadas.
Acho
que descerei à cozinha para ver se posso conseguir um copo de leite quente.
Ou
talvez não vá à cozinha. Não é provável que haja ninguém lá embaixo que possa
ajudar. E embora seja perfeitamente capaz de esquentar um pouco de leite, é provável
que o chef tenha palpitações quando vir que alguém usou uma das panelas sem seu
conhecimento. E o que é mais importante, já tem vinte anos. Se quiser posso tomar
um copo de xerez para que me ajude a dormir.
Acho
que isso é o que farei.
eu sou apaixonada por essa mulher
TAEYEON DONA DA PORRA TODA NA COREIA DO SUL