Demetria
abriu devagar os olhos e deu uma olhada no lugar vazio a seu lado. Aparentemente,
Joseph acordara cedo e logo saíra da cama. Não era usual. Ele geralmente era o
primeiro a acordar e a provocá-la com beijos e carinhos. Não podia haver jeito
mais gostoso de começar o dia.
A
verdade, refletiu Demetria, era que naquela manhã específica ela não teria
gostado tanto. Sentia-se esquisita, com a garganta e a barriga doendo por algum
motivo. Esperava que não fosse nenhum problema. Soltando um suspiro, virou-se
de costas na cama e quase gritou de susto ao ver um rosto enrugado curvado
sobre ela.
—
Kibble! — Ela agarrou as cobertas, levantando-as até o peito e arregalou os
olhos para o mordomo. — O que...?
—
Como está se sentindo, milady? — o mordomo a interrompeu, calmamente.
Demetria
piscou os olhos. Sua mente agora estava completamente acesa e começava a
funcionar. A última coisa de que se lembrava era ter se deitado para descansar
no fim da tarde e agora a iluminação do quarto sugeria que ainda era início de
tarde. Franzindo o cenho, ela explorou um pouco mais a mente, juntando algumas
lembranças esparsas da Sra. Longbottom e Kibble segurando-a e acalmando-a
enquanto vomitava.
—
Eu estava doente — disse, baixinho.
—
Estava — Kibble confirmou.
—
O senhor e a Sra. Longbottom tomaram conta de mim.
—Assim
como quase todo o pessoal da casa. Estávamos todos muito preocupados, milady.
—
Nossa, o que aconteceu? Foi uma gripe forte?
—
Do que a senhora se lembra? — o mordomo perguntou em vez de responder.
Demetria
mordeu o lábio e procurou lembrar.
—
Vim para o meu quarto para escapar de Tay... digo, para ter um pouco de
privacidade. — Embora a madrasta fosse um pesadelo, não gostava de falar mal
dela com os criados.
Ficava
muito contente que seu pai e seu marido se dessem tão bem; havia ficado feliz
que tivessem saído para cavalgarem juntos. Infelizmente, Taylor ficara para
atormentá-la com comentários maldosos sobre a provação que o leito nupcial
significava e sobre como ela deveria estar horrorizada ao ver mais de perto o
rosto do marido... se é que ele havia consentido que usasse óculos novamente.
Seria melhor que permanecesse cega, a madrasta completara.
Controlando-se
e não revelando que já tinha óculos, na primeira oportunidade Demetria fugira
para o quarto para ler um pouco. Havia, como de costume, bloqueado as duas
portas e recostara-se para ler.
Não
comentou com Kibble, porém, nada sobre a leitura. Seus óculos continuavam sendo
um segredo.
—
Vim descansar um pouco no quarto — disse Demetria — e havia uma fatia de torta
em minha mesa de cabeceira.
—
Não foi a senhora quem a trouxe?
—
Não, Kibble. Achei que Frederick a tivesse deixado para mim. Ele parece estar
sempre me seguindo e fica me dando pequenas guloseimas. Embora não estivesse
com fome, dei uma ou duas mordidas, para que ele não ficasse sentido.
—
Graças a Deus, a senhora não estava com fome.
—
Por quê?
—
Nada, nada. Acabe de me contar o que aconteceu, por favor.
Demetria
pensou em insistir para que ele explicasse seu comentário, mas desistiu. No
momento oportuno ficaria sabendo.
—
Foi só isso. Dei umas mordidas e, como meu estômago começou a doer um pouco,
resolvi dormir. Uma boa cochilada às vezes resolve tudo.
Kibble
ficou em silêncio por um momento, depois levantou alguma coisa. Demetria não
conseguiu identificar de imediato, mas ele aproximou os óculos bem perto do
nariz dela.
—
Estavam entre as cobertas quando eu a levantei um pouco. Também encontrei um
livro da biblioteca.
Demetria
mordeu o lábio, sentindo-se desconcertada sob o olhar dele. Não que houvesse
qualquer expressão de acusação ou de raiva no rosto do mordomo ao tecer o
comentário.
—
Era por isso então que a senhora estava bloqueando as portas. Lorde Mowbray não
sabe dos óculos.
Embora
não fosse uma pergunta, Demetria respondeu:
—
Não, ele não sabe...
—
Há quanto tempo já os tem?
—
Desde a véspera de meu casamento.
—
Desconfiava disso toda vez que a via escapar para o quarto. Não fazia sentido
para mim que a senhora tivesse seu próprio dinheiro e não o usasse para comprar
seus óculos.
—
Na verdade, não tive como obtê-lo. Taylor estava sempre comigo. Mas dei um
jeito de ir até a ótica no dia em que lady Mowbray e eu fomos provar nossos
vestidos.
—
Por que não contou a Joseph?
Demetria
notou a falta do devido título quando Kibble se referiu ao marido, mas sabia
que os dois tinham um relacionamento especial, quase de pai e filho, por isso
não se surpreendeu. Ela não estava nada propensa a responder.
—
É porque o viu e o achou muito repulsivo? Prefere não ter de olhar para seu
marido?
Uma
vez mais não havia qualquer censura ou juízo de valor no tom de voz do mordomo,
mas Demetria sentiu-se horrorizada à mera sugestão que fazia.
—
Não, claro que não. Joseph é lindo. Pouco importa a cicatriz que tem no rosto.
Ele tem os olhos castanhos mais lindos que já vi, lábios muito doces e...
Dando-se
conta do que estava dizendo, Demetria parou, sentindo o rubor subir-lhe ao
rosto.
—
A senhora o ama — completou Kibble, visivelmente satisfeito.
—
Sim, creio que sim — ela admitiu, acanhada.
Já
de óculos, Demetria viu o largo sorriso que havia transformado o rosto do
mordomo. Era óbvio que ele também amava Joseph e estava feliz de saber o quanto
era amado pela esposa.
