quarta-feira, 22 de novembro de 2017

O Amor é Cego Capitulo III parte 1

— Que droga, primo! Onde vocês se meteram?
Demetria estremeceu de surpresa ao ouvir o comentário irritado de Greville, sobrepondo-se à voz suave de Joseph, que parou abruptamente de ler, à chegada da figura verde-amarelada.
— Então estavam aí! Deus do céu, faz quinze minutos que estou rodando a procura de vocês. Estamos atrasados. Fiquei de levar Demetria de volta depois de uma hora.
— Não acredito que já tenha passado uma hora — disse ela, desapontada. — Estava adorando a leitura de Joseph.
— A permissão foi só de uma hora? — Joseph perguntou com um sorriso amarelo, fechando o livro. — Por que tão pouco tempo?
— Quanto você acha que Taylor permitiria se, supostamente, só íamos dar um passeio de carruagem? — perguntou bravo Mikey, enquanto Joseph pegava a mão de Demetria para ajudá-la a se levantar.
— É, você tem razão — ele concordou, suspirando.
— Que livro é esse? — Mikey perguntou, mudando de assunto. — É um Pope?
— Isso mesmo. Demetria não consegue ler por causa da falta dos óculos, por isso resolvi ler para ela — respondeu Joseph meio constrangido.
Greville não podia acreditar que tal gesto partisse de seu primo Joseph, mas não teceu comentário algum para não deixá-los embaraçados. Em vez disso, dando-lhes às costas, apressou-os:
— Vamos, a carruagem está à nossa espera e não vejo hora de chegar em casa e trocar essa casaca ridícula.
Joseph passou a mão de Demetria sobre seu braço e seguiram o primo.
— Obrigada, Joseph. Você tem uma linda voz e a escolha do livro não poderia ter sido mais perfeita. Adorei sua leitura.
— Obrigado, mas minha intenção era ler um pouco e depois conversarmos. Achei que ficaríamos juntos por mais tempo.
Joseph parou de falar para ajudá-la a contornar um obstáculo, que pareceu a Demetria ser o tronco de uma árvore antiga, depois prosseguiu:
— A que festa você vai hoje à noite?
— Na dos Devereaux.
— Vou fazer o possível de vê-la lá então.
— Na verdade — Demetria ponderou —, é melhor você desistir dessa idéia. Taylor já disse que se você aparecer em outra festa que estivermos, não me deixará ficar sozinha nem por um minuto. Creio que ela desconfiou que estivemos juntos nos jardins de Prudhomme. Lamento muito.
— Não precisa se lamentar, nem se desculpar. Vou dar um jeito.
Antes que Demetria pudesse dizer qualquer outra palavra, eles já haviam chegado junto à carruagem e Joseph gentilmente a ajudou a subir.
— Até a noite.
— Lady Lovato. Que prazer o nosso em recebê-la!
Demetria acordou do tédio em que se encontrava e viu de forma embaçada, como sempre, os vultos azul-claro e pêssego que estavam à porta. Seria maldoso dizer que, com exceção de lady Havard e lady Achard, alguém mais se dirigisse à madrasta de maneira gentil. Pois, de um modo geral, eram as únicas pessoas que falavam com Taylor, daí sua estranheza em ouvir a anfitriã alegar prazer em vê-la.
A própria Taylor parecia surpresa, observou Demetria diante da dificuldade da madrasta em retribuir o cumprimento.
— Lady Devereaux e lady Mowbray. Boa noite. Muito obrigada pelo convite. Estamos muito contentes de estar aqui, muito contentes mesmo, não é, Demetria?
Demetria murmurou um assentimento, mas sua atenção estava voltada para o vulto azul, que só poderia ser lady Mowbray, a mãe de Joseph, uma vez que quem dera as boas-vindas fora a anfitriã, que usava pêssego,
— Então você é a encantadora Demetria — cumprimentou-a lady Mowbray, com um largo sorriso. — Falaram muito a seu respeito, minha querida, tanto meu filho, como meu sobrinho Mikey.
— Mikey Greville é seu sobrinho? — perguntou Taylor interessada, sem fazer qualquer comentário sobre Joseph.