Os
dois trocaram sorrisos e então Kibble perguntou:
—
Mas por que a senhora está escondendo os óculos dele?
Ao
ver que Demetria evitava seu olhar, ele insistiu:
—
É por causa dele?
—
É — ela confirmou, embora na verdade fosse por causa dos dois. Demetria não
queria que Joseph a visse com aqueles óculos horrorosos. Mas também não
desejava perder o pouco de afeição que ele já lhe tinha, caso a achasse feia de
óculos.
—
Mas a senhora não entende que ele ficaria mais tocado se soubesse que pode
vê-lo e o ama do que pensar que não tem ideia de qual seja a aparência dele?
Demetria
dirigiu um olhar confuso para o mordomo.
—
Como?
Kibble
reformulou o que havia dito:
—
A senhora não está escondendo os óculos para que ele não se sinta
desconfortável sob o seu olhar?
—
Ele sentir-se desconfortável por causa do meu olhar? — ela perguntou,
incrédula. — Não. Por que aconteceria isso? Eu o amo pelo que ele é. Ele é
bonito, inteligente, doce...
—
Mas então por que não usa os óculos e diz isso a ele?
Demetria
achou que Kibble estava com o raciocínio meio lento, dada a dificuldade que
demonstrava para entender. Com pena dele, ela confessou:
—
Porque fico feia de óculos.
Kibble
fez uma expressão de espanto, e ela resolveu esclarecer melhor.
—
Taylor sempre disse que eu ficava feia com os óculos e, quando lady Mowbray
soube que meu par de óculos extra havia se quebrado, ela comentou que Joseph
ficaria aliviado. Fiquei preocupada que ele não me achasse nada atraente.
Kibble
inclinou o corpo para trás, como se tivesse levado um golpe. Ele a encarou
perplexo.
—
É por isso que a senhora não está usando os óculos?
—
É — Demetria confirmou, sentindo-se infeliz para, em seguida, surpreender-se
com a gargalhada do mordomo.
—
O que há de tão engraçado?
—
Oh, milady, se ao menos a senhora soubesse — ele conseguiu dizer entre risadas.
— Os dois são preciosos demais. Estão tão apaixonados e temerosos de rejeição
um do outro.
Demetria
olhou séria para o mordomo, não gostando nada de vê-lo divertir-se com o
assunto.
—
Oh, querida.
Demetria
voltou-se para a porta e viu lady Mowbray entrando com uma expressão exasperada
no rosto. Sacudindo a cabeça ela caminhou pelo quarto até eles.
—
Me perdoem, mas eu estava do outro lado da porta e não pude deixar de ouvir. Demetria,
temo que você me entendeu mal.
—
Lady Mowbray! Quando chegou?
—
Há mais ou menos uma hora, querida. Resolvi ver como você e meu filho estão se
dando. Deveria ter chegado ontem à noite, mas quebrou uma das rodas da
carruagem e tivemos de passar a noite em uma estalagem para que fosse
consertada.
Aboletando-se
em um lado vazio da cama, ela deu um tapinha na mão de Demetria.
—
Se soubesse que você estava sofrendo, daria um jeito de alugar outra carruagem
e chegar mais depressa até aqui.
—Não
haveria necessidade. Estou bem — disse Demetria, tocada pelas palavras da
sogra.
—
Não, minha querida, é óbvio que você não está bem — contradisse-a lady Mowbray.
— Você está sofrendo por causa de um mal-entendido.
Demetria
levantou as sobrancelhas.
—
Que mal-entendido, milady?
Lady
Mowbray abriu a boca para dizer alguma coisa, mas hesitou. Quando finalmente
falou, Demetria podia assegurar-se que não se tratava do que originalmente
intencionava dizer.
—
Ficaria muito contente se você me chamasse de mãe, Demetria. Sempre quis ter
uma filha, mas, depois de Joseph, não pude ter mais filhos. Dessa forma, também
o vazio deixado para você com a morte de sua mãe seria preenchido. Entendo que
Taylor... Bem, como ela nunca teve os próprios filhos, talvez não seja a pessoa
mais indicada para esse papel.
Sorrindo,
Demetria apertou a mão da sogra que segurava a dela e cochichou emocionada:
—
Obrigada... mãe.
Lady
Mowbray mostrou-se radiante, embora seus olhos estivessem marejados de
lágrimas.
Antes
que as duas pudessem comentar qualquer outra coisa, Kibble pigarreou. Assim que
captou a atenção delas, ele sugeriu:
—
Talvez a senhora possa explicar esse mal-entendido, lady Mowbray, para que lady
Demetria de fato entenda, e não fique sofrendo pelo que não entendeu.
—
Sim, claro. — Ela suspirou e, apertando a mão de Demetria, disse: — Minha
querida menina, quando eu disse que Joseph ficaria aliviado ao saber que seus
óculos estavam quebrados, não foi porque ele não gostaria dos óculos, ou
acharia você menos atraente com eles. Foi porque ele teme que, se você enxergar
bem, talvez não se sinta mais atraída por ele.
—
Nossa, como Joseph pode pensar uma coisas dessas? — Demetria surpreendeu-se.
—
Por causa da cicatriz, querida — lady Mowbray respondeu com delicadeza.
—
Imagine — Demetria murmurou, balançando a cabeça como quem acha um absurdo o
que ouviu. —Ele é belo, mesmo com a cicatriz. Pelo amor de Deus, sem ela até
doeria olhar para ele de tão lindo.
—
Realmente, ele era lindo como um deus grego, lindo como um anjo. E ainda é, em
minha opinião. — Lady Mowbray suspirou. — Mas as jovens da cidade exigem
perfeição em tudo e olham para ele como se fosse um anjo caído.
Demetria
percebeu que a sogra havia sofrido pela maneira como o filho havia sido tratado
depois do ferimento.
—
Naturalmente, no princípio o ferimento era muito pior. As feições dele ficaram
completamente diferentes. O rosto ficou muito inchado e dolorido. Mas ele frequentou
a corte mesmo assim. Pobre do meu filho, muitas jovens, achando-se muito
delicadas e finas, chegaram a desmaiar ao vê-lo. — Com o semblante agora
anuviado, ela desabafou: — Começou com a jovem Louise Frampton. Ela teve uma
queda por Joseph durante anos e ficou, de fato, muito aborrecida ao desmaiar
quando viu o que havia acontecido na batalha. Ninguém a tinha prevenido e foi
um choque para ela. Além disso — lady Mowbray acrescentou —, Louise estava um
pouquinho obesa e, quando soube que Joseph havia voltado, pediu à criada que
apertasse bem seu espartilho. A pobre menina se sentiu uma idiota depois de
desmaiar e ficou pior ainda quando soube que outras jovens começaram a fazer o
mesmo ao vê-lo, para provar que eram tão delicadas quanto ela.
—
Pobre Joseph — Demetria murmurou.
Lady
Mowbray assentiu com a cabeça e, com a fisionomia triste, acrescentou:
—
Sei que alguma coisa também aconteceu com lady Johnson, embora não saiba o quê,
mas tudo isso contribuiu para que quisesse fugir de Londres. Ele imediatamente
arrumou as malas, veio para Mowbray e ficou por aqui.
Era
mesmo notório que lady Mowbray havia sofrido muito, pensou Demetria.
—
Não sei quantas vezes eu e Mary o visitamos depois disso e repetimos que a cicatriz
estava muito melhor e que ele devia voltar ao convívio da sociedade. Joseph não
nos dava ouvidos. Finalmente, eu resolvi ser mais dura com ele, pois, do
contrário, ele ficaria por aqui para sempre e nunca retornaria. Me tornei até
impertinente.
Demetria
mordeu o lábio para conter o sorriso que queria brincar em seus lábios. Lady
Mowbray fez o comentário com um estremecimento de horror que evidenciava como
ela se sentia quanto a “ser impertinente”.
—
E eu fui firme até que ele finalmente cedeu e volto a frequentar a corte este
ano.
—
E eu só posso lhe agradecer por isso. De outro modo, eu nunca o teria
conhecido.
Lady
Mowbray sorriu.
—
É verdade. Se eu não o amolasse tanto para ir a Londres este ano, vocês dois
não teriam se conhecido.
Demetria
sentiu um arrepio. Nunca tê-lo conhecido; nunca ter dançado com ele; nunca
tê-lo beijado, nunca... Nossa, ela poderia estar casada com Prudhomme naquela
hora e provavelmente pronta para se atirar de um penhasco também. Ficava
enojada só de pensar na mera possibilidade daquele velho enrugado tocá-la da
maneira como Joseph a tocava. Deus do Céu.
—
Demetria — lady Mowbray propôs —, deixe-me fazer mais uma coisa por você. Deixe
Joseph ver que você tem os óculos. Ele precisa saber que você consegue enxergá-lo
e o ama do jeito que ele é. E você precisa ver que ele a amará com ou sem
óculos.
A
mãe de Joseph deu mais um tapinha na mão de Demetria, depois se levantou.
—
Agora devo ir para o meu quarto. E vamos manter esta visitinha só entre nós.
Imagino que meu filho não ficaria muito contente de eu tê-la visto e conversado
com você antes dele. Pelo que soube, ele ficou a noite toda preocupado, andando
de um lado para o outro do salão.
O
olhar de Demetria voou para o mordomo diante dessa notícia.
A
expressão de Kibble mudou, forçando um sorriso.
—
Não deixei o conde ficar aqui enquanto eu cuidava da senhora, lady Demetria.
Ele, naturalmente, não queria sair, mas ficava questionando e se intrometendo
em tudo o que eu fazia ou pedia. Tive que ser firme.
Demetria
surpreendeu-se ao saber que havia alguém que conseguia que Joseph fizesse
alguma coisa que não queria fazer.
—
Entretanto — Kibble prosseguiu —, prometi ir buscá-lo assim que houvesse
qualquer mudança em seu estado. Vou procurá-lo agora, mas primeiro quero lhe
dizer que lady Mowbray está certa. A senhora deve realmente dizer a ele que já
viu o rosto dele e o ama como ele é. Joseph se preocupa tanto com a aparência
dele, como a senhora com a sua de óculos.
Kibble
acompanhou lady Mowbray, deixando Demetria sentada sozinha, com um dilema.
Seria verdade? Será que ela havia se privado dos óculos sem necessidade? Demetria
pensou e repensou a respeito. Até então o fato de que Joseph não havia
demonstrado nenhuma intenção de que ela comprasse óculos novos a fizera pensar
que ele não gostaria de vê-la de óculos. Sua sogra e Kibble, porém, haviam lhe
mostrado um outro lado da questão. Talvez o marido realmente temesse que ela
não o achasse mais atraente depois de ver bem sua cicatriz.
A
mera ideia fez com que ela balançasse a cabeça. Com ou sem cicatriz, Joseph era
o homem mais charmoso da cidade. Era difícil de acreditar que ele não
entendesse isso. Ele parecia tão confiante o tempo todo.
Os
pensamentos de Demetria foram interrompidos quando a porta do quarto foi
aberta. Já se tornara um hábito tirar os óculos e escondê-los sob o
travesseiro.
—
Demetria.
Ela
imediatamente reconheceu a voz do marido que entrou e atravessou o quarto,
visivelmente abatido de preocupação. Logo atrás dele, entrou um segundo e
depois um terceiro homem. O segundo certamente era seu pai, pensou, mas não
tinha ideia de quem pudesse ser o terceiro.
Joseph
sentou-se ao lado dela na cama e a abraçou.
—
Graças a Deus você está bem — disse baixinho, aninhando-a junto ao peito e
acarinhando o cabelo dela. — Ficamos doentes de preocupação.