Mesmo que não quisesse Demetria envolvida com Mowbray, a madrasta não era tola de esnobá-lo. Os Montfort eram muito influentes na sociedade, principalmente Isabel Montfort, lady Mowbray. Dessa maneira, em vez de exigir que Joseph se mantivesse longe dela, seu objetivo passou a ser o de tentar evitar qualquer lugar em que ele pudesse estar presente.
— Sim, ele é meu sobrinho — lady Mowbray confirmou, não ignorando a falta de comentário sobre Joseph. Pelo menos, foi o que Demetria imaginou diante de sua resposta sucinta.
— Ele é um jovem encantador — Taylor elogiou sorridente. — Ele saiu com Demetria para um passeio no parque hoje cedo.
— É, eu soube — respondeu lady Mowbray, em um tom de voz divertido.
Demetria teve a nítida impressão de que ela sabia do esquema que havia sido montado, mas foi pega de surpresa por suas palavras seguintes:
— Na verdade, Mikey tanto falou de Demetria que minha sobrinha, a irmã dele, quer conhecê-la.
— Ora, que gentil! Demetria bem que precisa fazer amigas aqui em Londres. Será muito bom para ela.
Demetria mordeu o lábio, sabendo que a madrasta imaginava que essa amizade poderia significar ascensão ao círculo social dos Mowbray. Mary Greville era considerada um diamante de primeira água. Conviver com ela só poderia elevar qualquer pessoa.
— Muito bom — disse lady Mowbray. — Então não vai se importar que eu a roube por algum tempo enquanto ajuda lady Devereaux.
— Vai roubá-la? — Taylor alarmou-se, receando que Demetria pudesse tropeçar ou trombar em qualquer coisa, arriscando-se a perder essa “oportunidade”.
— Se me der licença... Mary torceu o tornozelo hoje e é obrigada a ficar em repouso, com o pé para cima, por isso não pode vir até Demetria. Então vou levá-la até a sala em que ela está. Não se preocupe, tenho certeza de que as meninas vão se dar muito bem enquanto você ajuda lady Devereaux.
Aparentemente, Taylor não havia se dado conta do comentário feito pela primeira vez, perguntando em tom de incerteza:
— Lady Devereaux precisa de ajuda?
— Preciso, sim — lady Devereaux confirmou. — Disseram-me que você tem um gosto incrível...
Demetria não conseguiu ouvir o resto. Lady Mowbray apressou-se em afastá-la dali e conduziu-a até um hall. Ela a acompanhou em silêncio, sem saber o que dizer. Não conhecia lady Mowbray, nem tinha a mínima idéia do que estava acontecendo. Safar-se das garras de Taylor não era tarefa fácil, especialmente depois de ser pega no jardim de Prudhomme. Mas tudo aquilo havia sido muito bem armado.
— Chegamos — anunciou alegre a mãe de Joseph, abrindo a porta de um salão e fazendo-a entrar. — Demetria, apresento-lhe Mary — disse lady Mowbray ao fechar a porta. — Mary, esta é lady Demetria Lovato.
Demetria procurou ambientar os olhos ao novo ambiente, fixando-os no vulto rosa que estava sentado próximo à lareira, e sorriu ao ser apresentada.
— Olá, Demetria. É muito bom conhecê-la.
Demetria sorriu novamente, confusa ao constatar que o propósito de lady Mowbray era de fato apresentá-la à irmã de Mikey. Procurando disfarçar o desapontamento, ela disse:
— Sinto muito o que aconteceu com seu tornozelo.
— Oh, não se preocupe, está tudo bem com ele — Mary retrucou alegre. — Preciso fingir que está torcido somente por esta noite. Amanhã de manhã ele estará milagrosamente curado.
Demetria arregalou os olhos e não conseguiu disfarçar cara de espanto, preocupando-se com a impressão que estaria causando.
Pelo riso espontâneo de lady Mowbray, ela, sem dúvida, achara graça e, postando-se a seu lado, esclareceu:
— O problema de Mary foi inventado um pouco antes de virmos para o baile, quando Joseph me pediu ajuda para afastá-la de sua madrasta. Ele achou que Taylor dificultaria que vocês se vissem.
— E a senhora concordou em ajudá-lo? — Demetria perguntou, incrédula. 

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