—
Ficamos mesmo — o pai confirmou, acariciando-lhe as costas. — Permanecemos a
noite toda na expectativa de que você acordasse.
—
Me perdoem por ter causado tanta preocupação. — Demetria abraçou o marido com
uma das mãos e com a outra apertou a mão do pai.
—
Você não teve culpa alguma — os dois falaram ao mesmo tempo e todos riram.
Joseph
então afastou-se de Demetria e a fitou comovido. Ele estava tão perto que ela
pôde ver as linhas de preocupação em volta de seus olhos avermelhados pela
falta de sono.
—
Ficamos sabendo que você sobreviveria por voltada meia-noite, mas Kibble não
podia dizer se você recuperaria todas as suas faculdades ou ficaria com alguma sequela.
Demetria
esboçou um sorriso.
—
Acho que minhas faculdades estão em ordem.
Joseph
riu e a beijou carinhosamente no nariz.
—
Estamos satisfeitos que a senhora esteja bem — disse o terceiro homem.
Demetria
pensou ter reconhecido a voz, mas não conseguiu no primeiro momento lembrar de
quem era.
—
Você acha que pode nos contar o que aconteceu? — o homem acrescentou, e ela
arregalou os olhos.
—
Sr. Hadley! — exclamou surpresa quando o nome dele repentinamente lhe veio à
mente. — O que está fazendo aqui?
—
Eu o chamei — Joseph explicou. — Faz uma hora que ele chegou. Você acha que
pode responder à pergunta dele?
—
Claro, estou bem — ela assegurou, apertando o braço do marido.
Sem
entender direito o que o Sr. Hadley fazia ali, Demetria resolveu responder a
pergunta dele porque os três homens estavam aguardando de maneira impaciente.
Depois faria suas próprias perguntas.
Demetria
então repetiu rapidamente tudo o que havia dito a Kibble: o fato de desejar um
pouco de privacidade e ter ido para o quarto, de ter comido um pedacinho de
torta e ter sentido dor de estômago, e ter dormido.
O
quarto permaneceu por um momento em silêncio, que foi quebrado por Joseph ao
comentar:
—
Kibble comentou que ter comido só um pequeno pedaço da torta foi o que a
salvou.
—
Que bom que eu não estava com fome — ela brincou.
—
Você poderia ter morrido — o pai falou aparentemente aborrecido por ela não
estar levando o caso muito a sério.
—
Esse era, sem dúvida, o plano — Hadley assegurou,
—
Kibble não acredita que o veneno fosse suficiente para matá-la — disse Joseph,
amenizando a situação. — Segundo ele, mesmo que tivesse comido o pedaço
inteiro, seu estado seria só um pouco pior.
—
Tinha veneno na torta? — Demetria assustou-se. — Vocês estão me dizendo que
tentaram me envenenar?
Os
três homens entreolharam-se e mantiveram-se novamente calados por alguns
instantes. Finalmente, dando um suspiro, Joseph perguntou:
—
Demetria, já lhe perguntei isso antes: você tem certeza de que não há ninguém
querendo prejudicá-la?
Sim,
ela se lembrava de ele ter perguntado se ela teria inimigos. A pergunta surgira
tão naturalmente na conversação depois de terem feito amor que ela não dera
maior importância. Entendia agora que ele já estava preocupado que alguém
quisesse lhe fazer algum mal. Mas por quê?
—
Não, claro que não. Por que haveria de ter? Nunca fiz mal a ninguém em toda a
minha vida. Talvez estivessem tentando envenenar você e eu comi por engano.
—
Envenenar a mim. Por que alguém iria querer me matar?
—
Bem, milorde, por que acha que tentariam me matar? — Demetria rebateu um pouco
irritada.
—
Bem, algum motivo deve haver. Eu nem estava em casa. Não sou eu que descanso à
tarde e, principalmente, porque a torta estava em seu quarto.
Demetria
sorriu sem-graça diante da lógica do marido e então comentou:
—
Então já faz algum tempo que você está desconfiado disso. O que o faz pensar
assim?
—
Demetria, você sofreu inúmeros acidentes depois que chegou a Londres.
—
Ora, todos foram por causa da falta de meus óculos — ela argumentou de pronto.
Demetria
teve a impressão de que Joseph não concordava com sua justificativa, mas ele
não contestou. Na realidade, não disse uma palavra. E antes que Demetria
pudesse dizer qualquer coisa, Joseph a beijou na testa e se levantou.
—
Preciso trocar uma palavra com Hadley. Volto logo.
Os
dois homens deixaram o quarto, e o pai tomou o lugar no lado da cama onde Joseph
estava sentado. Sua atenção, porém, estava voltada para o outro lado da porta;
tentava ouvir a conversa que os homens estavam tendo ali.
Conhecendo
o pai, Demetria sabia que a vontade dele era participar daquela conversa,
qualquer que fosse, mas estava relutante de abandoná-la. Ela então tratou de
liberá-lo.
—
Pode ir, papai, vá se juntar a eles. Quero mesmo me levantar. Talvez o senhor possa
pedir para minha criada subir e providenciar um banho.
—
Sim, sim, querida. — Lorde Lovato imediatamente escapou, aliviado.
Demetria
percebeu que houve uma pequena pausa na conversa quando ele se aproximou. Logo
o assunto foi retomado, mas o som das vozes foi se tornando mais distante à
medida que os três foram se afastando do hall.
Balançando
a cabeça, ela sentou-se na cama, com os pés para fora. Havia tirado o vestido e
colocado um penhoar antes que lhe ocorresse que não tinha nada para ler no banho.
Tudo o que desejava era um bom banho depois do que havia acontecido, mas também
queria um livro para se distrair e aprender enquanto estava na banheira.
Após
alguma hesitação, Demetria se encaminhou para a porta do quarto. Com sorte,
atravessaria o hall sem ser vista e daria uma escapadela até a biblioteca para
pegar um livro. Sabia que tinha muito em que pensar, mas não seria naquele
momento. Depois que tivesse relaxado no banho, estaria em melhores condições de
refletir sobre os temores do marido e sobre tudo o que lady Mowbray e Kibble
lhe haviam dito.
—
Não consigo entender — disse lorde Lovato, seguindo Joseph até o escritório. —
Você está dizendo que há algum tempo sabe que estão tentando matar Demetria e
não me disse uma palavra a respeito? Ou a ela?
Joseph
deu a volta na escrivaninha e deixou-se cair na poltrona. Tinha o cenho
franzido. Dito daquela maneira, parecia estranho mesmo.
—
O conde não queria preocupá-lo, nem aborrecer sua filha, lorde Lovato
—justificou-o Hadley uma vez que Joseph manteve-se em silêncio. — Ele
considerou que lady Demetria já estava sob bastante estresse com os
preparativos para o casamento e se empenhou de que ela fosse bem vigiada.
—
Evidentemente não foi tão bem assim — retorquiu lorde Lovato, voltando-se para Joseph:
— Embora até entenda seu desejo de proteger Demetria, não há desculpa para não
ter me contado. Eu deveria ter sabido.
—
É verdade, deveria — Joseph admitiu com um suspiro, passando a mão pelos
cabelos. Havia conseguido estragar tudo. Mais uma vez. — Peço desculpas. Parece
que estou sempre fazendo a coisa errada no que diz respeito a Demetria. Receio
que minhas faculdades não funcionem direito quando ela está envolvida.
Ouvir
o genro admitir que errara fez com que a raiva que lorde Lovato sentia
esmorecesse. Ele relaxou um pouco e sentou-se em uma das poltronas na frente de
Joseph.
—
Você citou vários acidentes com minha filha, mas Taylor não mencionou nenhum
deles nas cartas que me enviou. Por favor, me conte em detalhes. Que diabo está
acontecendo com minha filha?
Joseph
inclinou-se para a frente, pousou os braços no tampo da escrivaninha e começou
a explicar tudo o que havia acontecido desde que conhecera Demetria, inclusive
o que ela lhe contara que havia acontecido antes de se conhecerem.
Hadley
dirigiu-se à mesa que ficava ao lado da parede oposta e serviu três copos de
brandy. Depois de levar um copo para cada um, foi buscar o seu e sentou-se na
outra poltrona, mantendo-se calado enquanto Joseph colocava sogro a par sobre
tudo o que havia acontecido.
—
Bom Deus — lorde Lovato murmurou quando Joseph terminou de contar. — Quem pode
estar por trás disso tudo?
—Não
sei — disse Joseph, com ar preocupado. — Demetria está convencida de que foram
meros acidentes, mas...
—
Não foram — John Lovato afirmou, balançando a cabeça. — Se não tivesse ocorrido
o incidente na fonte, talvez até pudéssemos pensar... O bilhete que foi forjado
como se fosse enviado por você não deixa dúvidas de que foi algo planejado.
Joseph
concordou com a cabeça.
—
O que vamos fazer agora, filho?
Joseph
soltou um suspiro profundo e olhou para Hadley. Como ele tivesse chegado no
exato momento em que Kibble descera para avisar que Demetria havia acordado, Joseph
só pôde lhe dar uma rápida explicação sobre o ocorrido e os dois subiram
rapidamente. Não tivera tempo de contar ao sogro a razão da presença dele ali.
—
Eu contratei o Sr. Hadley, lorde Lovato. Ele me ajudou em várias situações no
passado, e eu espero que ele possa nos ser útil agora — Joseph explicou.
Depois, dirigindo-se ao outro homem, perguntou: — Pedi que viesse porque
entendo que tem notícias para mim.
—
Tenho, sim — confirmou Hadley —, mas temo que não serão do seu agrado.
Joseph
franziu a testa. Recostando-se novamente na poltrona, ele fez um gesto para que
o homem continuasse.
—
Investiguei cada incidente e fiz buscas em todos os lugares que me passaram
pela cabeça, milorde. Há muito lobo disfarçado de cordeiro, milorde, então
julguei que entre eles descobriria quem está causando todos esses acidentes.
—
E? ... — Joseph impacientou-se.
—
E todas as pistas não levaram a nada — admitiu Hadley. — Não há nada no passado
de sua esposa que faria com que alguém pudesse desejar prejudicá-la.
—
E Taylor? — Joseph perguntou, lançando um olhar constrangido ao sogro.
—
Pois é.. — Foi a vez de Hadley olhar para lorde Lovato, meio intimidado. — Ela
parece não gostar muito de lady Demetria, mas não creio que chegaria a ponde
tentar assassiná-la. Posso ficar de olho nela, se quiser, mas...
—
Eu ficarei de olho em minha esposa — disse lorde Lovato, decidido. — E, se ela
estiver por trás disso, eu mesmo torço o pescoço dela.
Joseph
olhou para o sogro com simpatia e então perguntou a Hadley:
—
E aquela história com o capitão?
—
Com o capitão Fielding? — Hadley endireitou o corpo na poltrona. — Também
investiguei, afinal foi o único episódio na vida de lady Demetria que poderia
ter lhe criado um inimigo. Entretanto, o homem morreu enquanto cumpria pena na
prisão, assim não pode ser o culpado. E, pelas minhas investigações naquela
região, fiquei sabendo que a única família que ele tinha era a mãe e uma irmã.
A mãe teve um ataque cardíaco e morreu na primeira vez em que ele foi preso; e
a irmã, pouco depois em um incêndio, na casa em que alugava um quarto.
—
Que história — Joseph comentou. — Mas nada do que você nos disse ajuda. Alguém
está tentando matar minha mulher, mas até agora não apareceu ninguém que
aparentemente tentasse fazê-lo.
—
Não é bem assim. Eu não disse que não encontrei nenhum possível culpado, só que
o senhor não vai gostar nada de saber o que eu descobri.
Joseph
fez uma expressão surpresa, comprimindo os lábios.
—
Vamos, diga.
—
Bem, como eu disse, investiguei não somente as possibilidades que o senhor
sugeriu, mas algumas outras também. Pela minha experiência, milorde, a
motivação da maioria dos assassinatos geralmente é a ganância. Por isso
imaginei que essa poderia ser a do nosso caso aqui... e estava certo.
—
Por que alguém mataria Demetria por ganância? A única pessoa que se
beneficiaria nesse momento seria eu. Pelo que sei, sou o único herdeiro dela...
— Ele piscou algumas vezes. — Você não está sugerindo que...
—
Não, não, claro que não — Hadley o interrompeu prontamente. — O senhor
dificilmente me contrataria se tivesse intenção de matá-la. Bom Deus, todos
estavam encarando tudo como meros acidentes. O senhor foi o único que
desconfiou e se preocupou com ela. — Então quem, homem? — lorde Lovato
intercedeu impaciente. — Quem foi o objeto de suas investigações?
—
Lorde Greville.
Joseph
franziu o cenho. Não deveria ter ouvido bem.
—
Quem?
—
Lorde Greville — Hadley repetiu, com convicção.
—
Mikey? O que o faz pensar que meu primo poderia querer fazer mal a Demetria?
—
Atualmente ele é o seu herdeiro — Hadley argumentou.
—
Não é, não. Demetria é minha herdeira desde que nos casamos — Joseph o
corrigiu.
—
Se estiver viva — Hadley concordou. -— Ele me parece ser o único com um
provável motivo.
—
Motivo que o levaria à forca. Não pode ser ele. Primeiro, porque os acidentes
já estavam acontecendo antes eu ter conhecido Demetria. E ele não teria motivo
algum antes disso. Depois, Mikey é meu amigo, além de meu primo. Ele me ajudou
no namoro com Demetria. Além disso, por que ele teria interesse em minha
herança, se ele está tão bem de vida quanto eu?
Lorde
Lovato assentia com a cabeça a cada ponto que Joseph levantava.
Hadley
simplesmente sacudiu a cabeça.
—
E se aqueles primeiros acidentes fossem apenas isso? Acidentes. O incidente com
a carruagem e a queda das escadas, por exemplo. Não temos nada que prove que
não tenham sido. Ele pode ter se aproveitado dessas histórias para provocar o
incêndio e o acidente na fonte.
A
explicação era plausível, mas Joseph não queria nem considerar essa
possibilidade.
—
Por que então ele não tentou me matar?
—
Se o matasse primeiro, Demetria seria sua herdeira. Se a matasse primeiro e
depois o senhor, o herdeiro seria ele.
Joseph
sacudiu a cabeça.
—
Ele é rico, não precisa do meu dinheiro.
—
Ah, essa é a novidade que fiquei sabendo. Parece que lorde Greville já não está
tão bem de vida como ele gosta de aparentar. Na realidade, está praticamente
falido. Os credores vão solicitar sua prisão por dívidas não pagas se ele não
tomar alguma providência logo. Entretanto, se sua esposa e o senhor vierem a
morrer de maneira inesperada, todos os problemas financeiros dele estarão
resolvidos.
Joseph
foi pego de surpresa e ficou abatido com a notícia, mas ainda assim abriu a
boca para protestar. Foi impedido por Hadley que levantou a mão.
—
Ele também aproveitou as oportunidades. Quando o incêndio e o incidente na
fonte ocorreram, ele estava exatamente lá, não em Londres, mas na residência
dos Lovato.
Joseph
relaxou.
—
Mas ele não está aqui, portanto não poderia ter envenenado Demetria. — Ele
sacudiu a cabeça, de maneira convicta. — Não pode ter sido Greville.
—
Receio que ele esteja aqui — Hadley contra-argumentou.
Joseph
levantou-se da poltrona.
—
Como assim?
—
Quando o senhor retornou ao campo, Greville também retornou. Ele está hospedado
na propriedade vizinha, Wyndham, desde o dia seguinte à sua chegada. Ou seja,
ele está a apenas trinta minutos daqui. Segundo o que andei investigando, ele
passa a maior parte do tempo fora, de dia e às vezes à noite, “caçando”.
Joseph
deixou-se cair sentado novamente, emitindo um urro. Estava visivelmente
transtornado com as notícias, ficando com as feições absolutamente pálidas.
Hadley
o encarou com pena.
—
Acho que temos o culpado, milorde. Aposto minha vida nisso.
—
Você está apostando a vida de Demetria, isso sim — lorde Lovato interveio
preocupado.
Joseph
balançou a cabeça, tentando absorver a notícia. Mikey e ele haviam sido íntimos
como irmãos e, embora tivessem se afastado por dez anos, aparentemente haviam
retomado a amizade do ponto exato em que havia parado. Joseph contara com a
ajuda dele para namorar com Demetria; escutara seus conselhos e aceitara seu
apoio. Não poderia ser ele.
—
Sei que é difícil de aceitar, milorde — disse Hadley solidário. — Sei que foram
muito chegados. Mas isso se deu há mais de dez anos. Quase doze. O senhor foi
para a guerra aos vinte anos e voltou ferido aos vinte e dois. Doze anos é
muito tempo. As pessoas mudam. As afeições mudam. As circunstâncias mudam. As
prioridades mudam. — Depois de uma pausa, ele completou: — Creio que seu primo
mudou.
Joseph
não conseguia acreditar.
—
Não, eu conheço Mikey. Não é ele quem está por trás disso tudo. Ele jamais
faria algum mal a Demetria ou a mim. Estivemos realmente separados por um
tempo, mas nossa amizade permaneceu intacta.
A
expressão de Hadley não deixava dúvida.
—
Seu primo é um velhaco, milorde. Ele fez mais do que arruinar algumas donzelas
virtuosas. Pelo que ouvi, ele nunca teve muito bons sentimentos.
Joseph
descartou o argumento.
—
Isso não passa de boatos e mexericos. Mikey nunca arruinou ninguém. Ele foi
para a cama só com mulheres experientes. As poucas que se diziam “donzelas
virtuosas” estavam tentando ser pegas sozinhas em um quarto com ele para
chantageá-lo. Achavam que uma ameaça de escândalo faria com que ele se casasse
com elas. Infelizmente para elas, Mikey não viu razão para estragar a própria
vida por causa de uma interesseira caçadora de dotes.
—
Devo dizer que concordo com Joseph — aparteou John Lovato de repente. — Matar Demetria
parece uma coisa extrema demais, Não seria mais fácil tentar afastá-los de
início? Fazer com que Joseph se voltasse contra Demetria, ou ela contra ele?
Parece que... — As palavras do sogro morreram ao ver que a expressão do rosto
de Joseph mudou. Ele então perguntou rispidamente: — Ele fez isso? Ele tentou
voltar vocês um contra o outro?
—
Sim. Não. Não sei — Joseph franziu a testa. — Mikey tentou, sim, me prevenir
contra Demetria no baile em que a vi pela primeira vez. Ele me contou que ela
era desastrada, me falou de alguns incidentes e que eu estaria arriscando a
vida, se saísse com ela. Mas depois me ajudou a vê-la algumas vezes, inclusive
tentou contribuir para que ela me encontrasse na fonte.
Os
três homens mantiveram-se em silêncio por alguns minutos. Hadley então se
levantou.
—
Bem, vou continuar investigando o assunto, milorde. Mas vou investigar por
aqui, uma vez que foi aqui que aconteceu o envenenamento. Creio que não há mais
nada que eu possa descobrir na cidade. Entretanto — ele acrescentou, pensativo
—, acho mesmo que foi Greville. Ele estava lá e aqui. E, como ele sabia sobre
vocês dois, pode ter escrito e assinado o bilhete e, muito sabidamente,
imaginou que lady Demetria correria a seu encontro.
—
E quanto a Prudhomme? — Joseph perguntou. — Ele também sabia sobre nós.
Hadley
negou com a cabeça.
—
Prudhomme está muito feliz, perseguindo mulheres casadas em Londres. Ele não
poderia ter envenenado a torta. Agora preciso me concentrar em gente que antes
estava em Londres e agora está aqui. Isto é, se o senhor ainda quer que eu
continue com as investigações.
—
Sim, é claro que quero. Pedi a Kibble que providenciasse um quarto para você
quando ele veio me avisar que Demetria estava acordada.
Hadley
agradeceu e deixou o escritório.
Lorde
Lovato e Joseph ficaram calados por vários minutos, cada um perdido nos
próprios pensamentos. Finalmente, o pai de Demetria quebrou o silêncio.
—
Ele está certo em uma coisa.
Aliviado
que seus pensamentos sombrios fossem interrompidos, Joseph dirigiu um olhar ao
sogro.
—
Em quê?
—
O assassino é alguém que estava em Londres e agora está aqui.
Joseph
concordou.
—
Vamos fazer uma relação? — propôs o pai de Demetria.
Joseph
deu um suspiro profundo.
—
Mikey estaria nela, é claro.
—
E Taylor também — disse John Lovato. — Além de estar tanto lá como aqui, foi
ela quem tirou os óculos de Demetria, tornando-a suscetível a acidentes.
—
O senhor sabia? — Joseph perguntou, surpreso.
Demetria
lhe havia dito que Taylor a acusara de tê-los quebrado.
—
Taylor afirmou que Demetria os havia quebrado, e minha filha ficou quieta, mas
há muito sei que Taylor não gosta de Demetria e tenho servidores bastante leais
que me mantêm informado do que acontece.
Joseph
não se surpreendeu com a resposta, pois sabia que o pai de Demetria era um
homem inteligente. Soltando um suspiro, ele comentou:
—
Creio que devamos acrescentar os nomes dos criados à nossa lista. Ambos Joan e
Keighsley estavam em Londres e aqui.
—
Keighsley não é seu criado pessoal?
—
Como eu, ele tampouco fazia parte da vida de Demetria, mas se só os primeiros
acidentes foram...
—
Infelizmente acho que nenhum criado teria motivo. Taylor tem, porque odeia Demetria.
—
E Mikey precisa do dinheiro, se é que Hadley está certo.
—
Você desconfia dele? — Lovato perguntou.
—
Não. Ele é um homem muito íntegro.
Lovato
levantou-se da poltrona.
—
Acho que preciso ter uma conversa com minha esposa.
Joseph
observou a porta se fechar atrás do pai de Demetria e então voltou-se para a janela
e deixou que seu olhar vagasse para as colinas e campos verdejantes de sua
propriedade. Sua mente estava em um turbilhão. Achava difícil acreditar que
Mikey pudesse prejudicar alguém.
Seus
pensamentos foram interrompidos ao sentir um movimento na porta que ligava seu
escritório à biblioteca. Ele girou a poltrona e deu com Demetria parada junto à
porta aberta. Bastou olhar para o rosto da esposa para saber que ela ouvira
toda a conversa.
—
O que você ouviu? — Joseph perguntou, levantando-se e dando a volta na
escrivaninha para se aproximar esposa.
—
Acho que quase tudo — ela admitiu. — Desci até a biblioteca para trazer um
livro pouco depois que meu pai saiu do quarto. Não tive a intenção de ouvir,
mas a porta do escritório estava meio aberta e acabei ouvindo tudo.
—
Não posso acreditar que Mikey faria uma maldade comigo — ela disse quando Joseph
parou junto dela e a pegou pela cintura.
Ele
deu um suspiro e a puxou para junto do próprio corpo. Abaixou então a cabeça, e
pousou o rosto no alto da cabeça dela.
—
Eu também não acredito.
—
Mas por que é o que me pergunto? — ela comentou ar triste, e Joseph a abraçou
um pouco mais, com pena de que ela tivesse ficado sabendo.
—
Não sei, Demetria. Mas vou descobrir — ele lhe assegurou, afastando-a para
olhá-la de frente. — Enquanto isso, você não deve sair da cama.
—
Não estou cansada e me sinto bem.
—
Demetria, eu quase a perdi ontem à noite. Quero que você fique na cama pelo
menos mais um dia para se recuperar — ele recomendou com firmeza. Quando a
esposa ia abrir a boca para protestar, ele acrescentou em tom de súplica. — Se
não o fizer por você, faça-o por mim. Juro que quase enlouqueci quando a vi tão
pálida e imóvel. Não quero perder você.
Joseph
estava próximo o bastante para que Demetria pudesse ver as linhas de
preocupação em volta dos olhos dele. Ela sentiu um aperto no peito. Talvez o
marido já se importasse mesmo com ela. Talvez nem se importaria muito que ela
usasse óculos. Talvez a desejasse mesmo assim. Mas esse era um assunto que teria
de considerar em um outro momento.
Demetria
calou a boca e o abraçou apertado, piscando para remover as lágrimas que
embaçavam ainda mais sua visão.
—
Hum, como é bom abraçá-la. Tive medo de nunca mais tê-la assim juntinho de mim.
Demetria
esfregou o rosto no peito dele, achando uma delícia sentir as mãos fortes
deslizarem por suas costas sobre a seda de seu penhoar. Era uma carícia
delicada e sem segundas intenções.
Joseph
pareceu nem notar o que fazia quando, movimentando-se, as mãos roçaram a lateral
dos seios de Demetria. Ela, porém, estava bastante consciente e, como sempre,
seu corpo imediatamente respondeu ao toque.
Sorrindo,
Demetria afastou-se um pouco e disse:
—
Tenho um trato à fazer com você, marido. Volto para a cama se você for comigo.
Joseph
sorriu à proposta e seus olhos detiveram-se nos olhos de Demetria.
—
Embora eu esteja tentado, você não está bem o suficiente para certas coisas
ainda.
Demetria
levantou as sobrancelhas. Joseph estava mais do que tentado. Ela podia sentir a
ereção dele pressionando seu corpo e sabia que, como sempre, ele estava apenas
demonstrando consideração por ela. Naquele momento, porém, não era consideração
o que queria.
—
Não estou bem o suficiente? — ela perguntou baixinho. Depois, sorrindo maliciosa,
deu um passo para trás, entrando na biblioteca, e desamarrou o laço que prendia
penhoar. Enquanto Joseph a observava, ela abriu o penhoar, deixando os seios à
mostra, e permitiu que ele contemplasse seu corpo por um instante. Pegou então
as mãos dele e as colocou sobre os seios para que ele pudesse sentir como seus
mamilos estavam intumescidos e cheios de desejo.
—
Meu corpo não concorda com você, marido. Ele diz que eu estou bem demais.
—
Demetria — Joseph sussurrou —, não.
—
Sua boca diz não, mas seu corpo diz sim — foi a vez de ela sussurrar, abaixando
a mão e deslizando um dedo por toda a extensão da rigidez sob as calças de Joseph.
Uma
chama iluminou os olhos de Joseph ao contato essa carícia. Sua voz tornou-se
rouca:
—
Você se tornou ousada desde a noite de nosso casamento, esposa.
Demetria
mordeu o lábio e o afagou. Levantando então cabeça, perguntou:
—
Você se importa?
—
Não — ele respondeu quase gemendo e se aproximou mais dela.
Sorrindo,
Demetria foi vagarosamente retrocedendo, conduzindo-o em direção ao sofá da
biblioteca.
—
Que bom, porque quero fazê-lo tão feliz quanto você me faz.
—
E como você planeja fazer isso? — Joseph perguntou, divertindo-se e deixando-se
conduzir por ela.
—
Tenho consultado livros, milorde, em busca de aprender as maneiras com que a
mulher pode dar prazer ao homem.
—
Sem os óculos? — Joseph espantou-se e comentou: — Você vai forçar demais os
olhos.
—
Você vale o esforço, milorde — murmurou Demetria, sem mencionar que já tinha os
óculos. Não era hora de falar sobre eles agora que o marido estava preocupado
com Mikey ou com quem quer que estivesse querendo lhe fazer uma maldade.
—
E o que foi que os livros lhe ensinaram? — ele perguntou, enfiando as mãos
dentro do penhoar para enlaçá-la pela cintura quando ela trombou com o sofá e
parou subitamente.
—
Aprendi que posso lhe dar tanto prazer quanto você me dá.
—
Verdade? — ele perguntou, interessado.
—
Verdade. — Ela sorriu e acariciou-o no peito enquanto as mãos de Joseph
deslizavam por suas costas. —Adoro sua masculinidade — ela sussurrou,
esfregando a boca no queixo do marido. — Amo seu corpo, amo sua mente, amo o
prazer que você me proporciona. Deixe eu lhe dar prazer.
Joseph
soltou um gemido profundo e cobriu a boca da esposa com a sua, num beijo quente
e vibrante. Demetria passou os braços pelo pescoço dele, gemendo sob a pressão
das mãos fortes. Podia sentir a rigidez da ereção do marido contra seu corpo e
a exigência dos lábios e da língua em sua boca.
—Precisamos
subir — Joseph balbuciou, interrompendo o beijo.
—
Ainda querendo me mandar para a cama? — ela perguntou, tentando se equilibrar
quando ele a soltou.
Sem
hesitar, Demetria se ajoelhou diante de Joseph e suas mãos apalparam as calças
dele.
—
Demetria — Joseph sussurrou, tentando pegar as mãos dela, mas ela foi mais
rápida e já havia lhe abaixado as calças, mantendo as mãos fora do alcance
dele.
—
Sim, milorde? — ela perguntou de maneira inocente, observando a ereção
projetar-se para fora e segurando-a com mão firme.
Joseph
respirou fundo. Todo o seu corpo respondeu ao toque.
Deus,
você vai acabar comigo...